Após aceno de Bolsonaro, quais as chances de a reforma da Previdência ser aprovada ainda em 2018?

Declaração do presidente eleito a favor do texto apresentado pelo governo Michel Temer anima o mercado e gera expectativas sobre avanço da pauta antes mesmo da posse. Chance real ou wishful thinking?

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Em uma série de entrevistas à imprensa exibidas na última segunda-feira (29) em diversas emissoras de televisão, o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) fez acenos ao atual ocupante do Palácio do Planalto, Michel Temer, no sentido de fazer avançar a proposta de reforma da Previdência ainda neste ano. A ideia seria aprovar “ao menos parte” do texto apresentado pelo atual governo, que hoje aguarda ser pautado no plenário da Câmara dos Deputados após passar por comissão especial.

O movimento, embora tenha sido bem recebido pelo mercado, alimenta ceticismo entre analistas políticos. Seja pelo calendário apertado, seja pela falta de incentivos a muitos deputados derrotados nesta eleição a assumirem tal compromisso, ou até mesmo por uma possível indisposição do futuro governo e parlamentares reeleitos em bancar a agenda impopular de um governo praticamente encerrado, há muitos nós a serem desatados para que o discurso de Bolsonaro se converta em medidas efetivas neste momento.

Para entender este cenário, o InfoMoney ouviu 4 especialistas. Confira um resumo de cada avaliação:

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Ricardo Ribeiro, MCM Consultores
A chance de aprovação é baixa. Não acho que zero, mas não é muito alta, não. Mas vejo essa mudança de posição sobre a reforma da Previdência mais como importante para o início do ano que vem. A ideia seria que eles podem conseguir levar adiante a reforma de Temer em 2019, para depois realizar alterações na linha que preferem, que é uma parcela da reforma contemplando o regime de capitalização.

Para a medida avançar ainda neste ano, primeiro é necessário maior clareza por parte de quem está chegando ao poder sobre o que quer. O ziguezague atrapalha. E tem que articular não só com Temer, mas com Rodrigo Maia (DEM-RJ). Precisa haver trabalho mais firme de articulação. Mas o que precisa ser feito imediatamente é ter uma posição definida, clara e uniforme. Talvez, depois dessa declaração de Bolsonaro isso passe a acontecer.

Na próxima legislatura, Bolsonaro terá condição mais favorável na Câmara, enquanto no Senado houve uma mudança na composição, mas o perfil ainda é mais complicado para o novo governo.

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Rafael Cortez, Tendências Consultoria
O cenário da aprovação da reforma da Previdência em 2018 é viável, embora não seja o mais provável neste momento. A tramitação de uma PEC é, por natureza, bastante complicada, o ambiente político ainda é marcado por forte polarização e manutenção de certa tensão eleitoral, fruto do quadro complicado de relacionamento entre o novo governo e a oposição.

Por si só, uma tramitação de emenda constitucional na Câmara e no Senado, em um cenário de agenda bastante complicada por conta da votação da peça orçamentária e outros itens, não é das tarefas mais triviais. O primeiro passo para que esse cenário alternativo (a aprovação da reforma) se concretize é o novo governo definir sua estratégia em relação à reforma da Previdência.

Nesse sentido, os sinais ainda não são consistentes se o novo governo de fato quer reforma da Previdência aprovada em 2018, qual reforma e, posteriormente, o anúncio da negociação com o atual governo, que é o patrocinador do texto que está no Congresso.

O presidente da Câmara é fundamental, ele tem o poder de agenda, então a cooperação de Rodrigo Maia é essencial para que isso se materialize, bem como do Eunício Oliveira na presidência do Senado. Os incentivos para parlamentares que não foram reeleitos ou que ocuparão outros postos políticos é que basicamente a carreira deles não termina, então a manutenção de um bom trânsito com líderes pode significar a sobrevivência da carreira política destes nomes. Portanto, eles eventualmente podem votar a reforma da Previdência se assim desejarem.

XP Política
É sem dúvida bom sinal que Bolsonaro persiga o ajuste fiscal falando como presidente eleito. Nossa conta de votos que o governo Temer teria como potencial em dezembro era de 296 (de 308 necessários), quando da última tentativa de pautar o tema. Em que pesem as teses mirabolantes da época, o fato é que a reforma não foi pautada porque Temer já não tinha os votos necessários. A situação é outra hoje, mas por ora nem o clima em Brasília e nem a matemática ajudam na perspectiva de aprovação da reforma da Previdência neste ano.

Pelo lado técnico e regimental, adicionar artigos ou mudar substancialmente trechos do relatório já aprovado na Comissão Especial seria tarefa difícil. É possível a supressão de artigos ou trechos do texto e a reconstrução de partes do relatório usando as chamadas emendas aglutivativas.

Do lado político o clima teria de ser construído. O caminho também é importante. Embora Temer tenha um papel importante, o principal articulador da construção do placar teria de ser Rodrigo Maia. Outro fator é o volume de demandas dos deputados (especialmente os não reeleitos) para considerarem votar o que quer que seja de matérias desgastantes neste fim de ano. Esta é uma negociação que até pode ser articulada parte por Temer, parte por Maia, mas que necessariamente teria de ser chancelada pelo presidente eleito.

Dada a dificuldade regimental e política, não é razoável imaginar a aprovação de uma versão melhorada do texto. Também é muito difícil que no Senado vejamos algum movimento de aprovação. Na verdade as repetidas declarações de Eunicio Oliveira (MDB-CE), presidente da casa, de que não pauta a reforma se a Câmara a enviar prejudicam as perspectivas na própria Câmara dos Deputados.

Leopoldo Vieira, IdealPolitik
Qual o interesse de Bolsonaro, após ter sido campeão de votos e se conectar abertamente a um movimento populista internacional, o de Steve Bannon, de querer queimar gordura de sua popularidade para chancelar uma medida do governo Temer, que ataca de maneira estruturante o déficit fiscal? Imagino que Bolsonaro queira encontrar a solução deste problema. Aliás ele e a nova relação de forças do Congresso Nacional.

Nesta altura do campeonato, de Temer depende o convite e de Bolsonaro a escolha de queimar gorduras de sua popularidade para dar um gol ao presidente ou ele mesmo marcar o gol. Agora, também é possível que haja entendimentos eleitorais a respeito desta matéria ser conduzida assim. Se for o caso, aí são grandes as chances de Bolsonaro se engajar.

Rodrigo Maia depende também de Bolsonaro. Ele seria um que capitalizaria bem a eventual aprovação da reforma, para se fortalecer para a reeleição e ser tido e havido como um pêndulo de entendimento entre Bolsonaro e as instituições e setores de centro e até de esquerda. Mas por qual motivo Bolsonaro agregaria este valor a Rodrigo Maia? A governabilidade dele precisaria mesmo reproduzir o “jogo de Brasília”?

Os incentivos, porém, seriam sobretudo em sentido contrário, pois seria uma oportunidade para a oposição antecipar uma pauta popular contra Bolsonaro, parlamentares de saída negociarem alto demais para um voto favorável etc.

Parte dos eleitos pode se interessar para se liberar do desgaste, mas outros preferirão ser solução. Há um projeto com cabeça populista e corpo liberal eleito. A oposição do presente ou do futuro ia gostar para poder já demarcar seu espaço, unindo Temer e Bolsonaro na mesma conta.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.