Dados da China reforçam visão de instabilidade, elevam pessimismo com economia e impactam commodities

Para economistas de bancos, mais medidas de estímulos terão que ser realizadas além do corte de juros anunciado pelo banco central do país

Lara Rizério

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Se alguns dados da economia americana animaram na semana passada, os da China divulgados na noite da última quarta-feira (14) representaram uma fonte de pressão adicional para as commodities, especialmente para o minério de ferro, fazendo os papéis de empresas ligadas a matérias primas registrarem baixas.

A produção industrial cresceu 3,8% em julho em relação ao ano anterior, abaixo da expansão de 3,9% em junho e de aumento de 4,6% esperado por analistas em uma pesquisa da Reuters. As vendas no varejo, que só voltaram a crescer em junho, aumentaram 2,7% em relação ao ano anterior, contra expectativa de crescimento de 5,0% e alta de 3,1% observada em junho.

O setor imobiliário, que sofreu ainda com um boicote hipotecário que pesou sobre o sentimento do comprador, deteriorou-se em julho. O investimento imobiliário caiu 12,3% no mês passado, a taxa mais rápida deste ano, enquanto a queda nas novas vendas se intensificou para 28,9%.

Em meio a esse conjunto de dados, os contratos futuros de minério de ferro nas bolsas de Dalian e Cingapura caíram nesta segunda-feira em meio à série de indicadores econômicos decepcionantes e ondas de calor no gigante asiático.

O contrato de minério de ferro mais negociado, para entrega em janeiro do próximo ano, na Dalian Commodity Exchange encerrou as negociações com queda de 2,9%, a 707,50 iuanes (104,64 dólares) a tonelada. Na Bolsa de Cingapura, o contrato de setembro do ingrediente siderúrgico caiu 3,1%, para 107 dólares a tonelada.

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Com isso, ações de mineradoras e siderúrgicas como Vale (VALE3), CSN (CSNA3), Usiminas (USIM5) e Gerdau (GGBR4) têm baixas, respectivamente, de 2,2%, 4,3%, 3% e 1,5%, pressionando o Ibovespa durante a tarde na sessão desta segunda-feira (15).

Além disso, as chances de uma recuperação na atividade este mês pareciam pequenas com o calor extremo sendo sentido em várias regiões da China. As “temperaturas perigosamente e historicamente altas … causarão estragos na atividade econômica”, disse Atilla Widnell, diretor administrativo da Navigate Commodities.

Os preços do petróleo também caíam cerca de 4% nesta segunda-feira devido a temores de demanda, com os dados econômicos decepcionantes da China renovando as preocupações com uma recessão global.

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A produção de refinarias da China caiu para 12,53 milhões de barris por dia (bpd), o menor nível desde março de 2020, mostraram dados do governo.

Com dados mostrando desaceleração, o que se pode esperar da economia chinesa e da efetividade das medidas do governo?

Para apoiar a economia em dificuldades, o Banco Central do Povo da China (PBoC, na sigla em inglês) cortou inesperadamente na segunda-feira a taxa de juros pela segunda vez este ano. O PBoC anunciou que baixou as taxas de juros tanto da linha de crédito de médio prazo de um ano quanto dos acordos de recompra reversa de sete dias em 10 pontos-base, enquanto injeta liquidez por meio dos dois instrumentos.

A taxa de MLF de um ano foi reduzida para 2,75% e a taxa de recompra reversa de sete dias foi reduzida para 2,0%. Os cortes podem levar a uma redução das taxas de empréstimo de referência da China – a taxa básica de empréstimo – no final deste mês, pois as taxas são precificadas com base nas taxas de MLF. O banco central também injetou liquidez de 400 bilhões de yuans (US$ 59,3 bilhões) por meio do MLF de um ano e 2 bilhões de yuans por meio de recompras reversas de sete dias.

“Os indicadores de atividade econômica chinesa ficaram amplamente aquém das expectativas do mercado. O mercado imobiliário continua sendo o destaque negativo, mostrando desaceleração contínua, mesmo as vendas de imóveis, que se recuperaram um pouco em junho, após afrouxamento das restrições do Covid-19. Por outro lado, os investimentos em infraestrutura continuaram a aumentar, uma tendência que esperamos que continue à medida que as medidas de estímulo forem iniciadas”, aponta o Bradesco BBI.

