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A brutalidade e a covardia dos ataques terroristas a Paris sexta-feira justificam a cobertura emocional da mídia brasileira e mundial do acontecimento e de seus desdobramentos políticos, na qual faltou uma análise mais profunda de suas inevitáveis conseqüências no campo da economia, no curto e no longo prazo, a ser sentida a partir de hoje, inicialmente no sensível marcado financeiro.
Longe do palco tragédia, embora chocado e sensibilizado, o Brasil inicia a semana conturbada na diplomacia mundial no mesmo compasso que encerrou a que passou – ou seja, cheia de incerteza, de indefinições.
Na política, o terreno está dominado pelo caso Eduardo Cunha, cujo desfecho ainda vai demorar um tempo. Cunha continua no Congresso, de público e reservadamente, com o respaldo suficiente para levar esta novela para o ano que vem, até pelo menos o fim do recesso parlamentar do fim do ano, em fevereiro. E esta novela condiciona em parte o trabalho do Congresso Nacional.
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Na seara econômica, o jogo está sendo jogado em dois tempos.
De um lado, o mais substancial, diz respeito ao acerto das contas públicas de 2015 e 2016, ainda pendentes de decisões cruciais do Legislativo a respeito das medidas de ajuste fiscal propostas pelo Ministério da Fazenda. Com a presidente Dilma Rousseff e o ministro Joaquim Levy na Turquia, na reunião do G-20, é improvável que o pacote fiscal ande a passos por depender ainda de negociações com a base aliada.
É o caso da proposta de regularização/repatriação dos capitais ilegais de brasileiros no Exterior. O texto aprovado pela Câmara na semana passada não é o do agrado da Fazenda. Técnicos do ministério temem que da forma que está ele não atraia interessados – e o governo conta com a regularização para arrecadar mais R$ 11 bilhões em 2016.
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Há a possibilidade de alterá-la no Senado, onde o Palácio do Planalto conta com mais condescendência e também com a nova disposição da oposição de colaborar pontualmente com o governo. Porém, se modificado, o projeto terá de voltar à Câmara – e o tempo está muito curto. O que poderá submeter a presidente à necessidade de novas e desgastantes “conversas” com seus aliados.
A outra medida de Levy com chances de ser aprovada é a da prorrogação da Desvinculação das Receitas da União (DRU), depois que os oposicionistas concordaram em votar a favor, desde que a alíquota de 30% de liberação dos recursos carimbados proposta pela Fazenda seja reduzida para 25% (a atual, que finda no fim do mês, é de 20%). Ela, contudo, também corre contra o tempo.
Levy: “navegando”
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Esta semana deve sair da definição o que o governo vai apresentar para completar o que ficar faltando do ajuste fiscal inicial, principalmente a não aprovação do retorno da CPMF, para fechar o Orçamento de 2016 com o superávit primário de 0,7% do PIB. O que vem é aumento de impostos mesmo. E, conforme reafirmaram jornais do fim-de-semana, deverá ser pelo aumento do PIS e da Confins incidentes sobre os combustíveis.
Para completar a questão dos Orçamentos, a equipe econômica deve mandar ainda para o Congresso o pedido de mudança da meta de superávit deste ano, de 0,15% para um déficit de mais de 2%. A oposição também já concordou em votar as mudanças.
Os oposicionistas perceberam que já está elevado o desgaste deles junto à opinião pública por sua posição sistematicamente “do contra”.
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No outro lado do campo de jogo da economia, continua na berlinda a permanência de Joaquim Levy à frente do Ministério da Fazenda. Apesar de a presidente Dilma Rousseff estar resistindo às pressões de Lula e do PT para substituir o ministro, e até ter dado uma força a seu auxiliar ao aceitar o não abatimento de R$ 20 bilhões de gastos do PAC na meta de superávit primário de 2016, a campanha pela queda de Levy e a mudança na política econômica não arrefeceu.
Não haverá tréguas esta semana para Levy. O site do PT e outros meios eletrônicos com ligações diretas e indiretas com o partido continuam dando voz aos críticos do ministro e de sua política. As conversas de Lula, segundo alguns de seus interlocutores, seguem no mesmo tom de que o lugar agora deve ser dado a Henrique Meirelles. E Meirelles nos bastidores e nos colóquios que tem não disfarça a candidatura. Tudo isso está minando Levy. Diz o “Valor Econômico” que, se Dilma optar por Meirelles, ele não terá a “carta branca” que deseja.
Mas o ministro parece disposto a continuar na briga. Ontem, em entrevistas na Turquia, Levy disse que fica no cargo até segunda ordem e que continua “navegando”. Segundo reportagem de “O Estado de S. Paulo”, Levy manteve as críticas veladas que faz a seus críticos e suas propostas: rechaçou que a oferta de crédito pode destravar a economia (o atual mantra de Lula) e acusou as pessoas de “confundirem” o crescimento econômico cogerado pelo boom das commodities com “trabalho forte de botar a casa em ordem”.
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A campanha contra Levy deve ganhar um reforço de peso amanhã. No Congresso do partido em Brasília, marcado para discutir os rumos da legenda e apresentar emergencial para a economia – “Ponte para o futuro” (também chamado “Programa Temer”), o PMDB vai reforçar suas críticas à política econômica.
Não haverá ainda o rompimento formal com o PT e sinais abertos de um afastamento do governo, mas só da aprovação do programa, com o respaldo total do comando partidário, já será uma declaração de desquite do PMDB. E os caciques peemedebistas não farão nada para impedir ataques ao governo e propostas de rompimento imediato e total.
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