Petrobras: agora é explicar o futuro

Os debates sobre os critérios adotados para contabilizar os prejuízos com o petrolão ainda vão se prolongar. Mas o que se quer saber agora é o que a empresa vai fazer para se reinventar. E nesse ponto as informações ainda são escassas,mais no terreno das intenções.

José Marcio Mendonça

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A volatilidade do valor das ações da Petrobras ontem na Bovespa – e mesmo em alguns mercados externos – demonstra que o balanço da empresa do ano passado, divulgado anteontem com os arranjos contábeis para incorporar os prejuízos do petrolão, demoraram a serem deglutidos pelos analistas. E que deverá ainda demorar algum tempo para tudo ser entendido e a estatal brasileira entrar numa rota de normalidade.

A própria tramitação do balanço nos canais competentes não foi tranqüila, apesar do aval sem ressalvas da auditoria Price. Reportagem da “Folha de São Paulo” informa que membros do Conselho Fiscal chegaram a pedir mais tempo para analisar os números, causando uma confusão de última hora que atrasou a entrevista de Aldemir Bendini,  e também que os três conselheiros independentes não aprovaram o relatório – um se absteve e dois votaram contra.

Parte das dúvidas levantadas refere-se à busca de entender como os prejuízos foram calculados – e se outras baixas necessitarão ser realizadas no futuro. O próprio presidente da estatal, Aldemir Bendini, disse na entrevista de quarta-feira que os efeitos totais da corrupção que estão sendo levantados pela Operação Lava-Jato são imprevisíveis. O Ministério Público Federal no Paraná e a Polícia Federal não cansam de surpreender com novas e escabrosas revelações sobre as “malfeitorias” na empresa.

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Um dos pontos de maior desconfiança é sobre as dívidas da empresa, como levantou o jornal “O Estado de S. Paulo”: “Durante a teleconferência realizada pelos executivos para explicar os dados do balanço, os analistas financeiros concentraram suas perguntas sobre o endividamento da estatal e sua capacidade de produção para gerar caixa”. A dívida da líquida da Petrobras, de R$ 282 bilhões, representa 48% do seu patrimônio, bem acima do limite prudencial de 35% admitido por ela.

Em nota a agência de classificação de risco Standard & Poors disse que o prejuízo de 2014 não afeta mais a imagem da companhia, mas mantém sua avaliação negativa para o crédito porque a nota reflete as incertezas sobre a capacidade de a Petrobras aumentar sua produção.

Na teleconferência a empresa reforçou o propósito de se livrar de ativos, inclusive campos do pré-sal, e compartilhar atividades. A questão para os especialistas agora é começar a agir. Bendini confirmou ao colunista Celso Ming, do “Estadão”, que a Petrobras vai se concentrar agora em seu principal negócio que é a exploração e a produção de petróleo.

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A empresa também teria liberdade na formação do preço de venda dos combustíveis, num cenário de 180 dias, para evitar os prejuízos que teve com o negócio no passado recente, para ajudar a política antiinflacionária do governo. E também para não prejudicar o embalo eleitoral da recandidatura da presidente Dilma.

Em resumo, o que os investidores querem saber é sobre o futuro da Petrobras, o passado negro dos últimos anos está sendo sepultado. Com acuidade o jornal “Valor Econômico” fala ainda em “passado incerto” e “futuro duvidoso” para a estatal.

Informa o jornal “O Globo” que a Petrobras, na contramão do que pretende o governo, que é evitar que as grandes empreiteiras fiquem em situação de não poderem participar de negócios como novas licitações, por punições legais ou por questões financeiras, vai processar os fornecedores que participaram do cartel em obras da companhia.

A estatal vai buscar não apenas o ressarcimento dos recursos desviados, mas também indenizações por danos morais e até multas que venham a ser aplicadas em processos judiciais ou acertadas em acordos de leniência firmados pelo poder público. As informações constam do balanço da companhia divulgado anteontem, em que a perda com corrupção é estimada em R$ 6,2 bilhões. 

Haddad acua Dilma e Levy

Quando a questão da mudança no pagamento da dívida dos Estados e dos municípios parecia resolvida, com o acordo alcançado pelo ministro Joaquim Levy no Congresso para adiar a aplicação das novas regras aprovadas ano passado apenas a partir de 2016, o caldo voltou a entornar. Agora, por intermédio do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, petista de boas ligações com o Palácio do Planalto.

A primeira pressão veio do próprio Congresso, com a aprovação, por inspiração do PMDB, de uma resolução mandando o governo aplicar imediatamente o novo cálculo para o ressarcimento da dívida, altamente favorável a prefeitos e governadores. Eles passarão a pagar muitos menos que pagaram até agora, com prejuízos para os cofres do Tesouro. Segundo a análise do Ministério da Fazenda, é um baque nas finanças federais, prejudicando o ajuste fiscal que o ministro Joaquim Levy está empreendendo para tentar botar a economia brasileira na linha. Ou seja, seria inconveniente no momento.

