Primeiras leituras: debate, muito barulho por quase nada

O debate de ontem no SBT virou um vale tudo entre Dilma Rousseff e Aécio Neves. Dificilmente terá algum efeito sobre a decisão do eleitor. Mais uma prova da falência do atual sistema político, eleitoral e partidário brasileiro.

José Marcio Mendonça

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A eleição deste ano, como já havíamos anotado, chegou a seu mais elevado nível de agressividade desde a disputa presidencial em 1989, quando o então candidato Fernando Collor utilizou depoimento da ex-mulher de Lula para acusá-lo de ter tentado que ela fizesse um aborto da filha que esperava dele.

A menina já tinha certa idade, Lula ficou de fato abalado, mas se recusou a usar a imagem da então adolescente Lurian no programa eleitoral do PT para se defender. Perdeu a eleição, contudo não foi certamente por causa desse episódio nem de outro, muito explorado na ocasião, da edição que a Globo levou ao ar no Jornal Nacional do último debate entre os dois concorrentes.

Aconteceu sim, o fato conhecido de que comando do jornalismo da emissora, então já escorregando das mãos de Armando Nogueira para um interlocutor constante de Collor, Alberico da Sousa Cruz, mandou mudar a matéria que havia ido ao ar no jornal Hoje, do início da tarde, para acentuar as vacilações de Lula e dar mais destaque aos bons momentos de Collor.

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Porém, a realidade é que Lula realmente havia ido mal no programa, não se sabe bem a razão – então ele não tinha o traquejo que foi adquirindo. Se tivesse, teria trucidado Collor, que era apenas um boneco bem treinado, repetindo obviedades.

A derrota de Lula se deu porque funcionou perfeitamente a “campanha do medo” empreendida pelo adversário, de mudanças na economia, “socialização” e coisas tais. De lá para cá passaram-se seis sucessões presidenciais, sem que o nível dos debates voltam-se ao triste exemplo de 1989.

Agora, infelizmente, voltou, com ataques pessoais. Basta ver as manchetes dos jornais de hoje e os destaques dados nos principais sites noticiosos. Nenhuma referência à discussão de idéias. Até porque elas foram esparsas.

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É difícil acreditar que o que se viu e ouviu possa influenciar o eleitor indeciso ou mudar algum voto dos já definidos. Como diz o título principal do UOL depois de encerrado o programa no SBT, o que aconteceu ontem mostra que o modelo de campanha no Brasil de um modo geral está falido.

Na verdade, está falido todo o sistema político, eleitoral e partidário brasileiro. Sem que os políticos levem a sério proposta para reformá-lo para valer. Repita-se: o Brasil pós-ditadura nunca saiu de uma eleição presidencial tão dividido e tão radicalizado quanto a sairá da deste ano.

Qualquer dos dois que seja eleito no dia 26 terá um início de gestão politicamente muito delicado, muito conturbado. Prenuncia-se uma oposição duríssima, selvagem mesmo dependendo do vencedor. Infelizmente.

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Falando em eleição de um modo mais sério, interessante o dado levantado na última pesquisa do DataFolha: 15% dos eleitores decidiram seu voto no último dia, 9% na hora de votar. Outro dado da pesquisa: 49% do entrevistados disseram que o escândalo da Petrobrás vai influenciar seu voto, 43% que não. 30% disseram que terá grande influência.

A presidente teve um ligeiro problema de saúde – hipoglicemia – logo após encerrado o debate, quando dava uma entrevista, ao vivo. Recuperou-se logo e não há indicações de que tenha sido coisa mais séria. Não vai mudar a campanha nem o ambiente.

O PMDB,

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chacoalhado

O PMDB vive mais uma crise de identidade, dividido entre apoiar Dilma ou Aécio Neves.

Anteontem, o líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha, deu uma entrevista à “Folha de S. Paulo” dizendo que metade da bancada é dilmista e metade é aecista. E insinuando que o comando do partido, com Michel Temer e cia. pode mudar de mãos.

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Ontem, o candidato favorito ao governo do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori, não compareceu a um evento em Porto Alegre no qual Temer foi fazer campanha para Dilma. Sartori disputa com o governador Tarso Genro, do PT, e já declarou voto no candidato do PSDB.

O governador eleito do Espírito Santo, Paulo Hartung, também da quinta-feira, afirmou que o PMDB está “chacoalhado” e que o partido se “revitaliza” com a aproximação com os tucanos.

Há uma parte do PMDB, como Henrique Alves e Eunício Oliveira, irritada com o apoio que Lula está dando a adversários do partido no Rio Grande do Norte e no Ceará.

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Temer está se preparando para reagir. Mas fica claro que se Aécio vencer ele perde força. O PMDB, porém, continuará governo, com Dilma ou com o tucano.

O ex-diretor da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, informa “O Estado de S. Paulo”, envolveu em suas denúncias um ex-dirigente do PSDB: o ex-presidente do partido, Sérgio Guerra, de Pernambuco, morto este ano.

Sem recessão

técnica

Segundo os especialistas, o crescimento da economia brasileira em agosto, de 0,27%, indica que o país deve ter saído no terceiro trimestre da “recessão técnica” – dois semestres de PIB negativo – em que mergulhou este ano. As previsões são de que julho/agosto/setembro trará um crescimento de cerca de 0,5%.

A medida é o IBC-Br do Banco Central, considerado como uma prévia do PIB oficial do IBGE.

