Entrevista: CFO da Localiza diz que cenário macro nunca foi tão positivo à empresa

Sobre a crise, Roberto Antonio Mendes abre o jogo e conta que esta foi a pior turbulência já vivenciada pela companhia

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SÃO PAULO – Com um share de 38% do mercado e 431 agências em oito países – sendo 366 no Brasil – a Localiza, que há muito sofre com as altas taxas de juros reais, prevê um momento nunca antes vivido pela empresa, graças ao movimento de queda da Selic, às Olimpíadas e à Copa do Mundo. Em entrevista a InfoMoney, o CFO e diretor de Relações com Investidores, Roberto Antonio Mendes, não escondeu seu otimismo.


Mendes: “Mesmo que a Selic suba um
pouco, cenário continuará favorável”

Ele revelou ainda que a empresa, listada no Novo Mercado desde 2005, é beneficiada por seu nível de governança corporativa, por meio do qual obtém juros menores no mercado. Por fim, contou sobre os bastidores da crise mundial na companhia, revelando que esta foi a pior turbulência já vivenciada pela Localiza.

InfoMoney: Desde que foi fundada, em 1973, a Localiza já passou por diversos momentos difíceis da economia mundial e nacional. Podemos concluir que, com a experiência adquirida, a crise econômica recente foi enfrentada com tranquilidade pelos executivos da empresa?
Mendes: Não. Foi a pior crise já vivenciada pela Localiza. A liquidez caiu, o spread estava aumentando assustadoramente, houve queda no PIB e a redução da alíquota do IPI para automóveis prejudicou a venda dos seminovos da empresa.

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InfoMoney: O que a empresa fez, diante desse cenário?
Mendes: Imediatamente, suspendemos as compras de carros novos, porque as vendas estavam mais lentas. O objetivo era ajustar a frota à demanda. O quarto trimestre do ano passado foi muito ruim. Concentramos nossa atuação na geração de caixa e na melhoria do perfil da dívida. Antecipamos a dívida que iria vencer em 2010 e 2011. Durante seis meses, tivemos êxito em manter o caixa sob controle. Após o segundo trimestre deste ano, a empresa estava mais forte do que no início da crise, preparada para retomar o crescimento*.

InfoMoney: Quais são os pontos fortes da gestão da empresa?
Mendes: Em primeiro lugar, o know-how e o foco no negócio. Estamos neste mercado há 36 anos e só o que fazemos é captar recursos, comprar carros, alugá-los e vendê-los. Estamos sempre renovando a frota. Além disso, nossa marca é muito forte e reconhecida. Outro diferencial é a distribuição geográfica. Na América Latina, somos maiores, em número de agências, do que a segunda, a terceira e a quarta colocadas somadas. A distribuição geográfica favorece a diluição do custo fixo [porque quanto mais agências envolvidas, menores são os custos junto aos fornecedores], a fidelização do cliente e a venda diretamente ao consumidor final, pois se evitam custos de intermediação, com menor depreciação do produto. Por fim, a empresa conta com rating AA-, em escala nacional, da Standard & Poors’ (crédito corporativo) e da Moody’s (debêntures), com perspectiva estável. Isso faz com que tenhamos acesso a melhores taxas de juros para financiamento e debêntures. Entendemos que precisamos ter níveis de governança corporativa altos, porque quanto mais transparente formos, mais conforto ofereceremos ao investidor e menores serão os juros a pagar.

InfoMoney: Como o senhor enxerga a consolidação do setor?
Mendes: O mercado de aeroporto está consolidado no País. Já o de varejo [fora dos aeroportos] caminha para uma consolidação. Hoje o mercado de varejo representa um terço das receitas da Localiza.

“Devemos ter juros reais de 5% a.a. em 2010. Entre 2004 e 2008, os juros reais eram de 9,1% a.a. e ainda assim crescemos 30% a.a.”

InfoMoney: O recente movimento de queda da Selic fortaleceu o negócio?
Mendes: Sim. Os juros caíram bastante nos últimos tempos. Devemos ter juros reais próximos de 5% ao ano em 2010, pois o mercado projeta um aumento na taxa para 10,25% no ano que vem. Tabalhamos com esses números. Mesmo que a Selic suba um pouco, o cenário macroeconômico continuará favorável à Localiza. Para se ter uma ideia do quanto esse movimento de queda da Selic ajudou nosso business, é só lembrar que, entre 2004 e 2008, os juros reais eram de em média 9,1% a.a. e o PIB crescia 4,7%. Já entre 1997 e 2003, o PIB crescia pouco e os juros reais eram elevadíssimos, de 14%. Em 2010 e 2011, o PIB deve crescer entre 4,8% e 5% a.a. e os juros reais, 5%. Mesmo entre 2004 e 2008, quando o cenário não era assim tão positivo, a empresa cresceu 30% a.a. Hoje, a situação é até melhor, com a Copa do Mundo e as Olimpíadas chegando.

InfoMoney: Há alguma aquisição nos planos da Localiza?
Mendes: Não. A aquisição teria de agregar valor à empresa e, até agora, não vimos nenhum caso em que poderíamos sair ganhando. Nem em termos de penetração de mercado, já que somos fortes nesse quesito. Com relação à frota, também não precisamos de aquisições. Temos um grande share de mercado com forte geração de caixa. Em 2004, detínhamos 22% do mercado. Em 2008, esse percentual aumentou para 38%. São quatro pontos percentuais por ano.

*Nota: No terceiro trimestre, a Localiza teve um lucro líquido de R$ 20,6 milhões, o que representa uma queda de 58,9% frente ao mesmo período do ano anterior. Já nos nove primeiros meses do ano, o lucro acumulado ficou em R$ 78 milhões, 50,4% menor do que o registrado em igual período de 2008. Já a receita líquida, também no acumulado do ano, caiu 8,9%, para R$ 1,3 bilhão. No terceiro trimestre, por sua vez, ficou em R$ 442,5 milhões (-16,6%). Quanto à dívida, foram captados R$ 400 milhões em debêntures com prazo de pagamento de seis anos. A empresa ainda pagou antecipadamente R$ 300 milhões da dívida que venceria em 2011.