Mal das pernas na Bovespa, Souza Cruz pode encontrar fôlego com ajuda do futebol

Vítima do mercado ilegal de cigarros, maior fabricante do País espera uma atuação mais rígida da polícia nas fronteiras; na Copa das Confederações deu certo, diz diretor de RI

Thiago Salomão

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SÃO PAULO – Os tempos áureos da Souza Cruz (CRUZ3) na Bovespa parecem ter ficado para trás. Após terminar 2010 como a melhor ação do Ibovespa ao subir 65,8% e atingir no final de 2012 seu maior patamar da história (R$ 32,06), a empresa líder no mercado brasileiro de cigarros vem amargando duras perdas à medida que seus resultados começam a sentir cada vez mais os efeitos do crescimento do mercado ilegal de tabaco e viu seus papéis fecharem abaixo de R$ 20,00 pela 1ª vez desde 2011. Contudo, a companhia pode ganhar um novo impulso em 2014 com uma ajuda de um segmento que pouco tem a ver com a indústria tabagista: o futebol.

Isso porque em 2014 a Copa do Mundo será realizada em terras brasileiras. Mas o que uma atividade esportiva traria de positivo para uma fabricante de cigarros? O diretor financeiro e de relações com investidores da Souza Cruz, Leonardo Senra, explica que um evento de amplitude mundial irá gerar a necessidade de maior investimento do Brasil em segurança, com o intuito de transmitir uma boa imagem para o mundo. Dessa forma, a precaução com quem – e o que – pode ultrapassar nossas fronteiras será bem maior, o que indiretamente acabará inibindo a entrada do cigarro “paralelo”, que tem boa parte da sua produção proveniente do Paraguai.

“A preocupação com a Copa deverá aumentar a segurança nas fronteiras e torcemos que isso não só permaneça durante os meses do evento mas durante todo o ano”, disse Senra durante encontro da empresa com analistas e investidores, promovido pela Apimec (Associação Nacional dos Analistas e Profissionais de Investimento de Mercado de Capitais) na última quinta-feira (13) em São Paulo. Ele cita que evento semelhante ocorreu durante a Copa das Confederações em 2013 – considerado um “teste” para o País anfitrião mostrar que está pronto para a Copa do Mundo -, quando as Forças Armadas colocaram em prática a Operação Ágata 7, que resultou na apreensão de mais de 6 mil caixas de cigarros importados na fronteira com o Paraná entre maio e junho. Com isso a participação de mercado do mercado ilegal de cigarros no Brasil mostrou uma significativa redução no 2º trimestre, lembra o diretor. Contudo, a fatia ilegal voltou a crescer no País nos meses após o encerramento da operação. 

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“Camisa 10” da empresa em baixa
Em 2013, a Souza Cruz viu sua participação aumentar de 74,9% para 77% no mercado legal de cigarros – isto é, desconsiderando o produto contrabandeado -, o que prova que os investimentos da empresa em portfólio e tecnologia surtiram efeito, avalia Senra. No entanto, o próprio diretor ressalta que a desleal concorrência com o cigarro clandestino vem deixando rastros no resultado da companhia, principalmente em sua principal marca, o Derby, que perdeu “market share” em todos os trimestres de 2013 e encerrou o ano com 26,2% do mercado – queda de 1,4 ponto percentual.

“Não gostamos de perder volume para a ilegalidade e não gostamos de perder volume da nossa principal marca [o Derby]. Por isso saibam que estamos nos movimentando para recuperar ou pelo menos manter uma massa crítica de consumidores”, afirmou o diretor financeiro e de RI da Souza Cruz.

Atualmente, um maço de Derby custa em média R$ 5,75, contra cerca de R$ 2,00 do cigarro ilegal. Como forma de mitigar estes impactos, a Souza Cruz vem reposicionando a marca Minister, cujo maço está valendo na faixa de R$ 4,00

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Mas Senra não atribui a queda do market share da sua principal marca em 2013 somente para a maior penetração do cigarro paralelo. Ele também ressalta o aumento de renda da população brasileira, o que tem provocado um “upgrade” no consumo, ou seja, os fumantes estão conseguindo comprar marcas mais caras – que não necessariamente sejam Hollywood ou Lucky Strike, ambas da Souza Cruz.

