Estrangeiros tiram R$ 15 bilhões da Bolsa brasileira em 2024: para onde esse dinheiro foi?

Títulos americanos, bolsas asiáticas e companhias de tecnologia são alguns dos destinos apontados por especialistas

Vitor Azevedo Rodrigo Petry

Ilustração abstrata de fluxograma/diagrama de blocos de negócios ou programação. (Foto: GettyImages /Fonte do mapa em - www.lib.utexas.edu/maps/world.html)

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Janeiro foi marcado pela saída de quase R$ 8 bilhões de capital estrangeiro da B3 – o que continua a acontecer em fevereiro, com mais R$ 6,89 bilhões sacados até dia 15. O movimento reverte um fluxo de entrada que se estendeu por praticamente todo o quarto trimestre de 2023. Nesse ano, o déficit já é de R$ 14,79 bilhões.

Mas para onde foi o dinheiro que saiu da Bolsa brasileira?

Os sinais, segundo analistas ouvidos pelo InfoMoney, são de que o fluxo do mercado mudou. E o primeiro destino dos bilhões saídos da B3 foram os títulos do tesouro americano. Janeiro e a primeira metade de fevereiro foram marcados por uma revisão de quando o ciclo de queda de juros dos Estados Unidos iniciará – por conta de sinalizações do Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) e dados macroeconômicos mais fortes do que o esperado. Isso provocou elevação das taxas dos Treasuries.

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“A alta dos juros foi, na minha visão, o estopim que levou o investidor estrangeiro a sair”, diz Cesar Mikail, gestor de renda variável da Western Asset. “Em novembro, houve uma entrada de R$ 21 bilhões. Em dezembro, mais R$ 17,5 bilhões. Em janeiro, observamos uma saída. Ativos que oferecem maior segurança tendem a atrair o investidor”. Os títulos do governo dos EUA são considerados “os mais seguros do mundo”, emitidos pela maior economia global. Quando oferecem taxas maiores, recebem mais aportes, com os investidores rebalanceando as carteiras de olho no risco x retorno. 

Mas há também outros destinos. Para Alexandre Reitz, chefe de renda variável do Julius Baer Brasil, parte do dinheiro possivelmente foi para outras bolsas. “Parece que o fluxo está se deslocando de países como Brasil e Índia para Japão e Coreia, onde um fluxo significativo registrado desde o segundo semestre de 2023 acelerou em janeiro”. É difícil, porém, “cravar” que os recursos saindo daqui estão alimentando diretamente os mercados asiáticos – eles podem estar seguindo para a renda fixa, por exemplo.

Enquanto os mercados de países emergentes sofrem com o recuo dos preços das commodities como minério e grãos, abatidos pela desaceleração da China, a bolsa do Japão está próxima das máximas desde 1990, com alguns analistas vendo espaço para ir além. Lá, o mercado repercute o fim do ímpeto da alta dos juros pelo Banco do Japão, após dois trimestres de recessão técnica no país.

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De olho nas big techs

Há ainda quem aponte a performance das big techs americanas como uma detratora dos resultados da Bolsa brasileira. Com o boom envolvendo a inteligência artificial e as perspectivas de crescimento para as empresas do segmento, investidores têm procurado mais as ações do grupo apelidado de Magnificent Seven, que inclui Microsoft, Google e Nvidia. 

À medida que as bolsas americanas sobem e mantêm projeções otimistas, o interesse e a necessidade de buscar maior retorno nos mercados emergentes – uma opção de maior risco – diminui. Não raro, circulam comentários de que “não há motivo para tomar risco maiores em países emergentes, já que as ações de tecnologia oferecem perspectivas grandes de valorização”.

“A maior parte do fluxo de saída se deu por conta da perspectiva de juros altos por mais tempo e de algumas questões ligadas especificamente ao Brasil e à China, mas um pedaço do fluxo também está indo para S&P”, diz Danilo Igliori, economista-chefe da Nomad.

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Na visão dos especialistas, todos os pontos mencionados como causas da saída do estrangeiro do Brasil poderiam ser revertidos. No caso dos juros nos Estados Unidos, a percepção de alguns é de que as recentes justificativas para o avanço das taxas dos Treasuries não se sustentam. “Não acreditamos que tudo isso seja estrutural, porque, em última análise, o Fed uma hora irá aliviar a situação. É apenas uma questão de ‘quando’ e ‘por quanto’”, diz Yan Wang, chefe de mercados emergentes da Alpine Macro.

Wang também menciona que os índices americanos, principalmente os que reúnem companhias de tecnologia, podem estar caros. “Alguns analistas começaram a destacar o aumento do múltiplo de preço/lucro, sugerindo que pode estar se tornando excessivamente elevado”, completa Reitz, da Julius Baer.

Quanto à China, os especialistas destacam que ainda é cedo para falar que as preocupações com a economia do país terão impactos permanentes na Bolsa brasileira. 

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“Os preços das ações brasileiras continuam em níveis consideravelmente descontados em termos de valuation, o que proporciona certo conforto para manter investimentos na Bolsa. Contudo, será de suma importância monitorar de perto a situação da economia chinesa após o feriado de ano novo, durante a segunda metade de fevereiro”, avalia Reitz, ressaltando a retomada dos negócios nesta segunda-feira (19).