Sem sucesso na bolsa em 2010, leilões de carbono precisam de mais regulação

De acordo com especialistas, mercado imaturo e falta de regras impedem que os leilões realizados no mercado brasileiro funcionem

Julia Ramos M. Leite

Publicidade

SÃO PAULO – O mercado global de créditos de carbono movimentou cerca de US$ 125 bilhões em 2009. Entretanto, os dois últimos leilões de créditos de carbono marcados pela bolsa paulista não decolaram. O primeiro deles, que aconteceria em 22 de dezembro do ano passado, foi cancelado devido à ausência de potenciais compradores. Já o segundo, realizado em 8 de abril deste ano, terminou sem negócios.

Mas isso, segundo especialistas da área, não significa que esse mercado não tem espaço no Brasil. Segundo Divaldo Rezende, diretor-executivo da CantorCO2e Brasil, empresa do mesmo grupo da Carbono Social – instituição que ofertou os créditos de carbono dos dois últimos leilões – o Brasil atualmente gera recursos de US$ 460 milhões como ofertador de crédito no mercado regulado (ou seja, vende créditos de carbono para instituições, em sua maioria estrangeiras, que precisam diminuir emissões de gases do efeito estufa).

Então, o que falta para que o País se torne também um comprador de créditos de carbono, ao invés de só oferecê-los? O primeiro ponto destacado por Rezende é a falta de maturidade desse mercado. “O mercado aqui está em fase muito embrionária para um leilão de créditos de carbono dar certo”, explica.

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Douglas Siqueira, da EcoAct, também acredita que o insucesso dos leilões pode ser atribuído à falta de maturidade do mercado – fator que, entretanto, pode mudar em breve. “Percebo um processo de amadurecimento muito rápido. A iniciativa privada, que é quem de fato vai trazer essas questões para as mesas de discussão em nível governamental ou empresariado, está impulsionando esse desenvolvimento”, explica.

Rezende também vê um forte papel das empresas no estabelecimento do mercado. “O País sempre foi um ofertador de crédito – agora, com a discussão de um mercado brasileiro, as empresas no Brasil estão iniciando o processo da sua avaliação para a compra de crédito de carbono”, explica Rezende.

Para que isso aconteça, é preciso que as companhias realizem um inventário de suas emissões – para saber, de fato, quanto precisam adquirir em créditos de carbono. “Está todo mundo na fase de aprendizado, à espera de um marco regulatório”, conclui.

Continua depois da publicidade

Regulação é chave
A regulamentação está diretamente ligada à maturidade do mercado, e é o segundo fator apontado pelos especialistas no insucesso dos leilões. De acordo com Rezende, essa é a primeira barreira a se romper, já que a ausência de diretrizes claras acaba criando incerteza no mercado brasileiro. “Temos as regulações internacionais, as federais e as dos estados – há certa discrepância nisso”, explica.

Siqueira também atribui parte da falta de desenvolvimento dos leilões à ausência de uma regulamentação sobre o tema. “Como a necessidade de se obter créditos mediante à leis estabelecidas pelo governo ainda não foi estabelecida, as empresas não veem a necessidade de buscar créditos – como já acontece na Europa, por exemplo”, afirma.

Para ele, apesar de a iniciativa privada ser a protagonista do mercado de carbono, avançando em ritmo maior do que os governos, leis são fundamentais para que seja estabelecido um critério para que atitudes sejam de fato tomadas.

Além de uma regulamentação no próprio País, Siqueira frisa a importância de regras globais para o funcionamento do mercado de carbono. “Precisamos de um posicionamento em nível mundial”, afirma. Ele, assim como Rezende, espera que a reunião que acontece este ano no México consiga mais avanços do que os vistos na reunião de Copenhague, na COP-15.

Leilões passados
A bolsa já realizou outros dois leilões de créditos de carbono, em setembro de 2007 e 2008. Em ambos os casos, o ofertante dos créditos foi a Prefeitura de São Paulo – o que, na opinião de Siqueira, pode ter sido um fator fundamental em seu sucesso. “Acho que foi mais por quem gerou os créditos e quem foi chamado para participar desse processo, quem comprou esses créditos”, explica. Para ele, quando se envolve créditos do governo, “há uma série de parceiros, e até mesmo uma força de persuasão e política bastante forte além do simples crédito”.

No total, a Prefeitura arrecadou cerca de R$ 71 milhões nos dois leilões realizados. Somando os dois leilões, foram comercializados mais de 1,521 milhão de créditos de carbono obtidos com a captação de gás metano de dois aterros sanitários, com preços finais de venda entre € 16,20 e € 19,20 cada. O primeiro leilão contou com 14 instituições habilitadas e nove participantes, enquanto o segundo teve oito empresas participando dos lances – quase todas elas europeias.

Segundo o prefeito, Gilberto Kassab, os recursos foram aplicados em projetos nos arredores dos aterros, para “beneficiar (a comunidade) por conta dos transtornos provocados pela instalação do aterro”.

Apesar de os leilões com os créditos da Carbono Social terem terminado sem negócios, Rezende ressalta que eles foram importantes tanto para mostrar que o Brasil tem estrutura – mesmo que não tenha maturidade – para fazer esse tipo de leilão quanto para dar transparência a esse mercado no País. “Atualmente as negociações são fechadas, então ninguém sabe realmente o preço que está sendo vendido – não há um índice oficial de preço”.

Rezende destacou ainda que os créditos da Carbono Social que não foram vendidos na bolsa brasileira estão agora sendo negociados em mercados internacionais, como EUA e Europa.

Leilões futuros
As perspectivas dos profissionais da área para novos leilões no Brasil são bastante otimistas. Siqueira acredita em um amadurecimento rápido do mercado brasileiro, acompanhado de um avanço na regulamentação. “Acho que até 2012 teremos muitas coisas positivas – até porque o governo do Estado de São Paulo, por exemplo, está estabelecendo suas metas, e isso vai ser repassado de uma forma ou outra para todos os segmentos, levando a procura aos níveis necessários. A tendência é esse mercado crescer exponencialmente nos próximos anos”.

Rezende também vê uma expansão do mercado de créditos de carbono no País. “Com a regulamentação do mercado, as empresas vão passar a ter que comprar créditos no mercado regulado. A previsão é que o País possa movimentar, anualmente, cerca de 500 milhões de toneladas de carbono – multiplicando isso por R$ 20 a tonelada, o que é um valor relativamente conservador, estamos falando em R$ 10 bilhões nos próximos anos”, afirma.

A prefeitura paulista informou que pretende realizar, ainda este ano, um novo leilão, apesar de ainda não ter uma data específica. “Se o governo aumentar essas ofertas, e ao mesmo tempo passar a existir a necessidade da iniciativa privada de fazer a compensação das emissões, a procura dos leilões deve aumentar”, afirma Siqueira.

Já a Carbono Social afirmou que, atualmente, não tem créditos para promover um novo leilão. “Mas quando tivermos, e sentirmos que o mercado está mais maduro, provavelmente vamos tentar de novo”, afirmou Rezende.

O que é o um leilão de créditos de carbono?
O mercado de crédito de carbono surgiu com o Protocolo de Kyoto, em 2005, que estabeleceu o MDL (Mecanismo de Desenvolvimento Limpo). Esse mecanismo permite que empresas com metas de redução de gases comprem créditos de outras empresas que, embora não tenham meta a cumprir, geram créditos de carbono.

Em um leilão, as empresas que têm créditos de carbono em excesso ofertam esses créditos – que equivalem a uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) -, que são adquiridos por companhias que têm metas de redução impostas pelo governo ou por normas corporativas.