Renato Casagrande defende estados e municípios na Previdência e prega equilíbrio com dissidentes do PSB

Para governador do Espírito Santo, necessidade de socorro aos estados poderá ser inevitável caso reforma aprovada pelos deputados não seja modificada no Senado Federal

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Com a proposta de reforma da previdência prestes a ser votada em segundo turno no plenário da Câmara dos Deputados, governadores e prefeitos devem intensificar mobilização pela reinclusão de estados e municípios ao texto quando for iniciada a tramitação no Senado Federal. É o que defende Renato Casagrande (PSB), governador do Espírito Santo.

Em entrevista ao InfoMoney, o socialista falou sobre a necessidade de se modificar o atual sistema de aposentadorias, embora não tenha poupado de críticas as regras apresentadas pelo governo Jair Bolsonaro (PSL) para trabalhadores da iniciativa privada.

Para ele, a reforma da previdência é uma batalha inevitável para governadores e prefeitos, que terão de fazer suas próprias propostas caso não sejam contemplados pelo texto em discussão no parlamento. “Se estados e municípios não tiverem também [uma reforma], no médio e longo prazo, um equilíbrio das suas contas, o socorro recairá sobre o governo federal, que é o único que pode emitir títulos”, observou.

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De acordo com cálculos do economista Paulo Tafner, pesquisador da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), os estados terão de lidar com um déficit de R$ 144,6 bilhões nas aposentadorias dos regimes próprios neste ano. As estimativas apontam para um crescimento de 137% no rombo.

Em meio à polêmica envolvendo parlamentares pessebistas que desobedeceram fechamento de questão do partido na votação da reforma, o experiente governador defende uma solução equilibrada, que não envolva expulsão dos parlamentares. Dos 32 deputados federais do PSB, 11 adotaram posição favorável à PEC (Proposta de Emenda à Constituição).

“É bom que o PSB possa evoluir com as diferenças, que os parlamentares que pensam de forma diferente nesse tema possam evoluir no debate e que esse debate e essa dialética possam fazer com que tenhamos uma unidade partidária conquistada, e não imposta pela força”, argumentou.

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Confira os destaques da entrevista:

IM – A reforma da previdência avançou no parlamento, conquistou apoios importantes, inclusive de parte da oposição. No caso do seu partido, 11 deputados desobedeceram o fechamento de questão e votaram a favor da proposta em plenário. O texto vai a segundo turno na Câmara e depois é analisado no Senado. Qual vai ser a postura do partido nesse processo?

Renato Casagrande – O partido majoritariamente fará uma oposição firme ao texto que foi votado. Até porque as mudanças no regime geral de previdência são profundas e penalizam muito o trabalhador que ganha menos. Mas, ao mesmo tempo, todos nós sabemos da importância de uma reforma da previdência. Uma parte do partido votou, mesmo não concordando com tudo, favoravelmente por compreender que, mesmo não sendo a reforma ideal, era fundamental tentar melhorar na votação dos destaques. Também é bom dizer que, na parte que trata dos regimes próprios de previdência, não tem muitas diferenças dentro do partido com a proposta que foi aprovada e certamente eu terei que fazer alguma reforma em meu estado.

O partido deve agora, mesmo mantendo sua posição contrária à reforma, refletir para que tenha uma posição equilibrada com relação àqueles que manifestaram posição favorável. Houve um convencimento dessas pessoas e o PSB precisa buscar sua disciplina interna através do convencimento. Boa parte que votou favoravelmente à reforma já tem uma história dentro do partido, são pessoas muito sérias, decentes, que discordaram nesse ponto e que podem, de alguma maneira, receber do partido algum tipo de observação, porque o estatuto permite outras penalidades que não somente a expulsão.

