Maior IPO do mundo é adiado indefinidamente após críticas a governo da China; entenda o imbróglio do Ant Group

Bilionário Jack Ma disse que o sistema regulatório do país estaria "sufocando a inovação", o que teria enfurecido Xi Jinping

Ricardo Bomfim

O presidente chinês, Xi Jinping, e o empresário Jack Ma (crédito: Reprodução)

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SÃO PAULO – A Oferta Pública Inicial (IPO, na sigla em inglês) do Ant Group, empresa financeira do bilionário Jack Ma, foi suspensa indefinidamente. Segundo apurou o Wall Street Journal, a decisão foi tomada após Ma criticar o presidente da China, Xi Jinping.

Celebrado como o maior IPO da história, estima-se que o Ant Group, que faz parte do conglomerado Alibaba, levantaria US$ 34 bilhões, sendo US$ 17,2 bilhões na bolsa de Xangai e mais US$ 17,2 bilhões na bolsa de Hong Kong. O valor superaria os US$ 29 bilhões levantados pela Aramco, petroleira da Arábia Saudita, em 2019.

As expectativas eram de que o IPO saísse em outubro, mas a operação sofreu sucessivos adiamentos até que foi suspensa indefinidamente. De acordo com o WSJ, a ordem partiu diretamente de Xi Jinping, que estaria incomodado há anos com a crescente influência de Jack Ma e de sua empresa de meios de pagamento. O Alipay, do Ant Group, é usado por 70% da população da China.

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A gota d’água, contudo, teria ocorrido no dia 24 de outubro, quando Ma disse que “o sistema regulatório chinês estava sufocando a inovação e devia ser reformado para fomentar o crescimento”. O empresário ainda foi mais longe a ponto de dizer que os bancos chineses tinham uma mentalidade de “casa de penhores.”

Xi Jinping teria se enfurecido com as declarações e o governo teria, em retaliação, ordenado uma imediata investigação sobre o IPO. A operação foi oficialmente suspensa no dia 3 de novembro.

De acordo com Roberto Attuch, fundador da Ohmresearch, a briga regulatória entre o Ant Group e o governo chinês é mais longa do que esse episódio leva a crer quando analisado isoladamente. Segundo o especialista, Jack Ma vinha definindo sua empresa como uma “techfin” e não uma fintech com o objetivo de escapar do arcabouço regulatório da China.

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“As operações do Ant tinham apenas 2% do negócio de crédito no balanço e, com a nova regulamentação que vem sendo implementada na China desde setembro, seria obrigatório ter 30% no mínimo. Então eles precisariam de um balanço muito mais parecido com o de um banco normal para poderem operar”, explica.

No dia 10, Liang Tao, vice-presidente da Comissão Regulatória de Bancos e Seguros chinesa, disse em uma conferência na capital Pequim que fintechs não mudam a natureza da indústria financeira e reguladores devem estar atentos aos riscos e desafios impostos pela digitalização.

“Essas empresas devem ser sujeitas à mesma supervisão e requisitos de gestão de risco que os bancos”, defendeu Tao.

As autoridades regulatórias chinesas estudam até mesmo obrigar o Alipay a se separar do resto do grupo gerido por Jack Ma para que possa operar no país.

Obviamente, para se adequar a essas regras o Ant Group acabaria sofrendo uma revisão substancial no seu valuation, que chegou a ser fixado em US$ 300 bilhões. Ou seja, a operação acabaria saindo por um valor bem menor do que o especulado.

Difícil de explicar

Para Attuch, existe um racional nessas alterações chinesas, pois é preciso evitar que as fintechs façam a chamada “arbitragem regulatória”, que nada mais é do que operar como um banco, mas com regras diferentes e, assim, obter vantagens competitivas.

O mistério, diz Attuch, é por que a China começou a se movimentar nesse sentido pouco antes do IPO e não seis meses atrás, quando o Ant Group anunciou que abriria seu capital.

Um dos motivos por que a decisão soa estranha é que o valor geopolítico da abertura de capital da empresa não era algo desprezível. “Na mesma semana em que a eleição presidencial dos Estados Unidos seria contestada pelo atual presidente, com a democracia americana em crise, a China faria o maior IPO do mundo. Seria quase como uma passagem de bastão simbólica para a nova superpotência dominante”, entende.

Todavia, Attuch lembra que nada na China é feito com foco no curto prazo e, provavelmente, o Partido Comunista Chinês (PCC) entendeu que pode atingir a liderança global de maneira mais sustentável no futuro sem correr riscos agora.

“Os chineses sempre pensam com um horizonte de 100 anos, até porque ninguém tem a preocupação de se eleger em quatro anos.”

Na reportagem do WSJ, os jornalistas lembram que esta não foi a primeira vez em que a gestão de Xi enfrentou uma grande empresa chinesa. Casos semelhantes ocorreram com o Dalian Wanda Group e o Anbang Insurance Group. E nada garante que os próximos megaempresários chineses também não vivam embaraços com a política.

A Jack Ma, Roberto Attuch acredita que não resta muita alternativa além de fazer um recuo tático, uma vez que sua situação como empreendedor na China certamente ficou mais difícil agora.

Vale destacar que, da máxima atingida em 27 de outubro, quando a ação negociada na Nasdaq fechou a US$ 317,14 até a véspera, os papéis do conglomerado Alibaba já caíram mais de 19%. “Talvez ele precise colocar panos quentes no caso, já que é bem difícil imaginar ele deixando o país.”

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Ricardo Bomfim

Repórter do InfoMoney, faz a cobertura do mercado de ações nacional e internacional, economia e investimentos.