O governo recua para não sofrer um baque no ajuste fiscal

Um dia depois de comemorar uma vitória na Câmara e outra no Senado, o Palácio do Planalto teve de adiar votação no Senado para não prejudicar as medidas de ajuste do ministro Levy. O dia de ontem mostrou que a presidente continua politicamente frágil.

José Marcio Mendonça

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Não passou de uma ilusão o alívio e a alegria que o governo teve na anteontem com aprovação no Senado, por 52 votos a favor e 27 contrários, de Luiz Fachin para a vaga do ex-ministro Joaquim Barbosa no Supremo Tribunal Federal (STF).

Assessores palacianos e o pessoal da articulação política do governo consideraram que finalmente estavam superadas as dificuldades do governo no Senado. Para alguns dos homens de Dilma, o Palácio do Planalto havia impingido uma séria derrota ao presidente da Casa, Renan Calheiros – que com quase nenhuma sutileza chegou a fazer pressão sobre os colegas para derrubar a indicação de Fachin.

A mesma “sensação” de que seus problemas com boa parte dos aliados estavam superados também na Câmara os governistas tiveram na mesma terça-feira com a aprovação, pelos deputados, também com alguma facilidade, da MP de aumento de impostos de importação para determinados produtos.
Ontem, menos de 24 horas depois dos bons ventos, a presidente, seus lideres e conselheiros sentiram que o mar continua pouco amigável para o governo lá no Congresso. Havia a expectativa de que o Senado desse o aval definitivo para a MP 665, com alterações nas regras do seguro-desemprego. Não deu. Diante do risco de uma derrota, o líder do governo na Casa, Delcídio Amaral, manobrou para que a votação fosse adiada para terça-feira que vem.

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E Delcídio, experiente parlamentar, escolhido recentemente para a liderança por Dilma, depois que outros nomes convidados pela presidente recusaram a honraria, disse ainda que vai sugerir à presidente desistir de alterar a concessão do abono salarial, outro item da MP.

À tarde, 11 senadores, com governistas do PT e outras legendas, apresentaram um manifesto condenando as medidas de ajuste fiscal do ministro Joaquim Levy e pregando sua derrubada.
Já na Câmara, o Palácio do Planalto, que esperava aprovar também entre ontem e hoje o projeto-de-lei da desoneração da folha de pagamento (aumenta alíquota da contribuição patronal para a Previdência calculada sobre o faturamento da empresa), amargou outra decepção.

O relator da proposta, deputado Leonardo Picciani, líder do PMDB e ligadíssimo ao deputado Eduardo Cunha, outra pedra no caminho de Dilma no Legislativo, decidiu não apresentar seu relatório agora e marcou a votação inicialmente para 10 de junho. Picianni continua disposto a alterar o texto original, o que o ministro da Fazenda quer editar de toda forma. 

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A mercadoria do voto 

O governo se iludiu com um certo clima de calmaria verificado no Legislativo desde a semana passada, considerado por muitos como fruto do início das nomeações dos indicados do parlamentares para o segundo e o terceiro escalão da administração federal. Como as nomeações estão saindo aos poucos, os “franciscanos”, que tinham dado um voto da confiança ao Planalto, parecem ter decidido receber tudo primeiro para depois entregarem a mercadoria do voto.
No caso do Senado o governo ainda cometeu dois equívocos. Primeiro, não percebeu o recado dado por alguns senadores quando recusaram a nomeação de Guilherme Patriota para embaixador na OEA. E segundo, ter comemorado a “derrota” de Renan na boa votação de Fachin para o STF. Renan deu o troco. Diz a coluna “Painel” da “Folha” que o presidente do Senado está ainda articulando a derrubada de alguns vetos de Dilma na semana que vem.

Esses tropeços do Palácio do Planalto ontem na Câmara e no Senado confirmam o que muita gente já comentava em Brasília e fora de lá: a coordenação política do governo, mesmo com o vice-presidente Michel Temer como seu novo comandante, continua frágil e só funciona razoavelmente quando turbinada. Com concessões, a cada votação. Politicamente, a presidente continua frágil.

E ainda mais: o atraso na votação das mudanças na desoneração fiscal diminui ainda mais a receita possível que Levy pretendia colher este ano, complicando o ajuste fiscal planejado pela Fazenda. Como a revisão orçamentária deve sair até amanhã, será importante observar se o governo está contabilizando esses possíveis tropeços de seus projetos no Congresso. Uma solução de Levy é aumentar impostos.

“O Globo” diz que os cortes no Orçamento vão atingir financiamentos e programas sociais. O PAC e o Minha Casa Minha Vida serão alcançados.
Esse misto de cortes de despesas e aumentos de impostos tende a azedar ainda mais o humor dos aliados políticos da presidente. 