Em outras palavras: o Derby sofreu em 2013 não só com o consumidor de mais baixa renda – que buscou a solução no cigarro paralelo – como também com o consumidor que teve um aumento de renda e trocou de marca.

IPI até 2016?
Esse avanço do mercado ilegal de cigarros é reflexo da diferença de preços cada vez maior entre este produto e o original, em virtude do aumento considerável do IPI (Imposto sobre Produtos Importados) previsto até 2015 para a indústria tabagista como forma de compensar a isenção dada pelo governo à população – o que tem feito o preço final do cigarro da Souza Cruz aumentar como forma de compensar esse maior imposto. 

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“Apesar de todos os esforços das autoridades brasileiras em conter estas contravenções, estima-se que 30 bilhões de cigarros entraram no país via contrabando, o que equivale a quase 30% do mercado nacional, provocando uma evasão de arrecadação tributária aos cofres públicos próxima a R$ 3,5 bilhões”, disse a Souza Cruz em seu relatório de resultados de 2013.

O diretor de RI da companhia disse durante o evento que não sabe até o momento se o IPI será mantido ou não em 2016. “Temos que sempre sensibilizar o governo sobre as questões dos impostos”, disse Senra. Contudo, ele logo complementou com uma dose de pessimismo que o Ministério da Fazenda não bateu sua meta de arrecadação traçada em 2011 em mais de 50%.

Ações: de máxima histórica para mínima desde 2011
Se até 2012 a Souza Cruz poderia ser considerada uma das titãs da Bovespa, em 2013 e neste início de 2014 a sensação é de que toda essa pompa não existe mais. Somente no ano passado, a queda acumulada das ações da companhia foi de 18,7% – seu pior ano na Bovespa desde 2000, quando mostrou a mesma queda percentual. Já neste mês logo após seus resultados terem sido divulgados, os papéis CRUZ3 chegaram a fechar abaixo dos R$ 20,00, algo que não ocorria desde começo de novembro de 2011. 

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“Houve avanço no lucro, todavia ressaltamos que o cenário para o setor ainda se encontra hostil, portanto recomendamos somente manutenção [das ações], sobretudo para investidores que visam retornos através de proventos”, escreveram em relatório os analistas da Coinvalores Corretora, Sandra Peres, Marco Aurélio Barbosa e Bruno Piagentini. No pregão pós-balanço, as ações da fabricante de cigarros caíram mais de 3,5%, repetindo o feito visto após sair o resultado do 3º trimestre de 2013 – que também foi mal recebido pelo mercado, com analistas afirmando que a Souza Cruz havia perdido o status de “investimento conservador” na Bovespa. Da divulgação do resultado do 3T13 até 4T13, as ações CRUZ3 já recuaram mais de 20%.

Dividendos bilionários, porém sem surpresas
Falando em proventos, a Souza Cruz manteve a política de distribuir quase 100% do dividend payout (dividendo pago/lucro líquido). Ao todo, a remuneração da empresa aos seus acionistas via dividendos ou juros sobre capital próprio chegará a R$ 1,63 bilhão (96% do lucro), o que resulta em aproximadamente R$ 1,07 pago por cada ação da empresa. 

Por conta disso, Senra deixa claro que dificilmente a Souza Cruz surpreenderá o mercado com algum anúncio de dividendo extraordinário, mesmo com a forte geração de caixa em 2013, que ficou mais de 20% superior ao resultado de 2012. “É bem improvável que daremos dividendos extras. Precisamos atualizar nossos investimentos e analisar o cenário. Isso tudo depende”, conclui o diretor.

Thiago Salomão

Idealizador e apresentador do canal Stock Pickers