Decisão reforça proibição de emissão de tokens de valores mobiliários no Brasil

Desfecho do caso é apontado como um dos principais precedentes para o tema da emissão de tokens no país

Paulo Barros

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O Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) decidiu na terça-feira (7) a favor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em julgamento de recurso contra a condenação, em âmbito administrativo, de uma empresa brasileira pela emissão irregular de tokens de valores mobiliários.

O caso se desenrola desde 2018, quando a CVM ingressou com processo administrativo sancionador contra a Iconic e seu fundador, Jonathan Doering Darcie, pela realização de uma oferta inicial de moeda (ICO, na sigla em inglês) sem aval da autarquia – no Brasil, com exceção dos ambientes de sandbox regulatório, apenas a B3 tem permissão para oferecer valores mobiliários.

O colegiado do CRSFN acatou parecer da conselheira Ilene Najjarian, Procuradora Federal junto à CVM, para quem o criptoativo NIC, emitido pela Iconic, se trata de contrato de investimento coletivo. Após realização de “teste de Howey”, foi constatado que o token precisaria de chancela da CVM para sair do papel.

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O CRSFN, no entanto, atendeu pedido da empresa de que a multa estipulada pela autarquia foi excessiva, na medida em que os recorrentes não teriam praticado ato de má-fé em relação à oferta do token NIC. A multa foi dispensada do fundador, e mantida apenas para a empresa – a Iconic deverá desembolsar R$ 387 mil.

Contatado pela reportagem, Jonathan Doering Darcie disse que não se pronunciaria sobre o caso.

Precedente

Apesar de ainda não terem regulamentação, os criptoativos ficam sob o guarda-chuva da CVM sempre que tiverem características de valor mobiliário. Um parecer divulgado pelo órgão no ano passado reafirma esse posicionamento.

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Para evitar problemas, empresas do ramo costumam consultar o órgão para esclarecer dúvidas antes da emissão, o que não aconteceu no caso da Iconic, pioneira das ICOs no Brasil.

A Iconic se defendeu pedindo a nulidade do processo pela ausência dos elementos comprobatórios da acusação, alegando que a definição de valor mobiliário não poderia ser aplicada ao caso, que criptomoedas não seriam poupança pública e que, por essa razão, estariam fora da competência da CVM. Na visão da empresa, o token NIC seria na verdade um utility token.

O julgamento do CRSFN reforça uma metodologia adotada anteriormente pela CVM para identificar uma entidade por trás do projeto que será responsável (ainda que em parte) pelos benefícios econômicos prometidos aos compradores dos tokens ofertados publicamente.

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“Se o token prometer, ainda que indiretamente, alguma participação no resultado da empresa, então será valor mobiliário”, avalia o professor do Insper e Ibmec, e ex-analista da CVM, Isac Costa.

Na opinião de Costa, apesar de ser apenas um reforço de um entendimento já conhecido, a decisão cria um importante precedente para a legalidade da emissão de tokens no país. “Esse precedente, em conjunto com o Parecer de Orientação CVM 40/2022, são as referências principais sobre o tema no Brasil hoje”, conta.

Paulo Barros

Editor de Investimentos