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SÃO PAULO – A Alemanha foi campeã do mundo. Porém, mais do que o título da seleção europeia, a vitória – e mais especificamente o gol de Mario Götze – se torna uma marca importante para o futebol alemão e para a história do país. Essa vitória premia não só a revolução do esporte na Alemanha como as mudanças que a sociedade sofreu desde os anos de 1990.
O gol do título, marcado aos 7 minutos do segundo tempo da prorrogação, foi a coroação da jovem geração alemã, que inevitavelmente faz grande referência às mudanças ocorridas desde a queda do Muro de Berlim. Em especial, Andre Schürrle – que deu a assistência – e Götze – autor do gol -, que nasceram em 1990 e 1992, respectivamente, ou seja, após a unificação do país.
A festa vista em Berlim e em toda Alemanha neste domingo mostra um cenário muito diferente de um país que ainda não conseguiu se livrar de seu passado. Demonstrações de patriotismo são raras entre a população, que não tem o costume de carregar sua bandeira, nem mesmo no dia 3 de outubro, dia da reunificação alemã.
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Porém, a Copa do Mundo mostrou um momento diferente. Desde que sediou o mundial, em 2006, essas demonstrações patriotas, com o uso das cores da bandeira do país, se tornaram mais comuns, principalmente entre os jovens. “Nós aprendemos que podemos sentir orgulho”, disse Christian Boellhoff, diretor-gerente do instituto de pesquisa econômica Prognos AG, para a Bloomberg. “E também que podemos ficar mais à vontade em relação a isso”.
A estadia da seleção no Brasil, em Santa Cruz Cabrália, Bahia, também representa todas essas mudanças. Conhecido por ser um povo mais fechado, centrado, os jogadores alemães mostraram grande integração com o povo brasileiro. Nas redes sociais e nas ruas, jogadores como Lukas Podolski mostraram carisma e animação de estar no Brasil, ganhando o carinho de todos os brasileiros, que nem após o vexame do 7 a 1 conseguiram deixar de torcer para a Alemanha na final.
Essa jovem geração mostrou nas ruas da Alemanha e nos campos toda a mudança que tem ocorrido na sociedade. Fica para trás o povo marcado pelos desastres da guerra e todas as marcas deixadas pelo nazismo para se tornarem pessoas alegres e que hoje são destaque em todos os jornais de forma positiva, como campeões do mundo.
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Revolução do futebol
O que se tem discutido sobre o futebol brasileiro neste momento não é exclusividade nossa. Mudanças na estrutura do esporte hoje são as grandes críticas feitas para o futebol no Brasil. Mas essa é a história da seleção alemã, que demorou mais de 10 anos para conseguir coroar toda a mudança que fez.
Na Eurocopa de 2004, em Portugal, os alemães não conseguiram passar nem da primeira fase, momento em que toda a estrutura no futebol passou a ser repensada. Apesar do vice-campeonato mundial em 2006, era claro que a Alemanha estava longe de atingir o objetivo das mudanças em que estava envolvida.
Desde então foram mais de US$ 1 bilhão investidos na base do futebol. O governo se envolveu e ajudou na construção de 370 centros de treinamentos para crianças e adolescentes, o que representa mais de 25 mil jovens incentivados a tentar se tornar jogador profissional. Mas não só jogadores, a Alemanha também incentiva o surgimento de novos técnicos, com cursos e incentivo na realização e presença de seus “alunos” em congressos no mundo todo.
Outra mudança importante foi a financeira. No caso das bilheterias, o preço dos ingressos foi congelado pela Bundesliga – liga de futebol profissional do país – o que fez com que a primeira divisão alemã tivesse a maior média de público do mundo, com 45 mil pessoas por jogo.
Além disso, os clubes da Alemanha tem um rigoroso controle de gastos e sua folha de pagamento não pode superar em 50% sua receita – especialistas afirmam que até 70% seria suficiente para controlar as despesas. Caso ao fim de uma temporada algum time supere esta marca, ele é rebaixado para a divisão abaixo da que joga. Pela lei, magnatas e grandes empresários são proibidos de comprar os times.
Diante dessas mudanças, o futebol alemão evoluiu não só com clubes mais “saudáveis” financeiramente, mas com o surgimento de uma geração de jovens jogadores que tinham alto conhecimento técnico do futebol, assim como treinadores que passaram a modificar e colocar o futebol alemão como um dos mais bem jogados do mundo.
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Em meio à reestruturação, a Alemanha foi vice-campeã da Eurocopa em 2008, além de ter chegado até a semifinal na Copa do Mundo de 2006 e 2010 – ficando em terceiro lugar nas duas edições. Que este quarto título mundial da Alemanha possa servir como exemplo para o futebol brasileiro, que apesar de ainda ser o maior campeão, precisa com urgência transformar não só a forma como joga, mas também a estrutura de sua federação e a economia de seus clubes.