Crise? Diretor da Fibria diz que notícias têm sido favoráveis para a empresa

Em entrevista para a Rio Bravo Investimentos, Guilherme Cavalcanti fala da recuperação da Fibria desde a crise de 2008 e do atual momento positivo no setor de papel e celuose

Rodrigo Tolotti

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SÃO PAULO – Enquanto a economia brasileira segue em deterioração, pressionando assim a maior parte das empresas na Bolsa, ainda há quem consiga evitar os problemas do País. É o caso da Fibria, que com a disparada do dólar vem sendo muito beneficiada já que tem um perfil mais exportador e acaba tendo grande parte de sua receita atrelada à moeda norte-americana.

E sobre a evolução da companhia nos últimos anos que trata o mais recente podcast da Rio Bravo Investimentos, que conta com uma entrevista com Guilherme Cavalcanti, diretor financeiro e de relações com investidores da Fibria.

Segundo o próprio Cavalcanti, se para a maioria das empresas o cenário atual é de retração em virtude da queda de demanda de commodities, no caso da Fibria as notícias têm sido favoráveis graças principalmente ao consumo da matéria prima pelos países da Europa, para além dos Estados Unidos e da China. Confira a entrevista:

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Rio Bravo – A Fibria lidera a oferta global de celulose, tendo alcançado resultados bastante expressivos nos últimos meses. Do ponto de vista financeiro, para que nós tenhamos uma ideia do momento da empresa, como esse crescimento pode ser mensurado em relação aos concorrentes?

Guilherme Cavalcanti – Em relação a concorrência, é bom falar que a Fibria é o maior produtor mundial de celulose de eucalipto e o maior produtor mundial de celulose, mas com 9% de market share global somente. Então, é um mercado pulverizado e eu diria que esse bom momento do setor é o setor que está favorável para todos os produtores de celulose. No nosso caso, como isso está se traduzindo em termos financeiros, vale lembrar que esse último trimestre de 2015, o nosso indicador de alavancagem, medido pela dívida líquida sobre o Ebitda, fechou o segundo trimestre em 1,9 vezes e de lá para cá, o câmbio se desvalorizou ainda mais e o preço da celulose já subiu mais.

Isso significa que a nossa relação dívida líquida sobre Ebitda vai continuar caindo, mesmo com o investimento de cerca de 8 bilhões de reais que a gente vai fazer na nova planta, em Três Lagoas. Ou seja, mesmo com esse investimento, que é um dos maiores investimentos hoje no Brasil, a nossa relação dívida líquida Ebitda vai continuar em uma trajetória descendente, se o câmbio e o preço da celulose, naturalmente, ficar nesses níveis. A nossa margem de Ebitda no segundo trimestre de 2015 atingiu 50% quando o câmbio médio foi de 3,07. O câmbio do momento está em 3,59 e já anunciamos para o mês de setembro um aumento de 20 dólares. Isso dá uma noção boa de qual potencial de Ebitda e de geração de caixa vem aí pela frente.

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Com isso, a empresa está realmente em um momento extremamente favorável e único na indústria brasileira que, com uma geração de caixa forte, indicadores de alavancagem em queda, a gente hoje tem quatro vias de criação do valor para o acionista que não são mais mutuamente excludentes. Vamos poder investir em crescimento orgânico com essa planta do Horizonte Dois, que já anunciamos em Três Lagoas. Vamos conseguir pagar dividendos para os nossos acionistas. Vamos poder investir em alguns novos negócios, como biorrefinaria, e ainda assim vamos deixar a porta para M&A, ou seja, para fusões e aquisições em aberto, porque eu vou conseguir fazer, como eu falei, investimento, vou conseguir pagar dividendos, vou conseguir fazer investimentos em outros negócios e minha dívida líquida sobre Ebitda não vai subir.

Então, eu mantenho essa porta para uma possível aquisição em aberto, porque vou ter robustez financeira para um movimento, se um dia isso tiver uma oportunidade. É um movimento bastante favorável. Não é comum uma empresa ter todas essas vias de criação de valor ao mesmo tempo, mais uma empresa com as margens de Ebitda e com a geração de caixa que a gente está, apontando a esse câmbio e a esse preço de celulose, isso será possível.