Em seguida, em gesto surpreendente para quem se diz aliado incondicional da presidente Dilma Rousseff, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, atacou. Entrou na Justiça e conseguiu uma liminar obrigando o governo a aplicar imediatamente a regra alterada. Foi quando veio a campo o ministro da Fazenda, exercendo uma habilidade de negociador político até então desconhecida em sua trajetória de tecnocrata, e contornou a crise. Paes aceitou a postergação da aplicação das alterações. E acertou-se com o Congresso o envio de um projeto estabelecendo o cronograma para sua aplicação a partir do ano que vem. Está faltando ainda confirmar legalmente esta parte.

Ontem, de surpresa também, segundo informação exclusiva do jornal “Folha de S. Paulo”, o prefeito paulistano, entrou na Justiça com uma representação idêntica à de Eduardo Paes semanas atrás: protocolou ontem à noite na Justiça Federal em Brasília uma ação pedindo que a presidente seja obrigada a cumprir a lei aprovada ano passado.

A prefeitura de São Paulo, segundo especialistas, seria a principal beneficiária das mudanças, com substancial redução no seu estoque de dívida, o que permitiria pegar novos empréstimos, e com diminuição do valor das prestações mensais. A dívida cairia de R$ 62 bilhões para R$ 32 bilhões e a economia este ano seria de R$ 1,3 bilhão.

O que move Haddad é o mesmo que moveu Paes e é desejo de todos prefeitos endividados com a União: ter dinheiro para tocar obras agora que entram no período pré-eleições municipais. Haddad, particularmente, está com uma popularidade bem fraca e tem uma reeleição dura pela frente. Ainda mais depois que a ex-prefeita petista, a senadora Marta Suplicy, está arregaçando as mangas para trocar de partido e voltar a disputar a prefeitura de São Paulo.

A atitude de Haddad é um constrangimento para Levy, para Dilma, para Lula, padrinho de Dilma e Haddad, e para o PT.

Outros destaques dos jornais do dia

– TRABALHO – O mercado formal de trabalho registrou em março a geração líquida (diferença entre admissões e demissões) de 19.282 empregos. O resultado ficou ligeiramente acima do apresentado no mesmo período do ano passado, que foi de 13.117 vagas, de acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho. Esse é o primeiro saldo positivo do mercado de trabalho neste ano. Em janeiro foram eliminados 81.774 postos com carteira assinada e em fevereiro, outras 2.415. Apesar da melhora, no primeiro trimestre do ano, o saldo é negativo em 50.354 empregos — o pior resultado para o período desde a crise de 2009

– CONTAS PÚBLICAS 1: FGTS SOCORRE BNDES – No “Estadão”: O governo Dilma Rousseff pretende estruturar uma operação bilionária e polêmica. Nada menos do que R$ 10 bilhões do fundo criado com uma fatia de recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) devem ser aportados no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A operação tem sido conduzida pessoalmente pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que também pertence ao conselho de administração do BNDES, e pelo presidente do banco de fomento, Luciano Coutinho.

– CONTAS PÚBLICAS 2 – INVESTIMENTOS – Às vésperas de completar o quarto mês do ano, o governo liberou ontem os ministérios para iniciarem os gastos de investimentos previstos no Orçamento de 2015. Foram liberados R$ 21,5 bilhões para esse tipo de despesa, conforme decreto publicado ontem no Diário Oficial. Até então, esses gastos estavam suspensos pela falta da lei orçamentária, sancionada apenas esta semana. Com a liberação dos investimentos e também de recursos para atender a despesas urgentes de algumas pastas, o governo afrouxou um pouco a “dieta” que vinha impondo à administração pública até então.

– TERCEIRIZAÇÃO – Em queda de braço com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL),disse a interlocutores que avalia engavetar o projeto que trata da terceirização no País. Renan não concorda com o texto abrangente aprovado anteontem pelos deputados e, diante da ameaça de Cunha de que se o Senado alterar o projeto ele será restabelecido pela Câmara, a alternativa é segurar a votação no plenário ao menos durante sua gestão, até janeiro de 2017. Renan está prometendo fazer o que a presidente Dilma mais deseja em relação a este tema. Sem marola para não irritar o PT, as esquerdas em geral e aos sindicatos. Mas não tendo também que vetar o projeto, caso ele seja aprovado como saiu da Câmara, para não se indispor com o mundo empresarial. Em represália a Renan, Cunha está prometendo engavetar na Câmara todos os projetos de interesse do Senado.

LEITURAS SUGERIDAS

  1. Fernando Gabeira – “Um governo para esquecer” – Estadão
  2. Editorial – “A purgação da Petrobras” – Estadão
  3. Celso Ming – “Bendini explica” – Estadão
  4. Vinicius Torres Freire – “Nova Petrobras, segundo Bendini” – Folha
  5. Alex Ribeiro – “A dose de desemprego para baixar a inflação” – Valor
  6. Raquel Ulhoa – “Discutindo a relação com Dilma e aliados” – Valor
  7. Editorial – Petrobras sai de um passado incerto para futuro duvidoso” – Valor
  8. Miriam Leitão – “Visão de Bendini” – Globo