Criptomoedas caem após nova proibição da China, mas analistas veem impacto reduzido desta vez

Analistas avaliam que com menos posições alavancadas e com uma notícia que não chega a ser novidade, pressão não deve durar muito

Rodrigo Tolotti Paulo Barros

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SÃO PAULO – Após alguns dias tentando se recuperar do choque de segunda-feira por conta da crise da imobiliária Evergrande, o mercado de criptomoedas voltou a sofrer um baque nesta sexta-feira (24) após o governo da China declarar que todas as transações com moedas digitais são ilegais e devem ser proibidas.

Segundo o Banco Popular da China (PBOC, na sigla em inglês), todas as criptomoedas, incluindo Bitcoin (BTC) e a stablecoin Tether (USDT), não são moedas fiduciárias e não podem circular no mercado.

O BC chinês foi além e determinou que todas as transações com criptoativos, incluindo serviços prestados por exchanges de fora da China passam a ser consideradas atividades ilícitas se realizadas por cidadãos chineses. Os funcionários dessas corretoras poderão ser investigados.

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Além disso, empresas de varejo eletrônico como Alibaba não poderão prestar nenhum serviço relacionado a essas moedas. Na prática, isso quer dizer que nenhum dos 1,4 bilhão de habitantes do país asiático poderá, legalmente, negociar criptomoedas, ainda que faça isso em exchanges de outros países.

Dez agências, incluindo banco central, reguladores bancários, de valores mobiliários e de câmbio, prometeram trabalhar juntas para erradicar a atividade “ilegal” de criptomoeda, a primeira vez que as agências uniram forças para proibir explicitamente todas as atividades com criptomoedas.

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A notícia levou a uma nova queda generalizada dos preços, com o Bitcoin caindo abaixo de US$ 42 mil, após chegar a tocar na marca de US$ 45 mil durante a madrugada. Por volta das 11h50 (horário de Brasília), a maior moeda digital do mundo recuava 3,5% no acumulado de 24 horas, cotada a US$ 42.536.

O Ethereum (ETH) e a Binance Coin (BNB) sofrem um impacto maior, perdendo cerca de 7% de valor, cotadas respectivamente a US$ 2.916 e US$ 354.

Dentre as 10 maiores criptomoedas em valor de mercado, o melhor desempenho no fim desta manhã era da Cardano (ADA), que opera praticamente estável, cotada a US$ 2,24.

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Impacto negativo não deve durar

Analistas ouvidos pelo InfoMoney avaliam que essa notícia não chega a ser uma “bomba” no mercado, já que nos últimos anos tem sido comum a China anunciar algum tipo de banimento ou ação contra o mercado de moedas digitais. Mesmo assim, a notícia de hoje foi o sinal mais claro que o país já deu de sua determinação em reprimir o setor.

“Já não causa surpresa as restrições impostas ao mercado, mas acaba aumentando o ruído em um momento de maior aversão ao risco”, afirma Safiri Félix, diretor de produtos e parcerias da Transfero.

Vale lembrar que na última segunda, todas as criptomoedas sofreram com quedas que chegaram a superar dois dígitos, acompanhando o mercado tradicional, com o choque da Evergrande na China. E mesmo com a recuperação nos últimos dias, a visão é que o mercado segue sensível e com um nível maior de aversão ao risco.

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Félix destaca também que havia um nível bem menor de alavancagem no mercado quando a notícia saiu, diferente do que ocorreu em maio, por exemplo, quando a China baniu mineradores do país, derrubando os preços das criptomoedas. “Por isso eu não acredito em uma correção muito drástica agora”, afirma.

Leia também: Alavancagem com Bitcoin prejudica preços e faz um “desserviço” ao mercado de criptomoedas, avaliam especialistas

Rocelo Lopes, especialista em blockchain e criptoeconomia, complementa ainda dizendo que olhando os preços até o momento, é possível perceber que não houve um reflexo tão forte quanto se imaginava. “O mundo já entendeu que a China pode ter um impacto [nos preços], mas esse impacto chinês já não é tão grande assim”, afirma.

