Por que o pacote trilionário de estímulo de Biden não animou o mercado

Investidores projetam dificuldade para plano ser aprovado no Congresso americano, além de impactos que podem não ser positivos para os negócios

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Os investidores, principalmente americanos, aguardavam com ansiedade o anúncio do pacote de estímulos que o presidente eleito Joe Biden pretende apresentar ao Congresso tão logo comece o seu mandato. Porém, após o chamado “Plano de Resgate Americano” ser divulgado na noite de quinta-feira (14), o mercado não parece ter se animado muito.

Com os três principais índices de ações dos Estados Unidos operando em baixa nesta sexta-feira (15), alguns analistas apontam para a famosa máxima do mercado: “sobe no boato, cai no fato”, citando que o mercado tem tido boas altas nas últimas semanas e agora investidores, com novos estímulos já precificados, aproveitam para realizar alguns lucros.

Mas esta visão não é unanimidade entre os estrategistas, que citam também, entre outros fatores, a dificuldade que o novo presidente enfrentará para aprovar esse projeto na íntegra no Congresso, mesmo com os democratas assumindo a maioria no Senado.

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Em resumo, o plano de Biden inclui US$ 415 bilhões em combate direto à pandemia e distribuição de vacinas, cerca de US$ 1 trilhão em auxílio às famílias e mais cerca de US$ 440 bilhões para pequenas empresas e comunidades atingidas pela crise do coronavírus.

Em um dos principais pontos, o presidente eleito sugere o pagamento de US$ 1.400 adicionais para os americanos, mais que o dobro dos US$ 600 aprovados em dezembro. Ele também fala em aumentar o benefício do seguro-desemprego de US$ 300 para US$ 400 e estendê-lo até o final de setembro, além de elevar o salário mínimo federal para US$ 15 por hora.

A questão, porém, é que na visão de Wall Street, esse pacote não deve passar pelos deputados e senadores da forma como está sendo proposto.

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Segundo a equipe da XP Investimentos, alguns pontos do projeto, como os recursos para vacinação, devem ser aprovados com facilidade. Por outro lado, outras questões devem enfrentar maior resistência entre parlamentares.

“É provável que o governo Biden tenha que negociar um valor menor para os cheques de US$ 1.400 e mudar a regulação em torno do benefício para que menos cidadãos se qualifiquem para recebê-lo. Em especial, o aumento do salário mínimo é a questão que deve enfrentar maior resistência. Em vista disso, o projeto deve ser negociado e moderado para ser aprovado”, avaliam.

Já o economista político do Goldman Sachs, Alec Phillips, afirma que se Biden quiser aprovar o pacote por despacho regular e não por meio do processo de reconciliação orçamentária, como indicou sua equipe ontem, ele precisará de 60 votos no Senado.

Isso exigiria que pelo menos 10 republicanos apoiassem o seu projeto, considerando que nenhum democrata irá divergir. “Não esperamos que dez republicanos apoiem um pacote de ajuda de US$ 1,9 trilhão”, disse Phillips em nota. Ainda no fim do ano passado, o presidente Donald Trump chegou a pedir um pagamento de US$ 2 mil, em vez dos US$ 600 aprovados, o que acabou não tendo apoio nem mesmo dos republicanos.

Outro ponto importante para os analistas é que há uma expectativa que esse projeto demore para ser analisado no Congresso. Isso porque Biden começa o mandato com deputados e senadores “travados” em outras questões, como protocolos de segurança, impeachment de Trump, e a confirmação das indicações do novo presidente. Tudo isso deve atrasar o andamento do texto.

Impactos reais do pacote

Passando por toda a questão política e de dificuldade de aprovação do plano, muitos analistas questionam também a eficácia e os impactos que um pacote desse tamanho pode ter na economia americana.

“A história mostra que esses gastos não estimulam a economia. No final, eles apenas aumentam a dívida federal”, escreveram em relatório John Cogan e John Taylor, do conservador Hoover Institution, em artigo publicado no Wall Street Journal.

Uma questão importante que tem sido debatida no mercado é se um aumento de gastos neste nível não viria junto com um aumento de impostos, o que não foi comentado pela equipe de Biden. Se isso ocorrer, a reação na bolsa tende a ser bastante negativa.

Por outro lado, alguns economistas enxergam o pacote de forma mais positiva. Para Michael Gapen, economista-chefe para EUA no Barclays Capital, a proposta inicial é “essencialmente um pacote de alívio para desastres”.

As propostas “não pretendem alterar gastos e impostos. É provável que seu efeito seja mais limitado em termos de multiplicadores e impacto sobre a atividade econômica”, disse ele para a Bloomberg.

O plano não levou a grandes mudanças de imediato das previsões econômicas, que no geral apontam uma recuperação econômica em 2021 após a retração do ano passado. Gapen disse que o plano está amplamente de acordo com suas expectativas para a proposta e perspectivas econômicas.

Alguns economistas concordaram que controlar o coronavírus é a coisa mais importante que Biden pode fazer pela economia, e o pacote poderia ajudar se os gastos com vacinação forem aplicados de maneira inteligente.

“Os pontos mais importantes que seriam benéficos para a economia são mais dinheiro para o sistema médico tratar doentes e lidar com a logística das vacinas”, disse Carl Tannenbaum, economista-chefe da Northern Trust.

Stephen Stanley, economista-chefe da Amherst Pierpont Securities, disse que, com o auxílio-desemprego suplementar previsto para expirar em março, mais assistência era necessária.

No entanto, ele avalia os cheques de estímulo como uma abordagem “dispersa”. “Além de ser caro e ineficiente, em um ambiente econômico normal não funciona muito bem”, disse Stanley.

Para o Goldman Sachs, Biden pode conseguir um acordo para um plano mais próximo de US$ 1,1 trilhão, bem abaixo da proposta anunciada ontem, mas ainda acima dos US$ 750 bilhões que os analistas esperavam.

Com tantos pontos para serem avaliados e impactos ainda incertos, além da grande dúvida de como estará o projeto se ele for aprovado no Congresso, a conclusão dos analistas é que os investidores não só aproveitam para realizar lucros recentes com a ideia de que já se sabia que viria um pacote grande como esse, mas também de que será preciso esperar se saber como será essa ajuda à maior economia do mundo.

(Com Bloomberg)

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Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.