Porém, a indicação mais destacada pela maioria é que há uma desaceleração da atividade econômica, pois em julho o aumento do PIB foi de 1,52%. Os dados não devem alterar as previsões sobre o resultado fechado de 2014, de um crescimento em torno de 0,3%. Na última previsão do Boletim Focus a expectativa é de mais 0,28%.

O desempenho em 12 meses ficou em 0,93%, pelo IBC-Br e este ano até setembro foi de apenas 0,04%.

Outros destaques

dos jornais do dia

– COMÉRCIO INTERNACIONAL – De Clóvis Rossi, na “Folha”: Está ruindo a principal, quase única, aposta comercial do Brasil, a Rodada Doha de Desenvolvimento, lançada em 2001 para terminar em cinco anos, mas que continua paralisada até agora. O brasileiro Roberto Azevêdo, diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), praticamente jogou a toalha ontem ao dizer que a instituição não pode continuar trabalhando como até agora, sob pena de paralisia. A regra de ouro na OMC é consenso. Ou todos estão de acordo ou não há acordo. Azevêdo foi absolutamente claro: não estava se referindo a um potencial risco de paralisia no futuro, mas de uma situação já instalada. O desabafo do DG, como é tratado o diretor-geral, deve-se à impossibilidade de levantar o veto da Índia ao pacote aprovado em Bali, no fim do ano passado, cujo objetivo era apenas o de reduzir a burocracia no comércio. A Índia só aceitaria o pacote se pudesse manter indefinidamente subsídios a seus produtores agrícolas, clara violação às regras da OMC.

– FUNDO DE COMPENSAÇÃO SALARIAL – No “Valor”: o governo patrocinou uma emenda à MP 651, que ainda depende de aprovação no Senado, para resolver todas as pendências jurídicas que impediam a renovação das dívidas do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS), que subsidiou a habitação até meados dos anos 90. Paralisado há dois anos, o processo de pagamento desse esqueleto poderá ser retomado com a aprovação da MP. O principal credor desses títulos atualmente é o Banco Nacional, em liquidação há quase 20 anos, que detém cerca de R$ 30 bilhões de papéis do fundo. A redação negociada pelo governo com o relator da MP estabelece que, mesmo depois de mudar as regras de rendimento da caderneta de poupança, as dívidas do FCVS continuarão sendo corrigidas pela regra antiga. A Controladoria-Geral da União (GCU) vinha questionando o critério adotado pelo governo e entendia que deveriam ser aplicadas as novas regras.

– ECONOMIA MUNDIAL – Ainda no “Valor”, com informações da Reuters: As empresas chinesas devem cortar seu gastos de capital em cerca de 7% neste ano, na maior redução anual desde a crise financeira mundial, o que aprofundará o desaquecimento econômico. A redução dos investimentos das empresas ressalta os desafios que a China enfrenta neste ano para conter uma desaceleração econômica que deverá ser a pior em 24 anos e que foi agravada por um mercado imobiliário desaquecido. Os cortes poderão persistir, e a economia chinesa, que se baseou muito em investimentos, terá de acelerar o esforço por reequilíbrio para fomentar o crescimento. Incertezas econômicas e uma campanha do governo para reduzir setores que são grandes poluidores ou estão “empacados”, com excesso de produtos não vendidos, significa que o investimento poderá cair também no próximo ano, é o que sugerem entrevistas com empresários e analistas.

. A produção industrial nos Estados Unidos reagiu em setembro, recuperando-se de uma queda de 0,5% em agosto. O otimismo em relação à economia americana foi reforçado também com a divulgação de que os pedidos de seguro-desemprego atingiram o nível mais baixo em 14 anos. Impulsionada pelos setores de informática, eletrodomésticos e de materiais para construção, a produção teve uma alta de 0,5% no mês passado, de acordo com dados apresentados ontem pelo Fed, o banco central dos EUA. O relatório do Fed diz ainda que a produção total, com a inclusão das mineradoras e fornecedoras de energia, teve um avanço de 1% – a maior alta desde novembro de 2012.

. A inflação na zona do euro voltou a cair em setembro. O Índice de Preços ao Consumidor recuou 0,1 ponto percentual e ficou em apenas 0,3% no mês passado, nível mais baixo registrado nos últimos cinco anos. Muito longe da meta estabelecida pelo Banco Central Europeu – abaixo, mas perto de 2% -, o índice aumenta os temores de que o bloco da moeda comum vai cair na deflação. Segundo a agência oficial de estatísticas Eurostat, a inflação em toda a União Europeia ficou em 0,4% em setembro – contra 0,5% em agosto. Em setembro de 2013, a taxa anual estava em 1,3%. Os dados compilados pela Eurostat mostraram que oito dos membros da União Europeia apresentaram queda nos preços ao consumidor nos 12 meses até setembro, sendo cinco deles membros também da zona do euro: Grécia (-1,1%), Espanha (-0,3%), Itália (-0,1%), Eslovênia (-0,1%) e Eslováquia (-0,1%). Os outros três são Bulgária (-1,4%), Hungria (-0,5%) e Polônia (-0,2%).

LEITURAS SUGERIDAS

1. Editorial – “O caso da reeleição” – Folha 

2. Nelson de Sá – “Debate mais parecia um programa de auditório do SBT” – Folha 

3. Claudia Safatle – “Oportuna flutuação do preço da gasolina” – Valor 

4. Maria Cristina Fernandes – “O rebate e o eleitor” – Valor