Fica como está para ver como fica

Por enquanto, nem mesmo o crescente desemprego criou as condições para a formação de um consenso mínimo

Francisco Petros

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A sociedade brasileira, especialmente as suas elites organizadas, se conforma com o “estado das coisas” em que vivemos. A ignorância política, a preguiça em participar naquilo que é comum, o desinteresse no país, a falta de solidariedade, a ausência de ideologia própria e a mera passividade em aceitar o “errado” como parte da “cultura nacional” são alguns dos marcos que se fixam no atual estado letárgico da economia, da política e das relações sociais.

O maior problema do Brasil é a falta de autoestima, estou convencido. Como diria Nelson Rodrigues: “o brasileiro é um narciso às avessas que cospe na própria imagem. Nossa tragédia é que não temos o mínimo de autoestima”. Não conheço país que tenha tanta riqueza potencial num contexto democrático e cultura pacífica como é o caso do Brasil. Não me refiro propriamente ao “mito fundador” desta nação, relacionada com a “terra em que se plantando tudo dá”. Digo isto sem resquícios de xenofobia ou de nacionalismo cego. Ao passear pela Europa fragmentada e envelhecida, pela China autoritária ou pela Índia complexa, podemos constatar que as possibilidades brasileiras são enormes. Por aqui é possível a construção de uma sociedade progressista, mas justa e que possa incorporar todos os temas fronteiriços da humanidade, dentre os quais, a sustentabilidade social e ambiental, o respeito aos direitos humanos e à diversidade cultural e a negação ao fundamentalismo religioso. Ou seja, o rearranjo político e econômico do Brasil pode levá-lo muito à frente em muitos aspectos.

O que ocorre, contudo, é que estamos presos às questões menores que atormentam a vida de toda a sociedade e que são tratados com profundo descaso pelas elites políticas e econômicas que abdicam da proposição e execução de mudanças verdadeiras e estruturais. Como é possível aceitar passivamente a queda acumulada do PIB entre 7% e 8% em dois anos (2015-2016)? Como é possível aceitar que a terceira autoridade da República desfile na Câmara dos Deputados fazendo ameaças e pronunciando “frases de efeito”? Como é possível que em meio à crise profunda a oposição tire férias e só retorne à ativa depois do carnaval? Como é possível a Presidente da República permanecer sem propostas profundamente reformistas diante do desastre do desemprego e da desesperança? Eis alguns dos comportamentos que constatamos e face à eles nada fazemos.

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O que assistimos é a consagração da mesmice. Quando os detentores do capital propõem reformas, eles estão a falar de tudo que possa atingir os bolsos alheios, jamais os seus. Quando os sindicatos propõem algo, vale tudo desde que não se flexibilizem regras trabalhistas ou benefícios descabidos de certos segmentos. Os políticos não querem reformas políticas, pois os partidos são atualmente como empresas: tem acionistas que exploram o “negócio” e pouco lhes interessam as questões de fundo do país. A atividade legislativa é tênue frente a envergadura da crise. O STF age para proteger a Constituição, mas os processos judiciais permanecem encalhados sem sentença nas escrivaninhas dos cartórios do Judiciário.

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O que se vê é que a passividade tomou conta do país. Não apenas do governo, a bem da verdade. De toda a sociedade que não se importa sequer com os seus próprios interesses de médio e longo prazos.

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As previsões econômicas pioram a cada dia. Fala-se abertamente na mídia de “um alçapão ao fim do buraco” no qual o Brasil se meteu ou sobre o “fim do Brasil”, sobre dólar a R$ 5,00, sobre inflação de dois dígitos novamente, etc. Tudo isto pode se realizar, mas a realidade econômica piorada é como jabuti na árvore. Foi alguém que ali colocou o chelonoidis (nome científico do jabuti) ali. No caso, é a política que nos torna tão medíocres.

Creio que nunca foi tão fácil fazer a economia melhorar. Basta consenso mínimo do ponto de vista político. Este virá não dos políticos, mas da sociedade que precisa se organizar para requerer mais respeito com o país por parte daqueles que ocupam a gestão do Poder Estatal. É preciso mobilização, não propriamente reuniões na rua. É preciso ocupar a cidadania, não exatamente os espaços urbanos.

Por enquanto, nem mesmo o crescente desemprego criou as condições para a formação de um consenso mínimo para que saiamos deste atoleiro. Todavia, ao que parece estamos decididos a “deixar como está para ver como é que fica”. Atitude arriscada, não é mesmo?

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