É importante que se busque um ponto de equilíbrio, em que o partido possa aprender com essas pessoas e essas pessoas possam aprender com o partido, na busca de uma unidade que fortaleça a posição do PSB. Mas ainda não podemos adiantar as posições como definitivas, porque a comissão de ética está ainda ouvindo os parlamentares. A minha busca será de equilíbrio para que o PSB saia fortalecido desse episódio, e não que seja um partido que tenha que perder parlamentares pelo debate que teve com relação à previdência.

IM – Há uma discussão sobre a reinclusão de estados e municípios na reforma, que acabou ficando de fora nesse final de tramitação na Câmara dos Deputados. O senhor disse que, no que diz respeito ao funcionalismo público, sua reforma terá algumas semelhanças…

RC – Teria que ser quase uma repetição. Boa parte daquilo que foi aprovado para os servidores federais pode ser replicado. Mas nossa primeira tentativa vai ser incluir estados e municípios no Senado. Neste caso, mesmo deputados que votaram contra a reforma, sabendo que ela foi aprovada, podem votar favoravelmente à entrada dos estados [a partir de uma segunda proposta que trate exclusivamente disso], já que o debate de mérito estaria vencido. A PEC paralela não é a melhor opção – que seria incluir na reforma original –, mas pode ser uma alternativa viável para que a gente tente incluir estados e municípios.

IM – Mas no caso dos governadores de oposição, a PEC paralela não seria o melhor caminho? Já que seria mais fácil apoiar uma proposta que trata exclusivamente do funcionalismo, sem entrar no regime geral.

RC – Na avaliação de mérito, sim, mas na prática não. Se tivesse havido a inclusão na Câmara, seria assunto com chance de solução mais rápida. Minha preocupação é que uma PEC paralela que seja votada no Senado demore muito para ser votada ou que nem seja apreciada na Câmara. É um trabalho que todos os governadores terão que fazer e é fundamental também que os líderes e articuladores do governo federal entrem nesse debate. Se estados e municípios não tiverem também, no médio e longo prazo, um equilíbrio das suas contas, o socorro recairá sobre o governo federal, que é o único que pode emitir títulos.

IM – Qual tende a ser o caminho do meio para os deputados do PSB que votaram a favor da reforma?

RC – Não me cabe dizer. O que defendo é que a gente tenha uma posição equilibrada. Isso não é uma posição de expulsão do parlamentar, a não ser que ele queira sair do partido. Se ele quiser sair, que o partido libere. Mas se quiser continuar militando, que o partido busque uma posição de equilíbrio.

O PSB tem seu manifesto, mas a cada dia a cultura e a realidade de uma conjuntura têm que ser consideradas. É bom que o PSB possa evoluir com as diferenças, que os parlamentares que pensam de forma diferente nesse tema possam evoluir no debate e que esse debate e essa dialética possam fazer com que tenhamos uma unidade partidária conquistada, e não imposta pela força.

IM – Considerando o que estabelece o estatuto, quais são as sanções possíveis?

RC – O último é expulsão, mas pode ser suspensão das funções parlamentares (comissão, relatoria etc.). Pode ser advertência, exclusão da direção do partido. Há alternativas. Acho que o partido não deve deixar sem alguma tomada de decisão, porque o diretório tomou uma posição, mas precisa ser uma posição equilibrada que retrate a história e a tradição do PSB, que sempre foi um partido equilibrado.

IM – Na votação da reforma trabalhista, no governo Michel Temer, o partido havia decidido pela expulsão de parlamentares que votaram a favor da proposta e o caso acabou na Justiça. O que fica de aprendizado daquele episódio?

RC – São pessoas diferentes, com perfis diferentes, temas diferentes e conjuntura política diferente. A reforma trabalhista envolveu atores com menos história dentro do partido do que os atuais. Naquele episódio, não houve expulsão, houve liberação de pessoas que tiveram interesse em sair. Eram pessoas que tinham pouco vínculo com o partido, entraram naquele debate da eleição presidencial com Eduardo Campos candidato. Agora não, a grande maioria são pessoas que têm efetivamente um vínculo mais forte com o partido.

IM – Aquela decisão foi acertada, na sua avaliação?