RB – A despeito desse resultado estável, há quem diga que a demanda por commodities da China alcançaram um limite. Em certa medida, o que temos em visto nessa semana em relação aos indicadores também. Qual a importância do mercado chinês para a operação da Fibria?

GC – Esse é um ponto importante que diferencia a celulose das demais commodities. De fato, a China responde hoje por 65% do crescimento do mercado de celulose, mas, em termos absolutos, por exemplo, a China só corresponde por 23% da demanda global de celulose, comparado, por exemplo, com minério de ferro, que ela responde por 75% do que a gente chama de iron ore. Ou seja, você vê que a… E se você olha outras commodities, com cobre, níquel, ouro, petróleo um pouco menos, etc., você vai ver que a China, na área de metálicas, geralmente a China tem em torno de 50% da demanda mundial dessas commodities. Na celulose, esse percentual não chega a 25%.

Então, em termos de volume, a celulose não tem uma dependência tão forte da China, como outras commodities. Um exemplo disso é que a Europa, apesar de toda a crise que passou, nunca deixou de ser o nosso melhor cliente. A gente vende hoje para a Europa cerca de 43% das nossas vendas, cerca de 26% para a América do Norte e para a Ásia como um todo, 25%, sendo que para a China a gente vende um pouco menos de 20%. Ou seja, a gente vê que a gente não tem essa mesma dependência da China como commodities metálicas. Eu acho que essa é a primeira grande diferença da celulose em relação às outras commodities.

Outra diferença é que na China o PIB tem desacelerado por uma queda no investimento fixo, porque a China tem capacidade ociosa na construção civil e em sua infraestrutura, pelos diversos investimentos que foram feitos ao longo dos últimos 10 anos. Por outro lado, o consumo privado tem subido, então o consumo privado da China subindo, beneficia as commodities que consumo, que é o nosso caso.

A penetração de tissue, que é papel higiênico, lenço de papel, guardanapo, que é o nosso principal foco das nossas vendas, ou seja, celulose para esse tipo de produto, tem uma penetração muito baixa ainda na China. A China consome somente quatro quilos de tissue por habitante por ano. Para ter uma comparação, a América Latina consome seis quilos por ano, a Europa consumo quatorze quilos por ano, o Japão consumo dezesseis quilos por ano e os EUA consomem vinte e quatro quilos de tissue por ano por pessoa. Você vê que tem muito espaço ainda para crescimento da demanda por tissue na China.

Por fim, para terminar, a China tem muita celulose, sendo que é da celulose que não é de madeira, mas de bambu, de bagaço são fábricas muito antigas e muito poluentes. Outro fator que vai continuar contribuindo para que a demanda da China para a celulose continue em crescimento é o fechamento dessas capacidades, que são muito poluentes e que o governo tem feito um estímulo para que elas sejam fechadas. Com isso, você tem boas perspectivas.

Só para ser ter uma ideia, nos seis primeiros meses desse ano, a demanda na China já cresceu 20%. Mas você acha que nas outras regiões do mundo não está crescendo? A Europa cresceu 4% e a América do Norte cresceu 12% na demanda de celulose somente nos seis primeiros meses desse ano.

RB- A crise econômica de 2008 afetou de modo avassalador a antiga Aracruz. Nesse sentido, como foi esse processo de reabilitação da empresa?

GC – O processo é uma receita muito comum nessas situações. Acho que a primeira medida que a empresa toma nesses momentos são vendas de ativos. A empresa vendeu com a IBA, pra CNPC, que era uma planta de celulose no Rio Grande do Sul, vendeu as empresas de papel que tinha. A Fibria também tinha plantas de papel. Vendeu florestas e vendemos terras. Todo esse dinheiro arrecadado foi usado para pagar a dívida. A gente também fez uma capitalização.

Eu entrei na companhia em fevereiro de 2012, em abril de 2012, dois meses depois, saímos para um aumento de capital via emissão de ações, que foi um sucesso e a gente também ajudou a capitalizar a companhia de novo, usando esses recursos para pagar a dívida. A gente também renegociou os limites de endividamento que os bancos permitem que a empresa tome de dívida. Esses limites eram de três e meio, mas medidos no balaço em reais.

