Mercado reage bem à elevação de rating do Brasil, mas mudança está fora da realidade?

Analistas destacam que Moody's olhou mais para o retrovisor do que para frente para tomar medida, mas veem oportunidade para o Brasil

Lara Rizério

Fotos Públicas
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No final da tarde da última terça-feira (1), a agência de classificação de risco Moody’s deu uma boa notícia ao Brasil elevando a nota de crédito do país, ou o conhecido rating, de Ba2 para Ba1, deixando o país apenas um degrau abaixo do grau de investimento.

Com isso, a chance de atração de mais fluxo estrangeiro em nosso mercado foi elevada, especialmente agora que estamos a apenas um passo de nos tornarmos novamente “investment grade”.

Até mesmo na véspera, as taxas futuras de juros encerraram a sessão de terça-feira com forte fechamento ao longo de toda a curva, uma vez que o rating elevado levou à retirada de prêmios de risco dos ativos locais, destaca a XP Investimentos.

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Apesar de comemorada no mercado, sendo um dos fatores para a elevação do real frente o dólar, alta do Ibovespa e queda de 4%, a 146 pontos, do risco-Brasil, nesta quarta-feira (2), a decisão da Moody’s também foi considerada polêmica, principalmente por se basear em melhora no fiscal, um dos pontos fracos da economia brasileira e que volta e meia preocupa os investidores.

Em relatório, a equipe de análise da XP ressaltou que o cenário segue desafiador para as contas públicas do governo. Na visão da casa, seria necessário um superávit primário de, ao menos, 1,2% no PIB para que houvesse essa estabilização no nível da dívida bruta projetado para 2025.

Conforme destaca a Ágora Investimentos, o desconforto com as contas do Governo segue no pano de fundo e há um incômodo com a decisão do Governo de reduzir o contingenciamento de gastos e começar a mirar na banda de baixo da meta de superávit primário, o que pode ser arriscado se o crescimento desacelerar, pois reduziria a arrecadação e a possibilidade de cumprimento das metas do arcabouço fiscal, o que contrasta com a visão positiva da agência.

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Cabe destacar, conforme aponta o Itaú, que a agência destacou que a credibilidade da estrutura fiscal do Brasil ainda é moderada, conforme refletido em um custo relativamente alto da dívida. Além disso, a perspectiva positiva mantida reflete a possibilidade de que o crescimento estável e a conformidade com a estrutura fiscal ajudem a aumentar a credibilidade institucional e reduzir os custos de empréstimos de forma mais acentuada.

Mesmo com as ponderações, José Raymundo Faria Junior, diretor da Wagner Investimentos, aponta que a melhora do rating parece ser “totalmente incompatível com a realidade”.

“A Fitch na semana passada comentou que a média da dívida bruta dos países BB (classificação do Brasil por essa agência) é de 55% do PIB, muito abaixo do que temos hoje (80%). A melhora do rating pela Moody’s apenas reflete as políticas de (Michel) Temer e de (Jair) Bolsonaro e não as políticas do governo atual, que surfa os benefícios da reforma trabalhista, da mudança do cálculo da TJLP e da reforma da Previdência, para ficar em poucos temas”, avalia o especialista.

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A despeito da reação positiva do mercado, em todo caso, o Banco Central ainda terá muito trabalho para ancorar as expectativas de inflação, avalia. “O aumento do diferencial de juros entre Brasil e EUA, junto com rating melhor, deve promover um dólar mais baixo ao menos nos próximos meses, já que evento fiscal extremamente relevante deverá ocorrer em maio, divulgação do relatório de receitas e despesas do 2º bimestre, e em julho, relatório do 3º bimestre e envio da PLOA de 2026 (que poderá ocorrer até final de agosto). Para este ano, esperamos que o fiscal seja cumprido até mesmo por pedido do TCU”, aponta.