RC – Foi acertada

IM – Como o senhor vê a necessidade de equilíbrio entre esse ambiente novo de maior cobrança aos partidos?

RC – Coesão interna partidária não é igualdade de pensamento, é respeito aos pensamentos e, naquilo que for essencial, nós estarmos unificados em termos de prática. A política e a cultura política no mundo e no Brasil têm mudado muito. Então, é preciso que haja essa troca entre a história do partido e as pessoas que estão militando nele. Tem pessoas com mais tempo de militância, com uma carga e uma herança de um partido de anos atrás, e tem pessoas que têm uma prática mais nova, de formação diferente, que passaram por debates ideológicos e programáticos neste momento atual.

O partido tem que, em um processo de evolução, fazer com que se assimile as coisas boas dessas pessoas, e essas pessoas também devem assimilar parte da história do partido. É um processo permanente de troca, uma simbiose para que a gente vá modernizando o partido e, ao mesmo tempo, mantendo nossa unidade.

IM – Foi um equívoco por parte desses parlamentares ter votado a favor da reforma? Eles poderiam ter manifestado suas posições internamente, mas seguido a decisão do partido.

RC – Depende muito. Isso é um processo, as pessoas vão assumindo posições, sejam totalmente alinhadas com o partido ou não. Em algum momento, o partido pensou em ter uma posição contrária sem fechar questão. Ao final que saiu da comissão especial, verificou-se que os trabalhadores do regime geral de previdência sofreriam e sofrerão muito. O partido evoluiu para fechar questão. Mas alguns parlamentares já haviam assumido compromisso com suas bases. Então, não podemos dizer que tenha erro.

IM – Agora que a previdência caminha para ser página virada, ao menos na Câmara dos Deputados, a reforma tributária ganha destaque. O que é possível fazer nesta área, considerando as múltiplas propostas em discussão?

RC – A reforma da previdência foi aprovada, apesar de Bolsonaro, e a reforma tributária será aprovada se o Congresso exercer seu protagonismo. É fundamental que a gente tenha uma reforma tributária, mas é um tema mais complexo que a previdência. Os governadores não se unem em relação a uma reforma única, o mesmo ocorre com prefeitos, empresários, consumidores e assim por diante. Mas é possível avançar na simplificação do sistema tributário brasileiro.

O governo está dizendo que vai trabalhar só a questão dos tributos da União. Isso é possível, mas não resolve o principal problema que o sistema tributário enfrenta: a complexidade do ICMS. Há teses que defendem que a incidência do tributo caminhe em direção ao consumo e se desloque da produção. Concordamos com ela, mas dependerá muito do que for apresentado em termos de proposta. São diversas propostas tramitando, é preciso que a gente centralize isso e que haja um protagonismo do Congresso Nacional para que organize esse debate.

IM – Como o senhor avalia esses primeiros sete meses de governo Bolsonaro?

RC – Tem uma agenda econômica que se impõe pela realidade brasileira, pelo desemprego, pela atividade econômica baixíssima. Desregulamentar, quebrar monopólio: isso deve levar a um ambiente de investimento maior e de início de retomada da economia. Mas, como o governo ficou refém do debate da previdência, ainda teremos um ano perdido para a grande maioria dos brasileiros, especialmente os que estão desempregados. Temos muita esperança de que possamos retomar, a partir do ano que vem, pela agenda que está se impondo, a retomada do crescimento.

Na política e nos conceitos que avançamos nos últimos anos, muita preocupação. Pode haver um retrocesso muito grande nas áreas ambiental, cultural, dos direitos humanos. Podemos ter uma economia crescente, mas junto uma desigualdade crescente. E o principal problema que o Brasil enfrenta hoje é a desigualdade. Se não enfrentarmos isso, poderemos ter economia pujante, com muitos brasileiros passando muita necessidade.

IM – A flexibilização de acesso a armas de fogo deve ser outro debate do segundo semestre. O Espírito Santo é um estado com problemas sérios na área de segurança pública. Como o senhor avalia essa ideia?