O Goldman Sachs também reforça que os dados de atividade de julho ficaram amplamente abaixo das expectativas, sugerindo que a recuperação sequencial do crescimento após os bloqueios da Omicron em abril-maio ​​foi interrompida e até foi ligeiramente revertida em julho – apesar de um relaxamento na política de controle da Covid, apoio político incremental e efeitos de base favoráveis.

“Isso aponta para uma demanda doméstica ainda fraca em meio aos surtos esporádicos de Covid, cortes de produção em algumas indústrias de alto consumo de energia e impacto adverso de eventos de risco recentes no setor imobiliário”, destaca o Goldman.

O crescimento da produção industrial diminuiu, influenciado principalmente pelo enfraquecimento da produção de computadores e fundição de metais. O crescimento das vendas no varejo diminuiu nas vendas de produtos offline, como automóveis, alimentos e medicamentos, mais do que compensando a melhora modesta nas vendas de produtos online e vendas de refeições.

O crescimento do investimento em ativos fixos caiu em julho, devido principalmente ao menor investimento em propriedades e manufatura, enquanto o investimento em infraestrutura permaneceu sólido. As taxas de desemprego pesquisadas caíram em julho, sugerindo que a pressão do mercado de trabalho diminuiu um pouco com mais apoio político.

O Goldman apontou que esperava mais recuperação do crescimento a partir de abril/maio até o restante deste ano, mas acredita que o ritmo será muito menos acentuado e mais acidentado do que em 2020 (quando também houve diversas restrições por conta da Covid-19) devido à ausência de alguns dos principais fatores catalisadores para a atividade (por exemplo, exportações e setor imobiliário) e a contínua implementação da política de zero Covid.

“Vemos os cortes inesperados da taxa básica de juros pelo Banco Central do Povo como uma resposta a dados de atividade, crédito e inflação mais fracos do que o esperado em julho. Mantemos nossa visão de que a flexibilização fiscal (especialmente de infraestrutura) e de crédito podem desempenhar um papel mais importante nos próximos meses, mas seu impacto pode ser enfraquecido durante o regime de Covid-zero e enfraquecimento do setor imobiliário”, apontam os economistas do banco americano.

Para o Morgan Stanley, o aumento do risco de queda para o crescimento garante mais medidas de flexibilização da política monetária e também da fiscal.

“As leituras da atividade de julho nos lembram que a economia ainda está em um modo de recuperação instável e abaixo da média, aumentando nossa convicção de que o PIB anual pode atingir apenas 2,7% de crescimento no terceiro trimestre, o limite inferior das projeções atuais do mercado (consenso em cerca de 4%). O risco de queda nas projeções para o 4T22 e 2023 está aumentando, à medida que a espiral descendente do setor imobiliário e as medidas de Covid-zero estão prejudicando o efeito da flexibilização de medidas monetárias para o mercado de crédito”.

Na mesma linha, o JPMorgan destaca que a redução dos juros neste contexto é  um movimento desejável, mas o impacto da política dependerá se o governo é capaz de mitigar a incerteza associada à política de Covid-zero e às perspectivas da Omicron (um fator predominante por trás do fraco incentivo para investimento e consumo). Além disso, também depende se ações imediatas podem ser tomadas para resolver a fraqueza do mercado imobiliário e uma lacuna de financiamento fiscal prevista no quarto trimestre do ano.

“A política monetária é um componente importante, mas talvez de importância secundária no ambiente atual”, destaca. Caso não sejam tomadas novas medidas, os analistas do banco veem um risco significativo para as suas projeções atuais para a economia chinesa (atualmente de alta de 5,7% no quarto trimestre na comparação anual).

Para o Morgan Stanley, os formuladores de políticas precisarão reagir com flexibilização ainda mais agressiva para conter os riscos negativos. “Esperamos mais cortes nas taxas e medidas de estímulo à habitação”, apontam os economistas do banco.

Após os dados de julho, o banco ING cortou sua perspectiva de crescimento para a economia chinesa para 2022 de 4,4% para 4%, alertando que um possível novo corte é possível.

(com Reuters e Estadão Conteúdo)

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.