Assim, Faria Júnior reforça a visão de que a Moody’s entregou ao atual governo “um presente absolutamente não merecido”. “A dívida está em trajetória de alta; déficit nominal em quase 2 dígitos; inflação desancorada; juros reais acima de 6%; despesas fora da regra do arcabouço; indexação de gastos sociais com salário mínimo que voltou a crescer em termos reais de acordo com o PIB; e Orçamento 2027 inexequível. E mais, não se pode descartar que a nota seja aumentada – grau de investimento – ainda neste governo, caso entregue o mínimo que a agência exige. Surpresa total, que poderá nos ajudar, mas inexplicável sob qualquer métrica”, conclui, em tom pessimista.

Andrei Spacov, economista-chefe da Exploritas, lembra ainda que as outras duas agências, a Fitch e a S&P, continuam com o Brasil a dois degraus abaixo do grau de investimento, mas tanto a Moody’s quanto as outras têm um outlook (perspectiva) positivo, que sinaliza que a chance de ter uma elevação é maior do que um rebaixamento.

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Para explicar a decisão polêmica da Moody’s, Spacov aponta que, muitas vezes, as agências estão olhando mais o retrovisor do que para frente. “Considero essa decisão da Moody’s muito mais um reconhecimento pelo que o Brasil fez nos últimos cinco, dez anos, em termos de reformas estruturais e melhora do perfil de crescimento. O Brasil está vindo nos últimos três anos – 2022, 2023 e 2024, crescendo cerca de 3%. Se olhar no passado, isso é raro no Brasil, crescer nesses níveis três anos seguidos”, aponta.

O economista ressalta reformas estruturais como da Previdência, trabalhista, além da independência do Banco Central, fator importante para reduzir o custo de se controlar a inflação. Mais recentemente, há avanços na reforma tributária, pontua. “A Moody’s era uma agência que ainda não tinha reagido a isso e está reagindo agora”, reforçando a visão de que o mercado olha muito mais para frente.

A Moody’s, por sua vez, é provavelmente é a agência que mais leva em conta o crescimento, o que embasa essa elevação. Ela também é uma agência que normalmente vê o Brasil com olhares menos pessimistas: a S&P e a Fitch chegaram a rebaixar o Brasil para três graus abaixo do grau de investimento, enquanto a Moody’s não chegou a tomar essa medida.

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Vale ficar mais otimista?

Para Spacov, o mercado tem ficado mais temoroso de que o Brasil tem esmorecido seu esforço de reformas, o que levaria a uma situação ruim em termos de dívida pública adiante.

“Mas também é verdade que o Brasil dos últimos 10 anos é melhor do que os 10 anos anteriores. Fizemos reformas que vão facilitar o controle fiscal adiante, principalmente a reforma da previdência, e que podem estar ajudando no crescimento”, ressalta, ainda que parte do mercado olhe o crescimento como anabolizado pela expansão fiscal.

“Mas o mercado tem toda a razão também de se preocupar com o futuro e colocar em parte isso nos preços. O governo tem tomado recentemente ações de tirar itens do arcabouço fiscal”, avalia, o que muda os parâmetros de leitura do atingimento das metas fiscais do país.

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“A decisão deveria levar uma reflexão sobre esse lado mais estrutural do Brasil. Talvez realmente o crescimento brasileiro tenha melhorado. Essa é uma das principais preocupações dos ‘gringos’ com o Brasil há cinco, dez anos atrás”, reforça.

Spacov vê. assim, que a medida da Moody’s pode tornar o mercado um pouco menos pessimista, mas o governo precisa dar sinais melhores para o futuro do ponto de vista fiscal para trazer alguma melhora mais relevante do ponto de vista de mercado.

Para Ricardo Martins, economista chefe da Planner Investimentos e presidente executivo da Apimec Brasil, embora tenha sido inesperada, surpreendente e controversa pelas preocupações de mercado, principalmente na avaliação de deterioração da questão fiscal, a melhora da nota traz uma responsabilidade maior ao governo, porque a perspectiva positiva endereçada pela Moody’s encaminha o Brasil à possibilidade de conquista de país seguro para investimento.

“As boas expectativas das Transações Correntes, em especial o superávit da Balança Comercial, do PIB e de Núcleos inflacionários mais comportados, endereça a perseverança do governo nessa oportunidade”, conclui.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.