RC – Estamos conquistando vitórias importantes no estado, reduzindo a cada ano indicadores de violência. Um ano antes de eu assumir o governo [pela primeira vez], em 2010, o estado teve 2.034 homicídios. Agora devemos fechar com 1.000 ou menos homicídios. Um dos grandes instrumentos é a retirada de armas de circulação da sociedade.

Quando uma liderança importante como o presidente incentiva as pessoas a se armarem, aumenta nosso trabalho nos estados. Quanto mais armas em circulação, menor custo terá a arma e mais violência pode acontecer, as pessoas que não têm prática no uso da arma podem causar acidente.

Violência se combate armando as forças de segurança da União, dos estados e municípios, reduzindo a impunidade e através da cultura de paz. Não é com mais violência que vamos enfrentar a violência.

IM – No mês passado, o senhor sancionou leis que criam o Fundo Soberano do Estado do Espírito Santo (Funses) e o Fundo de Obras e Infraestrutura Estratégica para o Desenvolvimento do Espírito Santo. Qual é o objetivo do governo com esses movimentos?

RC – O Espírito Santo tem uma realidade fiscal de muito equilíbrio. Desde 2012, o estado tem nota máxima na gestão fiscal, emitida pela Secretaria do Tesouro Nacional. Retomamos o governo agora e estamos muito cautelosos em assumir despesas permanentes (custeio e pessoal), porque não temos confiança total na economia e na política, estamos vendo como isso vai se desenrolar até o final do ano e temos que atender ao plano de ajuste fiscal, que impede que possamos crescer mais despesas do que o crescimento da inflação nos anos anteriores.

Mas um governante não é eleito só para fazer gestão fiscal responsável, ele é eleito para achar caminhos para atender a sociedade. Então, buscamos diversas alternativas para que pudéssemos ter uma carteira de investimentos, que hoje chega perto de R$ 7 bilhões de recursos disponíveis. Não vou dizer que vamos aplicar todos esses recursos em 4 anos, mas é um volume que tem chance real de desenvolvermos projetos em todas as áreas.

Fizemos um acordo com a Petrobras, em que a empresa terá de recolher aos cofres do estado R$ 1,5 bilhão até 2022 — já fez um depósito de R$ 850 milhões — pelo crescimento da participação especial do petróleo. A partir disso, constituímos, com aprovação da assembleia, um fundo de infraestrutura, para que esse recurso não fosse para o caixa das despesas correntes e fosse todo aplicado em investimentos no estado.

Aquilo que recebermos a mais de participação especial, em torno de R$ 400 milhões por ano, constituímos, pela primeira vez na história, um fundo soberano. Esse fundo vai aplicar em empreendimentos privados, para diversificar a economia, regionalizar o desenvolvimento e não termos dependência de petróleo e gás.

É uma riqueza do presente para lastrear o futuro dos capixabas. Além de ser um instrumento do nosso desenvolvimento, também é um instrumento que dá confiança a quem quer empreender no estado e dá confiança aos capixabas. Quem olha para o Espírito Santo vê que lá tem uma gestão equilibrada, responsável, com realização e ainda com um fundo soberano. Isso dá confiança em quem quer morar e investir no nosso estado.

IM – Quais são as prioridades do governo no segundo semestre?

RC – Colocar em prática as ferramentas que afiamos no primeiro semestre. Criamos instrumentos para a área de infraestrutura, financiamentos, recursos próprios, acordos. Na área de saúde, criamos uma estrutura para que possamos executar uma política que priorize a atenção primária e secundária.

Queremos um estado mais sustentável. Para isso, temos que ser competitivos, justos, inovadores, ter equilíbrio de desenvolvimento regional e preserve os recursos naturais. Se buscarmos o atendimento a esses preceitos, poderemos ser um estado aberto para a economia mundial e uma possível ligação da economia mundial com o nosso país.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.