Não foi a queda de 40% do lucro: o que desagradou no resultado do Bradesco e fez a ação cair mais de 7%

Enquanto provisões foram elogiadas, aumento da inadimplência já no primeiro trimestre desapontou; contudo, perspectiva segue positiva

Lara Rizério

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Se o resultado do Santander Brasil ((SANB11), que fez com que as units do banco saltassem mais de 11% na terça-feira (28), não foi tão bom como poderia parecer à primeira vista por conta da baixa provisão, o Bradesco (BBDC4) seguiu na direção contrária e apresentou números considerados mais realistas em meio ao cenário de pandemia do coronavírus. Após o balanço, os papéis fecharam em queda de 7,22%, a R$ 19,15, na sessão desta quinta-feira (30).

O segundo maior banco privado do país viu seu lucro líquido recorrente encolher 39,8% no primeiro trimestre deste ano em meio à Covid-19 por conta das maiores provisões, o que levou a cifra no período para R$ 3,753 bilhões ante o mesmo período de 2019. Em relação aos três meses anteriores, a queda foi ainda maior, de 43,5%.

Houve um reforço de R$ 2,7 bilhões em provisões para devedores duvidosos, as chamadas PDDs, feitas no primeiro trimestre por conta da pandemia. Este valor, somado à parcela pré-existente de R$ 2,4 bilhões, totaliza uma provisão complementar para o “cenário econômico adverso” de R$ 5,1 bilhões.

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Com isso, a rentabilidade sobre o patrimônio líquido médio (ROE, na sigla em inglês) diminuiu praticamente pela metade, para 11,7% no primeiro trimestre contra 21,2% nos três meses anteriores.

Porém, não foram esses números em si que trouxeram desconforto com relação aos números do banco, considerados coerentes por analistas após dados de provisões que não agradaram no Santander.

O que não agradou foram os dados que mostraram que a qualidade dos ativos se deteriorou mais rápido do que o esperado. Assim, se as provisões buscaram traçar um impacto sobre as perspectivas sobre a carteira de crédito, os dados efetivos do primeiro trimestre não foram positivos.

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Todos os segmentos de crédito tiveram aumento na inadimplência, que cresceu 40 pontos-base trimestralmente, para 3,7%, enquanto as inadimplências dos segmentos aumentaram em: i) 40 bps para 1,2% na carteira de grandes empresas; ii) 80 bps para 4,5% nas pequenas e médias empresas; e iii) 40 bps para 4,8% nas pessoas físicas.

Assim, de forma a fortalecer eventuais futuros aumentos na inadimplência, o Bradesco aumentou o custo de crédito em 86% anualmente, para uma cifra de R$ 6,7 bilhões. Porém, como o saldo de inadimplentes aumentou em quase R$ 4 bilhões, o índice de cobertura do banco – relação entre empréstimos inadimplentes e provisões – baixou 41 pontos percentuais anualmente, para 228%. “O resultado foi inesperado, uma vez que tivemos apenas cerca de 15 dias de isolamento [por conta da pandemia do coronavírus] no primeiro trimestre e as postergações deveriam ter suavizado a inadimplência”, avalia Marcel Campos, analista da XP.

Por outro lado, nesse ponto, o Morgan Stanley avalia que, excluindo os efeitos das provisões, “os resultados não parecem muito ruins, com leve queda do lucro em comparação ao quarto trimestre do ano passado, um efeito bastante normal na passagem do último trimestre de um ano para o primeiro de um novo ano”.

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Já o Itaú BBA e o Credit Suisse também destacaram uma queda do resultado no segmento de seguros, de 23,4% anualmente, para R$ 2,9 bilhões. “Nós vemos o resultado como negativo devido à deterioração mais rápida que a esperada nos indicadores da qualidade dos ativos. Os resultados dos seguros também decepcionaram. O lucro gerencial chegou 38% abaixo das expectativas do mercado. No lado positivo, houve crescimento nos empréstimos para as empresas”, avalia o Credit.

A XP também ressalta que os gastos administrativos, operacionais e com pessoal vieram acima do esperado, uma vez que a expectativa era de menores gastos não relacionados a pessoal nesse período de isolamento. A gestão apontou que os gastos com investimentos prejudicaram o resultado, uma vez que a depreciação dos mesmos está aumentando.

De forma geral, as despesas no trimestre foram de R$ 7,359 bilhões, 17% acima frente o mesmo trimestre de 2019 e 59,2% acima do quarto trimestre. O número foi compensado de forma parcial por receitas com recuperação de crédito de R$ 1,420 bilhão, 52,8% inferiores ao primeiro trimestre do ano passado e 7,9% abaixo do quarto trimestre.

