Por que a temporada de resultados do 2º trimestre nos EUA será monitorada de perto pelos investidores

Alta dos preços deve pressionar margens e perspectiva de recessão coloca em xeque projeções futuras

Vitor Azevedo

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Nessa quinta-feira (12), ganha força a temporada de balanços do segundo trimestre de 2022 em Wall Street, que será especialmente acompanhada por gestores e analistas. Com a inflação ainda alta e com a possibilidade de uma recessão no horizonte, os números trazidos devem ser observados – ainda mais – de perto, de forma a já monitorar os efeitos das projeções para as empresas.

Segundo a FactSet, empresa americana de dados financeiros, o lucro das companhias que fazem parte do S&P 500  entre abril e junho deste ano deve avançar 4,1% na base anual – número que já diminuiu na comparação com a projeção anterior, que era de alta de 5,9%, e que, no caso de se consolidar, definirá o trimestre como o de menor crescimento desde o fim de 2020.

“Do primeiro trimestre para o segundo o cenário se deteriorou bastante. As empresas já começaram a sinalizar cortes de mão de obra, a inflação aumentou e o preço da energia subiu. Agora temos também o início da alta de juros do Federal Reserve”, explica Rafael Nobre, analista internacional da XP Investimentos. “O mercado vai querer saber o impacto de todas essas variáveis nos resultados”.

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Em um contexto de aperto monetário na maior economia do mundo, é esperado que, na maioria, as empresas vejam suas receitas recuarem: o menor acesso a crédito diminui o fluxo de capital. Além disso, a inflação, ainda alta, tende a impactar diretamente as margens de lucratividade, com as companhias segurando repasses de preço para não perder clientes.

“O principal fator que o mercado vai olhar será o quanto a alta da inflação já está impactando na rentabilidade das empresas e o quanto elas estão conseguindo repassar os preços”, comenta Nobre.

Já entre janeiro e março deste ano, a questão da alta dos preços foi destaque, principalmente nos balanços das companhias de supermercado como o Walmart e Target. A inflação levou os consumidores a comprarem menos e diminuiu as margens.

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Para o segundo trimestre, o analista da XP espera que o varejo americano continue pressionado nessa frente e que os balanços tragam também o desenrolar de um problema que já vinha aparecendo na última temporada: o do aumento dos estoques.

O menor consumo por conta do avanço dos preços fez parte das varejistas verem alguns dos produtos em suas prateleiras ficarem intocáveis. “As pessoas estão dando prioridade a comprar mercadorias mais baratas e de maior necessidade”, explica Nobre. “Com isso, algumas varejistas já sinalizaram anteriormente um excesso de estoque e, o caminho normal após isso, é a realização de liquidações, o que traz pressão extra para as margens”.

Na frente da inflação, determinados setores, normalmente, são beneficiados pela alta dos preços. Hipermercados e supermercados, por exemplo, apesar de também impactados, costumam conseguir repassar mais a alta dos preços do que varejistas que trabalham mais com eletroeletrônicos e eletrodomésticos. Algo parecido se dá também para o setor de utilidades.

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“Companhias mais ligadas ao consumo discricionário acabam sofrendo mais enquanto consumo básico tende a performar melhor, ou ao menos repor suas margens durante o período inflacionário”, explana Guilherme Zanin, estrategista da Avenue.

Ainda nesta linha, o especialista da Avenue aponta que as empresas ligadas ao setor de energia devem ser os destaques positivos do trimestre. Os preços dos combustíveis ainda elevados mantêm a lucratividade alta e o consumo nesta frente não é tão afetado pela alta dos preços, uma vez que as pessoas têm de continuar a consumir energia.

Do outro lado da inflação, a alta dos juros

A forma como o Federal Reserve vem agindo para controlar a alta dos preços é através da elevação dos juros, tendo elevado pela primeira vez desde 2018 a taxa básica no último mês de março.

