Dólar tem queda pontual com leilões à vista do BC, mas pressão externa mantém tendência de alta

Operação do BC agrada mercado porque reduz o custo da dívida; leilões de swap reverso compensam venda de dólares da reserva

Anderson Figo

Notas de real e dólar sendo trocadas (Shutterstock)

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SÃO PAULO — Pela primeira vez desde a crise de 2009, o Banco Central venderá dólares à vista das reservas internacionais, atualmente em US$ 388 bilhões. A medida foi bem recebida pelo mercado, e a percepção é de que, embora possa contribuir para uma queda pontual do dólar, a operação não vai mudar a tendência de alta da moeda no médio prazo, que é um movimento global. 

O dólar comercial fechou em queda de 1,242%, para R$ 3,9903 na venda e R$ 3,9878 na compra. O Banco Central anunciou na noite de ontem que vai leiloar US$ 550 milhões por dia entre 21 e 29 de agosto, totalizando US$ 3,845 bilhões no período.

Até agora, em momentos de alta da moeda americana, a autoridade monetária leiloava contratos de swap cambial tradicional, que equivalem à venda de dólares no mercado futuro (o BC emite os títulos e o tomador recebe a variação do dólar mais uma taxa de juros em dólar, chamada de cupom cambial).

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Feitas em reais, essas operações não afetam as reservas internacionais, mas têm impacto na posição cambial do Banco Central e aumentam os juros da dívida pública do país.

Agora, o BC atuará de maneira diferente. Além dos US$ 550 milhões que serão vendidos por dia no mercado à vista, ele também vai comprar diariamente o mesmo valor em contratos de swap cambial reverso, que funcionam como compra de dólares no mercado futuro (o BC recebe a oscilação do dólar e quem toma o ativo receberá a variação do juro em reais).

Caso a demanda por dólares à vista fique abaixo desse valor, a autoridade monetária completará a operação com contratos de swap tradicional. 

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“Essa emissão de dólares não só ajudará a conter a apreciação da moeda, que superou os R$ 4 na última sessão, aumentando a liquidez no mercado, mas também ajudará a reduzir a dívida bruta (ao vender dólares, o BC recebe reais e resgata a dívida)”, escreveram os analistas Thiago Salomão e Matheus Soares, da corretora Rico, em relatório.

Além da redução do custo da dívida, o que foi bem recebido pelo mercado é que a medida do Banco Central atende à menor necessidade de hedge por meio de swaps cambiais e ao aumento da demanda por liquidez no mercado à vista. 

A atuação do BC não coloca as reservas em risco porque a venda no mercado à vista é compensada pela redução do estoque de swaps. “Alivia a pressão adicional que poderia vir do mercado de cupom cambial pela baixa liquidez do mercado à vista e pelo estreitamento do juro interno e externo”, diz Sidnei Nehme, diretor da NGO Corretora. O cupom cambial para janeiro de 2020 cai hoje após quatro altas seguidas. 

Contudo, afirma o especialista, há uma pressão de alta do preço do dólar conjuntural que manterá a tendência, especialmente com as incertezas geradas em torno da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, que acabam afetando todos os países.

“Os Estados Unidos com perspectiva de recessão, contrapondo-se à sua dinâmica forte até então. A Europa afetada pela perda de atividade da Alemanha, perdendo ritmo de atividade e naturalmente de crescimento. E a China revelando queda da produção industrial, atingindo o menor ritmo de 17 anos”, diz Nehme. 

“O Brasil, sabidamente, tem uma situação cambial fortemente defendida ao deter reservas cambiais acima de US$ 380 bilhões e déficit em transações corrente equilibrado. Mas a aversão ao risco deflagrada no cenário global, que desloca recursos em busca de proteção para o ouro, dólar, iene e franco suíço, provoca desvalorização conjuntural das moedas emergentes, como o real, frente às moedas e ativos “portos seguros” e provoca a valorização das mesmas no mercado global.”

O fluxo cambial neste mês até o dia 9 está positivo em US$ 169 milhões, mas as saídas financeiras registram US$ 2,112 bilhões. “No contexto atual é inevitável que o real, moeda de país emergente, a despeito de o país estar bem ancorado na questão cambial, não repercuta de forma direta a pressão do mercado global com a aversão ao risco”, conclui o diretor de câmbio da NGO.

Limite de uso das reservas

Em entrevista à Bloomberg, Tony Volpon, economista do UBS e ex-diretor do Banco Central, disse que a venda de um volume limitado de reservas cambiais, de US$ 15 bilhões a US$ 20 bilhões, não causará impacto sobre o nível de risco do Brasil. Porém, se o montante for maior, na casa dos US$ 50 bilhões, isso pode ser preocupante. 

Segundo o economista, o estoque de swaps chega perto de US$ 70 bilhões e, pela maneira como o BC fez o anúncio da atuação, “o teto desta estratégia seria este volume de swaps que o mercado já tem”.

As saídas de dólar, explica Volpon, levam à falta da moeda no mercado à vista e aumentam o cupom cambial — que é a taxa em dólar que o investidor consegue obter no Brasil. O aumento do cupom, por sua vez, deveria atrair fluxo estrangeiro, na teoria. Mas o capital não está vindo para o país por vários fatores, como a guerra comercial. 

“A nova atuação com venda de dólar à vista vai permitir a redução das operações compromissadas com dívida pública, que entram no cômputo da dívida bruta. A redução da dívida tem sido um foco do ministro Paulo Guedes, como também apontam as devoluções dos recursos do BNDES ao Tesouro. Se o dólar continuar subindo a um nível que afete as projeções de inflação, isso reduz o espaço para o BC continuar cortando a Selic. O dólar ir para R$ 4 não muda o orçamento de redução dos juros, mas há um dólar que pode mudar.”

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