A gente renegociou esses limites para 4,5 vezes, mas olhando os limites medidos em dólares. Ou seja, quando você tinha a dívida sobre Ebitda em reais, sempre que o câmbio do final de período era muito diferente da média dos últimos 12 meses, esse indicador de dívida líquida sobre Ebitda tendia a subir muito rapidamente, por uma questão simplesmente contábil. Quando a gente muda esse indicador usando tanto a dívida em dólar, quanto o Ebitda em dólar, você não tem mais esse efeito nefasto da diferença de câmbio de ponta com câmbio de média.

Então isso dá uma estabilidade e uma segurança melhor para a companhia de que ela não vai ter seus limites estourados simplesmente por uma questão contábil. Quando você começa a fazer tudo isso ao mesmo tempo, você melhora muito a condição de crédito da companhia e aí a gente começou a trocar dívidas caras por dívidas baratas. Ou seja, a gente tinha dívidas que pagavam cupom de 9,75% ao ano em dólar. 7,75, 6,5, 6,75%… Então a gente veio pagando sempre da dívida mais cara para a mais barata, até que a gente chegou em um momento em que todas as nossas dívidas ficaram eficientes. Ou seja, todas as dívidas bastante.

Quando você tem, também, obviamente, a gente controlou custos e investimentos e quando você faz isso, você cria um círculo virtuoso para a empresa. Ou seja, eu pagava dívida cara, diminuía minha despesa financeira, com isso gerava mais caixa no momento seguinte, com mais caixa eu podia pagar mais dívida, minha dívida ficava mais barata, minha despesa financeira caia ainda mais… Ou seja, você cria um círculo virtuoso, que foi o que a gente passou. A empresa saiu de uma alavancagem de 7,5 vezes dívida líquida Ebitda para uma alavancagem no segundo tri passado de 1,9 vezes.

Obviamente, o câmbio e o preço da celulose ajudaram, mas eu diria que foi principalmente todo esse esforço feito pela empresa toda para que a gente revirasse esse jogo e chegasse na situação de solidez financeira que a gente se encontra hoje.

RB – Atualmente, como se dá a influência dessa parte financeira no modelo de negócio?

GC – O negócio de celulose é uma indústria de capital intensivo. Toda a indústria que é capital intensivo, que você investe em máquinas, equipamentos, em plantas… É sempre importante você ter acesso ao mercado de capitais de longo prazo a custos competitivos. Caso contrário, a equação financeira não vai funcionar, daí a importância da área financeira e de você ter acesso ao mercado de capitais a custos competitivos para que os seus investimentos tenham o retorno e o payback necessários para remunerar bem o nosso acionista.

RB – Como as características do setor florestal brasileiro, que tem anunciado investimentos para os próximos anos, são importantes para o destacamento da Fibria no âmbito internacional?

GC – Bom, o Brasil tem uma vantagem competitiva que é basicamente a incidência de luz solar e água. Isso faz com que as árvores de eucalipto do Brasil cresçam em 5 anos e meio, 6 anos e já estejam em uma idade de corte. Isso dá uma competitividade ímpar para a indústria nacional no setor de celulose basicamente porque 43% do custo da celulose é madeira. Como a produtividade florestal no Brasil é muito grande, isso dá uma competitividade para que o Brasil seja, de fato, líder em celulose de eucalipto.

Acho que o único país do mundo que tem condições climáticas que poderiam competir com as do Brasil, nesse sentido, é a Indonésia, só que a Indonésia ainda está mais atrasada, porque passou muito tempo fabricando celulose com floresta nativa. Ao contrário, a Fibria, desde os anos 60 e 70 que a gente vem investindo em melhoramento de clones para chegar nessa produtividade que a gente está hoje. Eu diria que a Indonésia está pelo menos 10 anos atrasada em relação ao Brasil no desenvolvimento clonal. O movimento é inexorável para essa indústria. É uma migração das plantas do hemisfério norte, basicamente Europa, Estados Unidos e Canadá, para a América Latina e a Indonésia. Isso é um movimento que vê, ou seja, plantas fechando. A gente acabou de ver plantas fechando na Espanha, por exemplo, a Ence, a Old Town, nos Estados Unidos, e assim por diante. Ou seja, um movimento de fechamento de fábricas nessas regiões e abertura de novas capacidades no Brasil, na Indonésia e Uruguai também.

RB – Como a operação pretende consolidar a sua expansão daqui para frente.

