O dilema de Bolsonaro: autopreservação nos debates ou exposição a ataques?

Com pouca estrutura para campanha e imagem em evidência na eleição, deputado terá de escolher entre exposição arriscada e autopreservação parcial

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – As pesquisas de intenção de voto explicitam um falso clima de tranquilidade para o deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ), líder na corrida presidencial nas simulações sem a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A despeito do bom desempenho nos levantamentos, tanto em cenários estimulados como nos espontâneos (que atestam nível de cristalização de apoio), o ex-capitão do Exército tem no horizonte uma série de obstáculos para se manter viável ao longo da intensa disputa, entre potenciais ataques de adversários e a pouca estrutura para contra-atacar, além de dificuldades em receber apoio de eleitores mais localizados no centro do espectro ideológico.

Um levantamento feito pelo instituto Ipsos sobre a percepção dos brasileiros sobre diversas figuras públicas mostra que o nível de desaprovação a Bolsonaro saltou para 64% em junho. Um mês atrás, as avaliações negativas eram de 60%. Já o índice de aprovação ao parlamentar oscilou de 23% para 20%. Outros 16% dos entrevistados responderam não conhecer suficiente para avaliar ou não souberam dizer. A margem máxima de erro da pesquisa é de 3 pontos percentuais para cima ou para baixo.

jairbolsonaro

Embora lidere na corrida presidencial nas simulações de primeiro turno que desconsideram a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Bolsonaro tem dificuldades para conquistar apoio além de seu eleitorado mais fiel. É o que têm mostrado as recentes pesquisas de intenção de voto. Os últimos levantamentos feitos pelo Ipespe, por encomenda da XP Investimentos, mostram uma correção para baixo, inclusive nas faixas de eleitores em que o parlamentar costuma receber maior endosso.

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Além disso, conforme observam os analistas da consultoria Arko Advice, com base nos mesmos levantamentos, Bolsonaro é o candidato que menos cresce do primeiro para o segundo turno. Enquanto Marina Silva, Ciro Gomes e Geraldo Alckmin avançam em uma média superior a 20 pontos percentuais, o parlamentar abocanha apenas 11 pontos. A variação é numericamente inferior a observada no caso do próprio ex-presidente Lula, que vai de 28% para 41% nos únicos cenários em que seu nome é avaliado.

Em contraste com a pole position na corrida eleitoral, Bolsonaro enfrenta uma série de desafios. Um dos principais dilemas do momento é calibrar as tentativas de avanço sobre outras faixas de eleitores sem perder a atual base de convertidos. Embora flerte com discursos mais liberais na economia para atrair o eleitor da centro-direita, o parlamentar tem evitado exposição desmedida em alguns eventos possam lhe proporcionar riscos mais elevados.

Conforme noticiou o jornal O Globo no último sábado, o deputado até avalia a hipótese de não ir aos debates com outros candidatos à presidência. A reportagem observou que Bolsonaro tem privilegiado agendas em que está cercado por apoiadores e fora dos maiores centros urbanos do país, tendo faltado a eventos em que teria a companhia de adversários, estratégia que pode ser mantida até o fim da eleição. A estratégia não é nova e já foi usada por outros candidatos em outras oportunidades, com o objetivo de preservar a vantagem conquistada em relação aos adversários.

Em vídeo divulgado nas redes sociais para desmentir as informações, Bolsonaro afirmou que irá participar de todos os debates. “Nos debates na televisão compareceremos a todos sim, podem ter certeza até porque estaremos levando propostas factíveis que vocês acreditam que podem ser atingidas”, afirmou. O discurso do parlamentar, contudo, contradiz com comportamento recente de evitar eventos em que estejam presentes outros candidatos. Recentemente, ele cancelou participação da sabatina organizada por Folha, UOL e SBT, faltou ao Fórum da Liberdade, em Porto Alegre (RS), assim como encontros realizados por frentes de prefeitos.

“Não comparecer a debates é uma estratégia que candidatos que lideram as pesquisas costumam utilizar para se preservar de desgastes, pois se tornam o alvo comum de seus adversários. Determinados candidatos também evitam os debates pelo risco de eventuais “escorregões” no confronto direto de ideias”, observaram os analistas da Arko Advice. Apesar da estratégia de autopreservação do parlamentar, os especialistas ponderam: ataques serão inevitáveis.

Ao se furtar de uma maior exposição em determinadas circunstâncias, Bolsonaro também pode limitar seu potencial de crescimento em novas faixas de eleitores. O parlamentar contará com parcos recursos para bancar sua campanha e muito pouco tempo de televisão, caso não consolide nenhuma aliança de peso — cenário que se desenha no momento.

Somente pela forte atuação nas redes sociais, Bolsonaro pode não conseguir o efeito de crescimento desejável sobre o eleitorado mais ao centro. Além disso, a baixa estrutura pode ter importante peso negativo em sua capacidade de responder ataques de que será alvo durante a disputa, a partir de agosto.

“É difícil dizer que Bolsonaro chegou ao teto. O eleitorado brasileiro é razoavelmente bem distribuído entre esquerda, direita e centro. Bolsonaro atinge bem hoje um público mais identificado com a direita. Ele precisa fugir um pouco deste público para crescer nas pesquisas”, explicou Paulo Gama, analista político da XP Investimentos, no programa Conexão Brasília.

O especialista lembra que o público que hoje declara voto a Bolsonaro declara se informar muito mais por mídias sociais do que pela televisão. Isso significa que o eleitor que não apoia o deputado está mais localizado na faixa que se informa por televisão e outros meios tradicionais.

“Ele está conversando com um público restrito e tem um desafio grande para falar com outros públicos, além de fatalmente ser alvo de ataque na televisão. A gente lembra, em 2014, o que aconteceu com Marina Silva. Não ter tempo de televisão não significa só não conseguir se defender ou se expor, mas que seus adversários têm mais tempo para te atacar”, complementou.

Por outro lado, o deputado conta com a esperança de o patamar de 20% de votos ser suficiente para levar candidatos ao segundo turno. Isso aconteceu em 1989, quando a fragmentação de candidaturas permitiu que Lula fosse ao segundo turno contra Fernando Collor de Mello, com cerca de 17% dos votos. Resta saber se, caso essa pontuação seja suficiente, o parlamentar manterá o atual patamar até outubro.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.