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“Bancos, normalmente, têm suas receitas beneficiadas pela alta dos juros e isso deve ser visto nos balanços deste trimestre”, afirma Zanin. “Do outro lado, porém, é necessário também observar de perto a inadimplência”, completa.

O especialista da Avenue explica que é difícil definir facilmente se todos os bancos serão beneficiados pela alta dos juros e que isso depende da exposição de cada instituição financeira a determinados tipos de negócio.

Os bancos muito expostos aos empréstimos imobiliários, por exemplo, tendem a ser prejudicados. “Apesar de aumentar os ganhos com empréstimos, a alta dos juros tende a fazer quem está interessado em uma nova casa a repensar a movimentação. Temos visto um número significativo de redução de compras de imóveis nos Estados Unidos”, contextualiza.

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Em junho, último mês do segundo trimestre, as taxas de juros dos empréstimos para financiamento de imóveis subiram para o maior nível em 14 anos em junho, depois que o Fed aumentou os juros da economia em 0,75 ponto percentual. No começo deste mês, a taxa média dos empréstimos para financiamento de imóveis em 30 anos, o empréstimo imobiliário mais comum dos Estados Unidos, era de 5,3%, frente 2,9% no mesmo mês de 2021.

Mesmo com a alta das taxas, as instituições financeiras que possuem parte relevante das suas receitas ligadas ao empréstimo imobiliário viram seus faturamentos nesta frente recuarem – caso do Wells Fargo, o maior banco do setor de hipotecas norte-americano, que registrou no primeiro trimestre uma queda de 33% na base anual na receita de hipotecas.

Ainda nesta frente, a alta das taxas tende a levar a um aumento das provisões voltadas a devedores duvidosos. “As instituições financeiras que dependem do negócio de hipoteca veem uma queda da rentabilidade, com a redução de compras, a postergação de pagamentos e o aumento de provisões, se preparando para um período de vacas magras”, pontua Zanin.

Do outro lado, com esse ambiente de maior risco, seguradoras devem se beneficiar, bem como corretoras, que viram as negociações aumentarem em meio à alta volatilidade.

Quem deve se prejudicar também pela alta dos juros e das hipotecas, em associação, são as companhias ligadas ao setor imobiliário. Alguns sinais, nesta frente, já apareceram: o estoque de casas à venda vem crescendo, há um corte do preço das residências e as imobiliárias vêm demitindo pessoas.

Capex e guidances

Este último ponto, de demissões, deve ser avaliado de perto em todos os setores: com a perspectiva possível de uma recessão, os guidances e os Capex estarão no centro da discussão. “Investidores pretendem acompanhar como as companhias estão se posicionando para o futuro, se pretendem cortar custos ou investir”, explica.

O Bank of America, em relatório, também destaca como as projeções de investimentos e de lucros futuros serão importantes nos documentos.

“Em um ponto em que os lucros estão diminuindo, o capex obrigatório pode representar um problema indesejado”, explicam os analistas do banco americano. “Ao mesmo tempo, o capex pode ser mais necessário do que em ciclos anteriores. Há desafios da cadeia de suprimentos, riscos geopolíticos emergentes e uma mão de obra apertada , que incentiva as empresas a gastarem para automatizar”.

Na frente de projeções, o BofA vê que a tendência de revisões continuará a se deteriorar. “Esperamos lucros por ações (EPS, na sigla em inglês) em linha no segundo trimestre. O enfraquecimento das orientações continuará sendo o foco: acreditamos que os consensos de EPS para o segundo semestre e para o próximo ano cairão substancialmente”.

Segundo o banco americano, o risco de recessão, no segundo trimestre, tomou a frente entre as maiores preocupações das companhias, no lugar do temor de problemas com a cadeia de suprimentos. “No primeiro trimestre, as empresas citaram uma desaceleração da demanda e esperamos que isso continue. Os anúncios de demissões, que aumentaram recentemente, também devem se perpetuar, aumentando as preocupações de recuo econômico”, finalizam.

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