Levy ainda vai à luta, apesar de irritado com o tamanho do pacote

Setores do governo temeram um pedido de demissão do ministro da Fazenda depois que ele não compareceu à entrevista para explicar o pacote na sexta-feira. Mas Levy pode buscar outras saídas, como administrar o dinheiro na boca do caixa, independentemente da autorização para gastos

José Marcio Mendonça

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A ausência do ministro Joaquim Levy no anúncio, sexta-feira, do pacote de cortes no Orçamento causou rebuliço interno e externo, no governo e fora dele. Pouca gente considerou a explicação oficial de uma forte gripe, coisa séria. O ministro quis mesmo é marcar posição contra o tamanho da tesourada, de R$ 69,9 bilhões.

O ministro da Fazenda queria mais, acima de R$ 70 bilhões e o mais próximo possível dos R$ 80 bilhões, mas foi derrotado pelos “argumentos” dos ministros Aloizio Mercadante e Nélson Barbosa de que seria uma paulada grande demais numa economia muito fraca. Dilma acatou esse “lado político” e Levy fez um gesto para mostrar descontentamento, para mostrar sua irritação.

A partir daí temeu-se até que ele poderia pedir demissão. Não parece ser esta, porém, no momento, a intenção de Levy. Com o gesto ele pode ter estancado os movimentos dentro do governo e nos aliados, para reduzir seus planos de ajuste fiscal. Ninguém esperava uma atitude assim “rebelde” de um ministro e se assustou.

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Segundo informam os jornais “O Estado de S. Paulo” de hoje, o ministro, que passou o fim de semana fora da capital, não vai sair. Pelo menos por enquanto. Ele volta hoje a Brasília para intensificar as negociações para aprovar suas medidas no Congresso. Diz-se que a estratégia de Levy é ganhar pelo cansaço. E na boca do caixa: as despesas estão liberadas, porém ele fecha o cofre.

Levy quer as medidas nas mãos do Congresso o mais rapidamente possível e sem muitas alterações. As MPs 664 (mudanças em benefícios da Previdência) e 665 (alterações no seguro desemprego e abono salarial) vencem segunda-feira se não forem votadas. Estão no Senado e se sofrerem qualquer modificação em relação ao que a Câmara aprovou, será o fim. O tempo para elas é exíguo. 

E há ainda o projeto de mudanças na desoneração fiscal, que a Câmara está demorando a decidir (a votação agora está marcada para o dia 10) – e quer alterar o original. Esses atrasos e mudanças diminuem as expectativas de arrecadação e de economia.

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Resistências mais explícitas

O problema de Levy é que as resistências a ele a ao ajuste fiscal estão crescendo e ficando mais explícitas, agora reforçadas pelo embates dentro do próprio governo, que ficaram visíveis na sexta-feira. Para completar, o pacote não foi bem visto por parte dos analistas, que o consideram insuficiente e nem sempre executável se não houver um empenho generalizado em Brasília. 

Hoje será possível, com o funcionamento dos mercados e as análises feitas no fim de semana pelos especialistas, sentir melhor qual o nível de apoio que terá o pacote entre os agentes econômicos. Em jogo está também a confiança dos agentes econômicos.

Do lado político, está complicado. O longo encontro que Dilma teve com Lula na manhã de sexta-feira, antes do anúncio do pacote de Levy, causou certa surpresa e perplexidade. Lula está com o foco mais voltado hoje para o PT do que para o governo. Pessoalmente, Lula tem feito críticas a partes do pacote de Levy.

Também as críticas petistas ao ministro da Fazenda e à sua política estão ficando mais explícitas, relatadas agora em documentos (ver comentário de Ricardo Noblat em “O Globo”). Por isso, estão crescendo as pressões dos outros partidos aliados contra as posições de PT. Eles não querem ficar responsáveis por “maldades” contra os trabalhadores enquanto os petistas posam de bonzinhos. Diz a “Folha de S. Paulo” que o ministro da Fazenda cobrará do Palácio do Planalto a adesão do PT ao ajuste fiscal.

