Netflix: se não pode vencê-la, junte-se a ela

Por que a guerra do streaming não é entre os serviços de streaming.

Equipe Stock Pickers

Já pensou se você entrasse numa agência do Itaú para abrir uma conta e o atendente te oferecesse um pacote incluindo serviços oferecidos pelo banco Inter?

Pode parecer algo bem estranho, mas é justamente isso que está acontecendo no mercado de mídia atualmente.

Netflix e a falsa narrativa

No episódio, 65 do Stock Pickers, “Netflix, Luxottica e as gringas preferidas dos gestores brasileiros”, pedimos para cada um dos participantes realizar um verdadeiro stock picking durante a gravação. Gabriel Raoni, da IP, escolheu uma empresa norte-americana que está fazendo muito barulho no nicho de conteúdo: Netflix.

A IP, inclusive, dedicou um relatório completo de gestão para falar sobre essa tese (vale ressaltar que a gestora passou um ano estudando antes de investir na empresa).

Segundo Raoni, a oportunidade apareceu após a criação de uma narrativa pela mídia sobre a competição entre as diferentes plataformas de streaming de conteúdo: Netflix, Disney, Apple, HBO, Amazon… Recentemente, Disney e Apple lançaram seus serviços, e com isso as ações da Netflix caíram bastante.

A IP enxergou uma oportunidade e fez um investimento relevante na companhia. “A mídia errou a narrativa, gerou um ruído no mercado e criou uma oportunidade para a gente”, contou Raoni. Para ele, Netflix não está concorrendo com a Disney Plus ou com a Apple TV. As três podem vencer por que na verdade estão competindo com a TV aberta e com a TV por assinatura.

Mais por menos

No mundo existem, aproximadamente, 800 milhões de assinantes de TV a cabo e 200 milhões de Netflix. A TV a cabo, nos EUA, custa US$ 100 e a Netflix apenas US$ 13. Para Raoni, o serviço de conteúdo prestado pela Netflix é muito superior e com um preço muito inferior ao da TV a cabo. Para se ter uma ideia dessa superioridade, a Netflix criou sua primeira série original em 2013: House of Cards.

Em 2019 a empresa lançou 371 séries e filmes originais. “É uma bazuca de conteúdo”, resumiu Raoni.

 A IP aprendeu muito sobre a empresa estudando o próprio mercado brasileiro. Historicamente, o mercado brasileiro de TV a cabo perde assinantes numa velocidade surpreendente. Em 2014 foi o ápice de assinaturas (20 milhões). Atualmente, são 15 milhões de assinantes e esse número cai 10% ao ano.

Enquanto isso, a Netflix já tem mais de 10 milhões de assinantes somente no Brasil. O que mais surpreendeu a gestora foi perceber que já existem muitas pessoas no país que nunca assinaram a TV a cabo e têm Netflix. E isso é uma tendência, porque a empresa está tendo muito sucesso em mercados emergentes e entre pessoas com baixo poder aquisitivo.

No Brasil, o preço médio da assinatura da Netflix é R$ 33, enquanto isso, uma TV a cabo pode chegar até R$ 200.

“É um negócio muito barato”, conclui Raoni.

E o valuation

A empresa começou a gerar fluxo de caixa positivo recentemente, pois ficou anos com uma estratégia agressiva de aquisição de conteúdo. Nesse período, com um crescimento extraordinário, atingiu a marca de 200 milhões de assinantes no mundo. “O que a gente vê hoje na Netflix é uma empresa que tem uma das maiores distorções de preço cobrado e serviço ofertado”, segundo Raoni.

“É muito descompassado”, continua o gestor. “A empresa tem um ticket médio de mais ou menos US$ 11. Se você colocar mais US$ 5 de poder de preço, que a gente acredita que vai acontecer ao longo de vários anos, vezes 200 milhões (de assinantes) é um bilhão! Multiplicando isso por 12 (meses) dá US$12 bilhões. Você consegue adicionar US$12 bilhões de receita facilmente e isso, depois de taxas, dá US$10 bilhões de lucro.

A empresa hoje vale US$ 215 bilhões de dólares. “Vemos uma empresa que tem hoje 200 milhões de assinantes mas pode ter 400 milhões”, conclui.

Com uma base tão grande de clientes, a Netflix acaba criando para si mesma uma outra vantagem. Como tem um números enorme de assinantes, acaba sendo vantajoso para os produtores de conteúdo serem distribuídos por ela. “Esse é um jogo de escala. É um jogo de audiência.”

Must have e losing game

A empresa está se tornando um item quase essencial na vida das pessoas, porque, como disse Raoni, se você não tem Netflix, você se torna um alienado social: “as pessoas conversam das séries e você não sabe o que está acontecendo no mundo se não é assinante”. É melhor juntar-se a ela, porque não é possível vencê-la.

Lembra-se da história que criamos lá no início sobre Itaú e Inter? É exatamente isso que está acontecendo nesse setor: as empresas que deveriam competir com a Netflix estão oferecendo os serviços da empresa. Até os provedores de TV a cabo oferecem pacotes de assinatura com Netflix.

É o competidor promovendo o produto do concorrente, porque é melhor se associar e oferecer produtos extras, como banda larga e telefonia, do que tentar competir. Para Raoni, é um negócio surpreendente, porque é muito raro você ver uma situação dessa: competidor oferecendo seu produto.

 

 

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