Petrobras: fim da tese ou só mais um ruído? O que as falas do CEO sinalizam sobre as ações

Analistas de mercado não veem as falas de Jean Paul Prates de cautela em dividendos e foco em transição energética como "novidade", mas reiteram que elas trazem um lembrete sobre os possíveis riscos de investir na estatal

Lara Rizério

Jean Paul Prates (PT-RN). (Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado)

Publicidade

A expressiva perda de valor de mercado de R$ 30 bilhões da Petrobras (PETR3;PETR4) na última quarta-feira (29) – com as ações caindo mais de 5% após as falas do CEO sobre diversos temas, principalmente mudanças em dividendos – trouxe mais um alerta sobre os possíveis riscos de se investir na petroleira estatal e se ainda vale corrê-lo após as fortes altas. Por outro lado, também gera questionamentos sobre o que realmente há de novidades nas falas de Jean Paul Prates. As indicações são de que, apesar das sinalizações gerarem risco, não há expectativas de mudanças tão bruscas na companhia.

Em entrevista para a Bloomberg, o CEO afirmou que a Petrobras será mais cautelosa no pagamento de dividendos extraordinários à medida que se move para se tornar uma potência de energia renovável e que “o mercado deveria entender que a companhia tem que pagar menos proventos dados os esforços de transição energética da empresa”. O CEO pontuou que, em dez anos, cerca de metade da receita da companhia virá de energia eólica, solar e combustíveis renováveis e que a companhia buscará fazer aquisições neste ano para impulsionar a mudança.

Conforme destaca o Bradesco BBI, à medida que se aproxima do anúncio do pagamento extraordinário de dividendos da Petrobras, o mercado fica mais nervoso com comentários sobre o assunto, e as interpretações acabam fazendo com que as ações da Petrobras reajam como “uma opção próxima do vencimento”. Por outro lado, pondera, em diversas outras ocasiões no passado, o CEO disse que os investidores deveriam confiar na competência da empresa na alocação de capital.

Continua depois da publicidade

As falas, de qualquer forma, reverberaram por levar a uma interpretação de que já haveria impacto na distribuição de proventos no curto prazo, uma vez que as expectativas do mercado quanto ao pagamento de dividendos estavam mais próximas de um valor máximo ao potencial a ser distribuído. O Goldman Sachs também ressaltou que os comentários tiveram recepção negativa pelos investidores, já que a maioria deles tem se focado no potencial anúncio de dividendos extraordinários a ser feito em conjunto com o balanço, no próximo dia 7 de março.

No call de fechamento da bolsa brasileira, contudo, a Petrobras informou que não há qualquer decisão tomada em relação à distribuição de dividendos ainda não declarados. A companhia acrescentou que as decisões da alta administração sobre dividendos, que inclui a proposta de destinação do resultado, a ser submetida à aprovação de assembleia geral ordinária em 25 de abril, serão tomadas com base em sua nova política de remuneração.

O BBI destaca três cenários. O seu base continua a ser o de que a empresa pagará entre US$ 8 e 9 bilhões em dividendos totais, enquanto o mercado está principalmente ancorado em um dividendo total de US$ 8 bilhões para os resultados do 4T23. Qualquer número nitidamente abaixo deste valor (ou seja, entre US$ 5 e 6 bilhões) irá decepcionar, avalia.

Continua depois da publicidade

“Dito isso, a entrevista de Prates foi muito parecida com o que ele vinha contando ao mercado no passado. É óbvio nesta fase que a Petrobras pagará muito menos dividendos em 2023 do que em 2022, quando a empresa pagou o produto da venda de vários ativos”, aponta. O banco lembra que, mesmo que a Petrobras pague de US$ 8 a 9 bilhões em dividendos para o 4T23 (R$ 3,00 a R$ 3,40 por ação), isso representará uma queda de 55% frente aos dividendos pagos em 2022. A empresa distribuiu R$ 16,60 por ação em dividendos relativos a 2022. Mesmo assim, o rendimento continuará muito atrativo.

Além dos dividendos em si, o BBI pontua que, globalmente falando, o mercado não gosta de investimentos na transição energética. As empresas que estão fazendo um maior esforço na transição energética (europeias) estão negociando com um enorme desconto de avaliação em relação às empresas cujos esforços são mais contidos, ressalta. Desta forma, são necessários rendimentos de dividendos mais elevados porque os investimentos na transição energética têm um retorno marginalmente inferior sobre o capital.

“Hoje, a Petrobras é vista como uma empresa que faz esforços racionais e contidos na transição, principalmente no âmbito de uma empresa petrolífera (como, por exemplo, captura de carbono e refinarias verdes). Ao mesmo tempo, o mercado transmitiu a mensagem de que, se os dividendos caírem ainda mais, será necessário um desconto incremental nas ações”, avalia.

