Incêndios na Austrália: como eles podem impactar as ações de “dois extremos” da bolsa brasileira em 2019

Analistas veem que evemtos podem ser mais um fator de alta para as ações de frigoríficos na B3; empresas de papel e celulose também podem ver ativos subirem

Lara Rizério

Incêndios na Austrália (Foto: NSWRFS)

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SÃO PAULO – Os incêndios que assolam a Austrália e que vêm causando grande preocupação por conta de seus efeitos devastadores para o país também estão impactando a bolsa brasileira. E, de acordo com analistas, dois setores no Brasil são afetados: o de proteínas, que foi um dos destaques de alta em 2019 com a alta do preço da carne em meio à gripe suína na China, e o de papel e celulose, este último que não conseguiu brilhar na bolsa em meio à pressão dos preços das commodities.

Apesar de algumas leituras ainda serem preliminares, já é possível traçar cenários para alguns ativos.

No caso das empresas do setor de frigoríficos, a avaliação dos analistas é mista, uma vez que depende de qual é a composição geográfica das operações de cada uma delas.  As estimativas da Federação Nacional de Fazendeiros divulgadas pela imprensa australiana indicam que desde setembro uma área de 6,3 milhões de hectares foi queimada, causando a perda de 100 mil cabeças de gado.

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Desde o começo desses devastadores incêndios florestais em setembro, cerca de 80.000 quilômetros quadrados se incendiaram em todo o país, uma superfície equivalente à Irlanda ou ao estado da Carolina do Sul.

Segundo informações da Meat & Livestock Australia, 9% do rebanho bovino estão localizados em regiões significativamente impactadas por incêndios florestais e outros 11% estão em regiões parcialmente impactadas. Em relação às ovelhas, 13% do rebanho nacional está em regiões significativamente afetadas por incêndios e outros 17% em regiões parcialmente impactadas.

Conforme destacou Alcides Torres, diretor da Scott Consultoria, em entrevista à Agência Estado, os incêndios poderiam favorecer as exportações brasileiras de carne bovina para alguns países em que a Austrália possui grande participação como exportadora, como é o caso da Indonésia, e também os embarques de gado vivo.

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Além disso, conforme apontou Rodrigo Brolo, head de agronegócios da Criteria Investimentos, os australianos são importantes fornecedores de carne bovina para Japão e EUA, países com os quais o Brasil negocia abrir mercado. “Sem dúvida alguma este fator (comprometimento da produção australiana de carne) pode ajudar o Brasil a conquistar esses mercados”, avalia o especialista.

Esse cenário impulsionou algumas ações do setor, como foi o caso da Minerva (BEEF3), que chegou a saltar 4,58% na última terça-feira. Em agosto de 2019, o governo indonésio liberou a importação de carne bovina de dez frigoríficos brasileiros e, na época, a Minerva anunciou que tinha cinco plantas habilitadas a exportar para lá. Ainda no segundo semestre, os primeiros embarques para o país foram feitos. No acumulado da semana, contudo, os ganhos são mais modestos, de cerca de 3%; vale destacar que, no ano passado, os ativos já haviam subido 157%.

A JBS (JBSS3), por sua vez, pode sofrer, mas também se beneficiar com o ocorrido. A companhia também vê suas ações registrarem ganhos, de cerca de 2%, em uma semana negativa para o Ibovespa, sendo que os papéis vêm passando por momentos mais difíceis em termos de desempenho na bolsa por causa da venda da participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social Participações (BNDESPar) por meio de uma oferta pública de distribuição secundária de ações (“follow on”). Em 2019, os ativos subiram 122%, sendo uma das maiores altas do índice no período.

O Bradesco BBI ressalta que os negócios de carne bovina da JBS na Austrália representam cerca de 8% de sua receita total. Assim, uma redução adicional da oferta de gado no país devido aos incêndios pode levar a custos mais altos do que o estimado (os analistas do banco projetam que cerca de 80% dos custos dos frigoríficos são com gado). Uma análise de sensibilidade feita pelo banco mostra que, para cada aumento de 5% nos custos de gado da JBS na Austrália, a projeção para 2020 do lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda) é reduzida em 3%.