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Já do lado positivo, o analista da XP destaca que, embora 3% abaixo das estimativas da XP, a margem financeira apresentou um sólido resultado de R$ 14,6 bilhões. “Destacamos também que o teto no juro do cheque especial e o menor número de dias úteis afetaram o trimestre”, aponta Campos.

Além disso, a carteira de crédito ampliada do Bradesco somou R$ 655,094 bilhões ao fim de março, volume 5,1% superior ao registrado em dezembro. Em um ano os empréstimos tiveram incremento de 17,0%. O destaque ficou para empréstimo à pessoa jurídica, que cresceu 6,6% no primeiro trimestre ante o quarto, para R$ 415,880 bilhões, em meio à procura das companhias por liquidez e o mercado de dívidas não possui demanda adequada. Na pessoa física, a alta foi de 2,6%, para R$ 239,214 bilhões. Ante um ano, essas carteiras tiveram elevações de 15,6% e 19,5%, de forma respectiva.

Octavio de Lazari, presidente do banco, destacou em teleconferência para a apresentação de resultados que, apesar de o volume de recursos cedidos às empresas de grande porte ter subido, a tendência é de estabilização.

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O grande destaque positivo, por sua vez, ficou com a receita de prestação de serviços, que ficou em R$ 8,283 bilhões, uma queda de 6,2% na comparação com o quarto trimestre de 2019, mas em alta de 2,6% na comparação anual. “Destaque principalmente para receita com corretora, que deve ter se beneficiado do aumento de volumes em bolsa”, ressalta a XP.

Próximos passos

Durante a teleconferência, o CEO do Bradesco reforçou ainda a análise de que ainda não sabe nem a dimensão e nem a extensão da crise. Mas apontou: ela será de longa duração e pode levar a instituição a realizar provisões adicionais, se julgar necessário, com base no cenário.

Neste cenário, apontou o CEO, as novas operações de crédito feitas durante o coronavírus – com exceção das linhas emergenciais que foram criadas de forma específica para o momento – podem ter juros e spreads (diferença entre a taxa de captação e os juros pelos quais o banco faz empréstimos) maiores, devido ao aumento de risco.

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Lazari disse que, ainda que os juros de operações negociadas com clientes e de linhas alternativas não sofram alterações, a demanda por novos recursos passará por um crivo maior do banco, o que deve pressionar as taxas em meio ao ambiente de maior risco. “Temos também mapeado alguns setores que vão sofrer mais e, principalmente nesse cenário, as empresas também terão que ter consciência maior do quanto podem se alavancar”,reforçou.

Como consequência do novo ambiente em meio ao coronavírus, o Bradesco vai fechar mais agências do que o previsto para este ano, entre 320 e 330, ante plano inicial de encerramento de 300 agências.

“Temos que ser conscientes de que o modo de trabalhar e a maneira das pessoas se relacionarem com o banco devem mudar. À luz disso, teremos mais funcionários em home office e menos clientes passando por agências físicas. Isso fará parte da reprogramação de agências e é uma nova forma de pensar que vamos desenvolver, seja para mudar ou para fechar estruturas físicas”. Segundo Lazari, um dos legados da crise da pandemia será que o Bradesco terá espaço para ajustes maiores na rede de agências e estrutura física.

O Bradesco também decidiu suspender seus guidances de desempenho para 2020, apontando que as incertezas causadas pela pandemia mudaram o cenário e reduziram a previsibilidade do desempenho dos negócios.

Com tantas mudanças no radar e a expectativa de que a instituição financeira apresente suas estimativas para o ano apenas quando houver menor incerteza, a visão da maior parte dos analistas para o banco segue positiva, destacando principalmente a resiliência da instituição e o valuation atrativo em meio à forte queda (de cerca de 40%) das ações em 2020.

Credit Suisse, XP, UBS e Itaú BBA seguem com recomendação de compra ou equivalente à compra para os ativos BBDC4, com preços-alvo respectivos de R$ 41,82, R$ 28, R$ 27 e R$ 38 (o que configura potenciais de valorização respectivos de 107%, 35%, 31% e 84% frente o fechamento das ações na véspera). Já o Morgan Stanley possui recomendação para os ADRs com preço-alvo de US$ 6,82. De acordo com a Bloomberg, de 20 casas que cobrem o papel, 19 recomendam compra e apenas uma recomenda manutenção.

O cenário que se desenha é visto como bastante desafiador por conta do coronavírus e pode se deteriorar ainda mais no segundo trimestre. Porém, o setor segue sendo visto como bastante resiliente em meio aos cenários de crise, tendo o Bradesco como um dos destaques. Assim, apesar do resultado não ter sido positivo, a queda nesta sessão pode também ser atribuída muito mais à forte alta dos ativos nas duas últimas sessões, que levou a um movimento de correção em uma sessão de aversão ao risco do mercado.

(Com informações da Agência Estado)

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.