GC – Basicamente, a gente tem o projeto H2, que a gente vai passar para uma empresa de 5,3 milhões de toneladas para uma empresa de sete milhões de toneladas e a gente também acabou de fechar um acordo comercial com a Klabin, que a gente vai comercializar a celulose produzida pelo projeto Puma, da Klabin. Ou seja, com isso, a Fibria vai passar a comercializar oito milhões de toneladas, mais do que o dobro do segundo colocado. Basicamente, a gente vai virar o que a gente chama de indisputable leader nesse setor, ou seja, um líder absoluto. Continuando sendo o menor cast cost do mundo e ampliando a diferença do nosso cast cost para o segundo colocado em termos de cast cost. Ou seja, daqui para frente eu diria que os melhores projetos continuarão sendo da Fibria.

Se hoje o melhor projeto do mundo é o projeto de Três Lagoas, o Horizonte 2, eu diria que o segundo melhor projeto do mundo é o de Veracel 2. Como eu falei, a Fibria vai estar com balanço muito forte para continuar fazendo essas expansões. Como você mesmo citou, por exemplo, o problema dos derivativos na pergunta anterior, eu diria que o problema de derivativos que ocorreu com a Aracruz abriu uma porta para que outros players entrassem temporariamente, ou seja, em um espaço de tempo. Não tivesse acontecido o problema de derivativos, nosso projeto Horizonte 2 teria sido feito antes do Eldorado, por exemplo.

A gente não teria vendido Guaíba para CNPC. Ou seja, eu diria que abriu-se uma porta para novos entrantes, mas que agora a empresa está com balanço suficiente e forte, está com cast cost mais competitivo e está com a maior produção do mundo. Ou seja, para continuar sendo líder e continuar sendo de onde provavelmente vai vir o crescimento desse setor.

RB – Como os investidores têm percebido esse momento da Fibria, em específico, da fabricação de celulose, de um modo geral?

GC – Eu acho que o primeiro sinal do reconhecimento disso aí foi o investment rate que a gente ganhou da Standard & Poor’s, mas principalmente pelo nosso spread de crédito, ou seja, a taxa de juros que a gente paga nas nossas dívidas. Hoje, estamos entre os três melhores spreads do Brasil, se você olhar por esse indicador. Em alguns momentos, somos o melhor spread de crédito do Brasil no setor privado. Só perdendo para o spread soberano do governo brasileiro, mas que estamos com uma diferença de em torno de só 20 do título soberano. Ou seja, é uma posição de crédito muito boa.

O nosso bond está pagando uma taxa de juros em torno de 5,2% para um de 2,2% de 10 anos. Ou seja, um spread de crédito de 3%. Só para se ter uma ideia, há três anos, esse mesmo spread de crédito estava em 12%. Em três anos, o nosso spread de crédito saiu de 12% para 3%. Ou seja, quem tinha investido seu capital em um título de renda fixa da Fibria, mais do que dobrou seu capital, e no mercado acionário também. Se você olhar no último ano, em 12 meses nossa ação praticamente dobrou de preço. Essa maneira que eu acho que teve o reconhecimento do mercado para todo esse esforço e para toda essa situação benéfica que estamos vivendo.

RB – De que modo a alta do dólar tem ajudado a estimular esse momento favorável que a empresa vive? É mais interessante para vocês?

GC – Para nós, que somos exportadores, quanto maior o dólar melhor, por quê? Porque 100% da nossa receita é em dólares. Exportamos 95% da nossa produção e mesmo o percentual que destinamos ao mercado interno também é cotado em dólar. Por outro lado, 85% dos nossos custos são em reais e 80% dos nossos investimentos, são em reais também. Então 85% dos custos em reais, 80% dos investimentos em reais e 100% da receita em dólar.

Isso significa que quando o câmbio se desvaloriza, a minha margem aumenta e meu fluxo de caixa e minha geração de caixa aumenta muito também. Para se ter uma ideia, mais ou menos, para cada 5% de desvalorização cambial, meu fluxo de caixa livre aumenta em torno de 500 milhões de reais. Ou seja, para nós, exportadores, e dado que a nossa alavancagem está baixa, nossa dívida em dólar, proporcionalmente, a nossa receita diminuiu bastante. Ou seja, quanto maior o dólar, realmente, maior vai ser a minha geração de caixa.

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.