No entanto, esse impacto potencialmente negativo pode ser mitigado por um efeito potencial positivo com: i) aumento dos preços da carne bovina australiana, país que vem se beneficiando do aumento das exportações para a China (pois é capaz de exportar produtos frescos e refrigerados) e ii) acesso maior do Brasil nas exportações (operação de carne bovina no Brasil representa cerca de 15% da receita total) e nos EUA (cerca de 45%) a países como China e outros que importam carne bovina australiana.

Papel e celulose: recuperação à vista?

Com relação ao setor de papel e celulose, aponta o Itaú BBA, as perspectivas são de que os incêndios na Austrália possam comprometer a produção de até 2,6 milhões de toneladas da commodity no mercado em 2020 considerando o caso extremo, ou 4% da demanda estimada, o que levaria a uma continuidade do processo de redução dos estoques das companhias do setor.

“Contudo, mesmo interrupções parciais no fornecimento podem levar a uma alta dos preços da celulose”, apontam Daniel Sasson e Ricardo Monegaglia, analistas do banco.

Na avaliação deles, os incêndios florestais provavelmente acelerarão o declínio já esperado nas exportações de aparas de madeira da Austrália, o que pode comprometer uma quantidade significativa da produção de celulose na Ásia.

Para medir o efeito, o Itaú BBA fez uma análise de sensibilidade, apontando que a redução de 25% nas aparas de madeira exportadas pela Austrália (em relação a 2019) pode afetar a produção de 650 mil toneladas de celulose, ou 1,1% da demanda total estimada de celulose no mercado em 2019.

“Os incêndios florestais podem ter um impacto psicológico significativo nos participantes do mercado, que tendem a reagir de forma bastante contundente em meio a esses eventos imprevisíveis”, afirmam.

Assim, os analistas não descartam a possibilidade de que os atuais incêndios florestais possam levar ao aumento da demanda por fibra virgem, potencialmente levando a preços mais altos da commodity e gerando um aumento da demanda de outros fornecedores globais.

Neste sentido, a avaliação é de que a Suzano possa continuar no processo de redução dos seus níveis de estoque, uma tendência que já havia animado os investidores logo após a divulgação do balanço da companhia do terceiro trimestre de 2019, no começo de novembro. Naquele período, houve uma forte redução de 450 mil toneladas nos estoques, valor que se comparava as 300 mil toneladas esperadas pelo mercado.

Para o quarto trimestre de 2019, a expectativa é por uma redução dos níveis estocados de commodity em 480 mil toneladas para Suzano, endereçando uma questão que gerou uma pressão negativa considerável nos preços de celulose em boa parte do ano passado. Vale ressaltar que, em 2019, a ação SUZB3 registrou ganhos de 5,34% e as units KLBN11 avançaram 16%, bem abaixo dos ganhos de 31,58% do Ibovespa no mesmo período.

Para 2020, a expectativa é de uma recuperação gradual nos preços, finalizando o ano a US$ 525 a tonelada (o que representa uma alta de 14% em relação à cotação atual, de US$ 460 a tonelada).

A recomendação do Itaú BBA tanto pelas ações da Klabin (KLBN11) quanto da Suzano (SUZB3) é outperform (desempenho acima da média do mercado), com preços-alvo respectivos de R$ 21 e R$ 47, o que representa um potencial de valorização de 9,3% e 8,9% em relação ao fechamento de quarta-feira (8).

Contudo, vale ressaltar que muitos analistas seguem cautelosos com o setor. O Bradesco BBI destacou nesta semana que a disparada de 26% dos ativos da Suzano desde o final de outubro de 2019 pode ter ido além da perspectiva para os preços de celulose.

“Nós precisaríamos ver a demanda e os preços da celulose surpreenderem para cima para nos tornarmos otimistas novamente com a ação”, avaliaram os analistas ao apontarem que, embora existam alguns sinais de recuperação morna na cotação da commodity, o rali das ações reflete preços que não serão atingidos durante este ano, uma vez que os fabricantes de papel já se reabasteceram.

Desta forma, o efeito do incêndio pode levar a uma alta dos ativos de papel e celulose, mas ainda há ceticismo sobre a duração do movimento para os papéis da Suzano. Segundo compilação feita pela Bloomberg, dos 16 analistas que cobrem o papel, seis recomendam compra, nove indicam manutenção e um, a venda.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.