Continua depois da publicidade

Para a Genial Investimentos, chama a atenção a meta de alcançar a metade das receitas da empresa em apenas 10 anos. Atualmente, a Petrobras deve encerrar o ano de 2023 com uma receita líquida de R$ 470 bilhões. Assim, alcançar a metade da receita da empresa nesse período de tempo significaria alcançar uma receita superior a seis vezes a atual receita da Eletrobras. “Ou seja, achamos essa meta inexequível. Entretanto, é importante mencionar que mesmo a execução parcial para além daquilo que já foi anunciado em seu planejamento estratégico (e em teoria, já precificado e/ou estimado pelo mercado) já deve trazer impacto negativo no fluxo de dividendos da empresa – importante lembrar que a fórmula dos dividendos é (45% o Fluxo de Caixa Operacional – Investimentos) e maiores investimentos vão levar a uma menor distribuição de dividendos”, reforça.

A casa de análise ainda cita que o tema aquisições por parte da empresa sempre foi um ponto de risco a tese da empresa, não apenas pelo preço a ser pago quanto no que diz respeito ao segmento de atuação do ativo que está sendo adquirido. Atualmente, a empresa anunciou o valor de US$11 bilhões em aquisições estratégicas. A julgar o recente fluxo de notícias, a empresa deve readquirir uma participação na Refinaria RLAM (privatizada em 2021), ativos em energias renováveis e participações no segmento Petroquímico (possivelmente na Braskem).

Um dos comentários realizados pelo CEO também diz respeito à preocupação da empresa em relação a fornecedores. “Se por um lado um plano ambicioso de expansão no segmento de energia renovável por si só já é razoavelmente preocupante, a construção de uma cadeia de fornecedores para atendimento dessa indústria também nos traz preocupação quanto ao fluxo de investimentos esperado pela empresa para sustentar esses novos fornecedores, o que deve encarecer os investimentos nos projetos dessa indústria – algo que também deu errado em um passado recente”, avalia a Genial.

Continua depois da publicidade

O BBI espera que a Petrobras termine 2023 com uma posição de caixa e equivalentes de, aproximadamente, US$ 20 bilhões. Mesmo contabilizando US$ 5 bilhões em fusões e aquisições e US$ 5 bilhões em pagamentos extraordinários de dividendos, a empresa deve encerrar 2024 com uma posição de caixa próxima a US$ 14 bilhões em 2024 -muito superior ao nível ideal de US$ 8 bilhões que a empresa assumiu em seu plano estratégico. “Portanto, se os dividendos extraordinários decepcionarem, o mercado começará a colocar muitas questões sobre a razão pela qual a empresa poderá estar retendo dinheiro no seu balanço”, afirma o banco, que segue com recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado, equivalente à compra), com preço-alvo de R$ 48 para os ativos PETR4 (com potencial de valorização, ou upside, de 19% frente o fechamento da véspera).

O Goldman Sachs também tem recomendação de compra para a companhia. “Acreditamos que a correção do preço das ações observada ontem indica que os investidores estão se tornando significativamente mais céticos em relação à possibilidade de um dividendo extraordinário ser anunciado em 7 de março, dada a magnitude da queda do preço das ações (de 5,5%) vis-à-vis o potencial dividendo adicional (7%). Na nossa opinião, isto leva a uma melhor assimetria nos lucros do 4T e a possibilidade de um dividendo extraordinário permanece viável à luz da forte geração de fluxo de caixa livre da Petrobras”, ressalta.

A Genial, por sua vez, segue com recomendação neutra para PETR4, com preço-alvo de R$ 47, ou upside de 16%. Os analistas da casa ressaltam ser importante mencionar que declarações que podem ser interpretadas como “polêmicas” não são uma novidade. Sendo assim, preferem estar céticos quanto a eventuais mudanças bruscas na condução da empresa e em relação ao seu atual corpo executivo – maiores anúncios devem ser realizados em seu Planejamento Estratégico anual. “Se por um lado é muito cedo para interpretar o eventual impacto dessas notícias nos fundamentos da empresa, por outro lado, é muito fácil entender que as recentes declarações aumentam a percepção de risco em relação a sua tese, com natural impacto na percepção de valor da empresa em relação aos seus fundamentos”, afirma. Os analistas veem a ação a valores muito interessantes, mas preferem alterar a recomendação em um momento mais apropriado e com maior margem de segurança por entenderem que a PETR4 é um case com maior risco versus pares privados.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.