Dólar cai 3,5% em dois dias com Fed e depreciação pode continuar, mas efeito de longo prazo é limitado

O fim do ciclo de desvalorização do real frente ao dólar pode depender mais dos próprios brasileiros do que se supõe

Ricardo Bomfim

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SÃO PAULO – O dólar cai forte desde ontem por conta do anúncio feito pelo presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, de que a política monetária do banco central dos Estados Unidos irá mudar. Agora, a meta de inflação não é mais fixa, e o objetivo será chegar a um índice que fique em 2% ao ano em média.

Desde o discurso, o dólar caiu 3,51%, saindo de R$ 5,6124 para R$ 5,4156 (cotação do fechamento desta sexta-feira, 28).

Segundo Bruno Lavieri, economista e sócio da 4E Consultoria, as declarações de Powell não fazem tanta diferença no longo prazo, mas de fato ajudam a desvalorizar a moeda dos EUA frente às outras moedas do mundo num horizonte mais curto de tempo.

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“Basicamente, o que o presidente do Fed defende é que não tem problema uma inflação um pouco maior que a meta por algum tempo, desde que isso seja compensado nos anos seguintes. O valor da moeda derrete um pouco com essa flexibilização da política monetária”, explica.

Os economistas Xiao Cui e Jeremy Schwartz, do Credit Suisse, destacam que a revisão na condução da política monetária do Fed já começou em 2019 e as novas diretrizes meramente codificam e formalizam muitas dessas inovações.

“Uma regra flexível maximizará a discricionariedade do Fed no futuro. No entanto, na prática, os detalhes sobre uma meta de inflação média provavelmente não fariam muita diferença para os resultados da política monetária”, escrevem os analistas.

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Para Lavieri, olhando para o cenário de real frente ao dólar, o câmbio depende mais de quanto tempo demorará para que a pandemia do coronavírus seja superada e de como será enfrentada pelo governo a questão fiscal do que das sinalizações do Fed.

“Hoje os riscos são assimétricos no plano fiscal. O [ministro da Economia] Paulo Guedes está enfraquecido e os planos que saem do governo são de aumento de gastos e não de contenção. No entanto, essas notícias já saíram e o mercado já as precificou, então não vejo mais tanta força na depreciação do real”, explica.

Vale destacar que, além do Fed, também contribui para a baixa da moeda nesta sessão a autorização pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) do repasse de R$ 325 bilhões do Banco Central para o Tesouro Nacional, na medida em que ajudará na gestão da dívida pública em um momento de maior sentimento de cautela em meio ao risco fiscal.

Lavieri diz que a projeção da 4E é de que o dólar encerre 2020 custando R$ 4,80 com a pandemia contida ou pelo menos melhor entendida, de modo que haja mais clareza sobre o futuro da economia global.

“A depreciação que ocorreu este ano tem muito a ver com a dificuldade do mercado em precificar uma questão médica, de saúde. Os investidores nunca souberam e continuarão não sabendo como fazer isso. Uma vez que a Covid-19 deixe de ser uma preocupação tão premente, os preços voltarão aos fundamentos”, acredita o economista.

Os próximos passos do Fed

A avaliação da equipe de análise do Credit é de que a mudança mais inesperada no discurso de Powell tenha sido o que foi falado sobre emprego. “Pelas novas diretrizes, as decisões de juros serão muito mais baseadas em deficiências do pleno emprego do que em desvios como ocorria anteriormente”, comentam os economistas do banco.

Na prática, eles acreditam que isso reflete a visão do Fed de que um mercado de trabalho forte pode ser sustentado sem causar um indigesto aumento descontrolado na inflação.

Já em termos de política de juros, significa que os membros do BC dos EUA temem realizar apertos monetários prematuros nos primeiros estágios da retomada econômica e da aceleração das contrações pelas empresas. Ou seja, a política monetária expansionista deve perdurar.

A equipe de análise da Capital Economics, por sua vez, entende que as taxas de juros americanas estão tão baixas no longo prazo que é improvável que a nova condução da política monetária do Fed traga grandes mudanças.

Para a consultoria, a alta nos rendimentos dos treasuries (títulos do Tesouro dos EUA) depois do anúncio foi surpreendente. Porém, pode ser explicada por uma decepção dos investidores com o fato do Fed não ter revelado mais apoio de política monetária imediato.

Entretanto, a Capital Economics não descarta que essa elevação nos yields dos títulos faça com que o banco central dos EUA decida ser mais ousado nas próximas comunicações, anunciando mais medidas de estímulo à economia.

“O comunicado da próxima decisão do [Comitê Federal de Mercado Aberto] Fomc provavelmente incluirá o comprometimento explícito de não elevar mais os juros até que a inflação cresça sustentavelmente acima de 2%, e pode também ser usado para sinalizar uma renovada aceleração nas compras de títulos pelo Fed”, ressalta a consultoria.

Apesar disso, a Capital Economics admite que não há muito nos dados econômicos recentes dos EUA que sugiram uma “necessidade desesperada por mais medidas de estímulo”. Isso porque além da célere recuperação do mercado imobiliário, devido aos custos de hipotecas nas mínimas históricas, as vendas de bens duráveis em julho sugerem que o investimento vivencie uma recuperação em “V”.

Essa combinação de política monetária mais frouxa e recuperação econômica no radar pode ser a senha para um câmbio não tão depreciado por aqui, mas tudo depende de como o Brasil vai performar em relação aos demais países do mundo. Na semana que vem, um indicativo disso será dado com a divulgação do Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre.

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Ricardo Bomfim

Repórter do InfoMoney, faz a cobertura do mercado de ações nacional e internacional, economia e investimentos.