Os impostos do PT

O partido realiza seu 5º Congresso no mês que vem, abertura dia 11, em Salvador. O ambiente deve ferver, pois o PT está vivendo uma séria crise de identidade, explicada entre outras coisas pelas acusações de envolvimento no petrolão e por desavenças com a política econômica do Dilma II. Teme-se que os ataques ao governo cheguem ao auge e apareçam no documento final do encontro. Somente Lula pode desanuviar o ambiente. Contudo, hoje ele está uma efígie.

De todo modo, o PT vai cobrar compensações de Dilma por ter engolido pacote de ajuste fiscal e com muita chiadeira estar ajudando a aprová-lo, ainda que com alterações. O PT quer um discurso bonito para justificar-se. A compensação que deve propor, segundo o “Estado de S. Paulo” de hoje, segue na linha de mais aumento de impostos. Para ser pago por quem pode mais, com a criação de dois novos tributos e o aumento de um outro.

O primeiro imposto recairia sobre lucros e dividendos hoje isentos, cujo montante em 2014 foi de R$ 300 bilhões. Os petistas apontam o exemplo do Chile, onde a alíquota máxima é de 25%. 

A segunda proposta é uma bandeira histórica do PT, a tributação de grandes fortunas. O partido se ampara em estudos que apontam a possibilidade de arrecadação de até R$ 100 bilhões ao ano com a taxação a partir de 1% sobre quantias acima de R$ 1 milhão. 

A terceira proposta é aumentar a alíquota do imposto sobre heranças – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, que é estadual –, hoje em 4%. Dirigentes petistas defendem o aumento da taxa para até 15%. De acordo com eles, isso poderia garantir outros R$ 20 bilhões por ano ao governo.

Outros destaques dos jornais do dia

– CASA PRÓPRIA – Segundo o jornal “O Globo”, levantamento da pesquisadora Cláudia Magalhães Eloy, do Laboratório de Habitação da Universidade de São Paulo, os bancos privados têm alocados nas linhas do Sistema Financeiro da Habitação cerca de 36%, ou R$ 93,1 bilhões, do saldo total de suas cadernetas (R$ 255,4 bilhões) – bem menos que os R$ 65 bilhões previstos originalmente. A maior fatia, de 48% (R$ 122,6 bilhões) está aplicada em Fundos de Investimentos Imobiliários e títulos como Letras e Crédito e Certificados de Recebíveis Imobiliários. Diz reportagem do “Estadão” que o setor imobiliário aguarda medidas para frear perdas.

– EMPREGO – Assustou o fechamento de quase 100 mil empregos com carteira assinada no Brasil em abril. O governo, segundo a “Folha” e o “Valor” está se preparando para estancar o que já se afigura uma sangria no mercado de trabalho. O governo pode reduzir a jornada de trabalho, uma sugestão das centrais sindicais, para diminuir as demissões. O corte seria de 30% na jornada e 15% no salário.

E mais:

– “Em entrevista a jornal mexicano Dilma diz não temer impeachment” (Globo)
 
– “Apertem o cinto, o crédito sumiu” (Site da revista Veja)
 
– “Reforma política: relatório corre o risco de ser ignorado” (Globo)
 
– “Divergências entre Câmara e Senado imobilizam a reforma política” (Estadão)
 
– “Fazenda quer inovar crédito a concessões” (Valor)
 
– “Revisão do orçamento mostra dificuldades políticas, dizem economistas” (Valor)

LEITURAS SUGERIDAS

Domingo

  1. Editorial – “Remendos e derramas” (sobre o corte no Orçamento) – Folha
  2. Vinicius Torres Freire – “Plano prevê mais aumento de receita que corte de gasto” (também sobre pacote orçamentário) – Folha

Segunda

  1. Ricardo Noblat – “Dois estranhos no ninho” (a respeito das críticas diretas do PT a  Levy e indiretas a Dilma) – Globo
  2. Paulo Guedes “Quem acredita” (corte orçamentário) – Globo
  3. Editorial – “A prévia do PIB e a insegurança” (comenta a queda da economia levantada pelo índice do BC e fala das dificuldades do governo de retomar a confiança dos empresários) – Estadão
  4. Marcos Nobre “Distritão e revolução” (a respeito da reforma política e da mudança na forma de escolher os deputados) – Valor
  5. Valdo Cruz – “Ruídos no ajuste, riscos no ar” (também sobre o corte orçamentário) – Folha