Outros destaques dos jornais do dia

– CASA PRÓPRIA – Embora a presidente Dilma Rousseff venha repetindo que os programas sociais de seu governo não serão prejudicados pelo ajuste fiscal, principalmente o Minha Casa MinhaVida não é bem assim. Segundo a manchete da “Folha de S. Paulo” de hoje, a Caixa Econômica Federal, cortou R$ 25 bilhões de sua linha de crédito para casa própria. A Caixa financia sete entre dez imóveis no Brasil. O montante cortado representa 20% do que foi liberado para instituição em 2014. É o segundo ano consecutivo de recuo nos créditos da Caixa para a habitação. É mais um baque para o setor de construção civil, um dos mais atingidos pela baixa atividade da economia brasileira.O ministro Joaquim Levy disse na semana passada que está estudando medidas de amparo à construção civil, mas não deu nenhuma indicação do que virá. Bancos e construtoras estão pedindo ao Banco Central para liberar parte do depósito compulsória da poupança para injetar recursos no setor.

– CHINA – Os acordos assinados entre o Brasil e a China terão efeitos práticos na nas áreas de aviação, petróleo, mineração e agronegócio, informa a “Folha”. Petrobras e Vale, por exemplo, terão financiamento de US$ 11 bilhões. Há indefinição acerca do empréstimo para obras de infraestrutura. O acordo não prevê valores, e os governos criarão um comitê para avaliar prioridades. Diz o “Valor” que os chineses tiram vantagem das dificuldades do Brasil.

– ATIVIDADE ECONÔMICA I- O quadro de recessão da economia brasileira desde o ano passado e o cenário de alta de juros têm afetado a geração de caixa por parte das empresas e elevado a taxa de inadimplência. Dados da Serasa mostram que, em março, dos sete milhões de empresas que atuam no País, 3,8 milhões estavam com dívidas em atraso, número recorde. “A grande maioria das empresas negativadas é formada por pequenas e médias e elas concentram a maior parcela da geração de empregos no Brasil. A falta de caixa para honrar as dívidas também impacta o pagamento de salários, o que ajuda a engrossar as taxas de desemprego”, afirmam os economistas da entidade, em nota. Segundo a Serasa, o valor total da dívida das empresas soma R$ 86,4 bilhões, uma média de R$ 22,8 mil por CNPJ negativado. A maior parte está devendo para apenas um credor (59,0%). Do total, 20,6% devem para mais de três credores e 20,3% estão com pagamentos pendentes para dois credores.

– ATIVIDADE ECONÔMICA II – O setor de serviços apresentou uma ligeira recuperação em março, mas insuficiente para animar os analistas. No mês, a receita do setor cresceu, em termos nominais, 6,1% em relação a março do ano passado. O resultado é melhor do que nos dois primeiros meses de 2015, mas, ao descontar o efeito da inflação, o setor não escapou de nova queda. “Descontada a inflação de serviços, a receita real do setor recuou 1,9%, a décima terceira queda consecutiva nesse tipo de comparação”, destacou a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

E mais:

– “PSDB diz que não é hora ainda de pedir impeachment” (Folha)

– “Governo deve acabar com alternativa que remunera acionista” – (Folha)

– “TCU critica novo modelo de concessão ferroviária” (Valor)

– “Fazenda quer taxar mais lucro de bancos e empresas” (Valor)

– “Para mercdo, BC não escapará de elevar a Selic para 14%” (Valor)

– “Aumento para o Judiciário avança no Senado” – (Globo) 

– “Governo quer liberar 30% do FGTS para fundo” (Estadão)

– “Linhão da hidrelétrica de Belo Monte vai atrasar no mínimo oito meses” (Estadão)

LEITURAS SUGERIDAS

Clóvis Rossi – “Acertaram Marco Aurélio” (comenta a rejeição pelo Senado de indicado por Dilma para a OEA e diz que foi derrota do assessor especial de Dilma) – Folha   

Cláudio Gonçalves Couto – “Indicações e reformas” (diz que os casos de Fachin e Patriota evidenciam não só a fragilidade do governo, mas a importância da deliberação sobre as indicações) – Valor   

Editorial – “Ata do Fed aponta que alta dos juros vai ficando para depois” – Valor   

Mário Mesquita – “História contrafactual” (comenta política do BC e diz que convergir para a meta de inflação em 2015 é possível, mas ainda questionável) – Valor   

Izabela Correa e Alexandre Gonçalves – “A caixa-preta do BNDES” (diz que num banco público a transparência deve ser regra e o sigilo exceção) – Estadão