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Além disso, Lopes acredita que quando houve a proibição da mineração no país, no primeiro semestre, o mercado já conseguiu absorver a maior parte do impacto de ações como essa.

Uma coisa que está claro é que todas as instituições e bancos na China já eram contra cripto na China então não é nada de novo ou diferente.

Já a equipe da Levante lembra que a tentativa da China de banir as criptomoedas também é uma estratégia do país para abrir espaço para o renminbi digital, a cripto oficial do governo local. “Essa moeda digital oficial é a grande aposta de Pequim para internacionalizar o mercado financeiro chinês”, explicam os analistas.

“A China não está isolada nesse caminho. Nos últimos meses, diversas autoridades fiscais e do mercado de capitais dos Estados Unidos têm defendido um aumento na fiscalização e a imposição de controles e até mesmo restrições. Essas mudanças devem agitar o mercado de criptoativos ao longo dos próximos dias”, completa a Levante.

Outro ponto importante para o investidor ter em vista é que, hoje, a maioria dos chineses usa mais o Tether do que o próprio Bitcoin por conta de seu lastro no dólar americano.

Segundo Lopes, isso se dá porque existem muitos chineses que querem fazer remessa para o exterior e não querem sofrer com o controle governamental, então eles usam o Tethter para ter o próprio controle ou conseguir manter os ativos em exchanges no exterior.

Bruno Sousa, Diretor Jurídico e de Compliance da Hashdex, ressalta que a nova onda de restrições está inserida em um contexto mais amplo de repressão. “A gente está em um momento de restrição grande na emissão de passaportes, de recrudescimento de liberdades. É razoável achar que [a política de repressão chinesa contra criptos] vai continuar nessa linha”.

Por outro lado, Sousa lembra que o cidadão chinês que deseja driblar o bloqueio ainda poderá usar VPN ou acessar o mercado P2P, de comercialização direta entre indivíduos, que estaria fora do controle direto do governo. Nesse sentido, o impacto esperado pela medida anunciada hoje geraria muito menos incertezas do que as de maio deste ano.

“A gente já viu tentativas de bloqueio que acabaram não funcionando, então vai ser interessante observar, mas [o comunicado] não deve ser tomado como algo que muda fundamentalmente o estado do mercado de cripto”, explica.

Theodoro Fleury, gestor da QR Asset Management, enxerga ainda a possibilidade de o governo chinês ter a intenção de criar um factoide para desviar a atenção do caso Evergrande. Desse modo, ele acredita que é importante observar a seriedade dos chineses em relação ao que foi declarado hoje para saber o rumo do mercado cripto.

O que esperar do preço do Bitcoin

Desde 2013, essa é a sétima vez que a China anuncia algum tipo de banimento em relação ao mercado de criptomoedas, mas em todas as vezes, apesar de um choque inicial, o preço do Bitcoin fechou o ano com valorização, em uma indicação que esse tipo de decisão não afeta os fundamentos da moeda digital, que tende a se recuperar no médio e longo prazo.

Em 2021, até o momento, a criptomoeda acumula alta de cerca de 43%, o que ainda está bem abaixo de outros pares, como o Ethereum, que sobe 290% este ano.

Segundo Félix, apesar do momento de maior tensão, é fundamental que o Bitcoin encerre este mês acima de US$ 40 mil, o que ajudaria a sustentar uma possível arrancada mais forte até o final do ano.

Há uma grande expectativa de que em outubro seja aprovado nos EUA o primeiro fundo de índice (ETF) de Bitcoin do país, o que ajudaria a impulsionar os preços já que é um passo importante para uma maior adoção da criptomoeda no mundo, principalmente de investidores institucionais.

Se ocorrer a aprovação no próximo mês, alguns especialistas acreditam que ainda este ano o Bitcoin pode renovar sua máxima histórica, atingida em abril passado, de cerca de US$ 64 mil.

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Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.