Contratos, registros públicos e terceiros

Artigo trata de questões pontuais sobre o registro de instrumentos particulares e seus efeitos. Confira!

Equipe InfoMoney

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Preocupa-nos uma questão pontual, muitas vezes não observada no cotidiano, tanto por particulares quanto por empresas, referente ao registro de instrumentos particulares no Registro Público. Agiganta-se nossa preocupação frente a diversos julgados que temos acompanhado perante nossos Tribunais. Trata-se do entendimento de que terceiros não podem ser prejudicados pela falta de tal registro, melhor dizendo, que a terceiros alheios à relação contratual não podem ser opostas exceções sem a observância dos devidos preceitos legais.

Introdutoriamente lembramos, especialmente no tocante às práticas empresariais modernas, que exigem agilidade, prontidão, produtividade, rentabilidade e muitas vezes até boas doses de criatividade para vencer a concorrência diária e conjugar esforços frente à sempre crescente carga tributária. Neste sentido, muitas empresas buscam, dentro da legalidade, com o instrumental jurídico posto à disposição, notadamente para o caso em tela, aqueles contratuais, trabalhar as melhores formas de integração e empreendedorismo, dado o impacto fiscal tributário e as alternativas.

Nesta esteira, em tais situações, muitas vezes, internamente em grupos econômicos, ou mediante efetiva terceirização de contratações, empresas alocam máquinas e equipamentos para a consecução de determinadas atividades. Ocorre que neste momento, a propriedade e posse dos bens são separados, ou seja, o proprietário, mediante válido instrumento contratual, por exemplo, cede em comodato ou loca determinado bem para outra empresa, que passará a ter a posse do mesmo e que deverá utilizá-lo para um fim empresarial específico.

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A questão, colocada em perspectiva, envolve a conjunção de dois artigos do Código Civil brasileiro vigente em face dos contratos típicos (ou até mesmo atípicos), por ele autorizados ou expressamente individualizados. Tais artigos são o art. 1.209 e o art. 221. O primeiro refere-se à posse e estabelece que a posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a das coisas móveis que nele estiverem, enquanto o segundo determina que os efeitos dos instrumentos particulares, bem como os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público.

Ora, vejamos um exemplo amplo, na qual uma determinada empresa “A” possui dívidas de naturezas diversas, mas mantêm suas operações na tentativa de adimplir com suas obrigações, valendo-se, neste caso, de bens tomados em locações e/ou comodato de uma empresa “B”. Neste caso, a relação pode estar perfeita e juridicamente válida com suporte em documento particular firmado entre as partes, mas tal contrato não foi levado a registro público. Caso algum credor ingresse com medida judicial visando cobrar a dívida da empresa “A”, na fase de execução deste processo, ou em momento de eventual penhora de bens judicialmente determinada, a diligência irá encontrar os bens na posse de “A” os bens de “B”, considerando estarem na propriedade da executada, ou seja, nos termos do art. 1.209 existirá a presunção de que estes bens pertençam a “A”, naturalmente até prova em contrário.

O problema surge exatamente nesta prova em contrário. O art. 221, exatamente alocado em nosso Código Civil, na parte referente à prova, determina que o instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na livre disposição e administração de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor. Mas para que possa ser oposto contra terceiros, visando fazer valer seus efeitos, é necessário que o documento esteja registrado no registro público. E tal providência não vemos ser observada no cotidiano de diversas empresas.

Neste ponto, citamos, a título meramente exemplificativo, acórdão do da Sexta Turma do Tribunal Regional do Trabalho – TRT 3ª Região, processo nº 01017-2008-008-03-00-4 AP, cuja juíza relatora foi a Dra. Maria Cristina D. Caixeta. Nesta decisão, envolvendo a questão de penhora que incidiu sobre bem móvel de propriedade de terceiros, tendo sido este bem dado em regime de comodato, o Tribunal entendeu que para que o contrato de comodato seja válido perante terceiros, deve haver registro público.

Lembramos, ainda, os dispositivos da Lei nº 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), que em seu art. 127, I e VIII, estabelece que no Registro de Títulos e Documentos será feita a transcrição dos (i) instrumentos particulares, para a prova das obrigações convencionais de qualquer valor e (ii) facultativo, de quaisquer documentos, para sua conservação. Não obstante, entendemos que é exemplificativa a listagem do artigo art. 129 do referido diploma legal, especialmente em função da previsão de seu artigo anterior 128, I e VII, e por forma, ainda mais, do art. 221 do Código Civil de 2002. Entendendo-se exemplificativa a referida listagem, importa a observância do disposto no art. 130, que fixa o prazo de vinte dias da data da assinatura do documento para levá-lo a registro, produzindo efeitos a partir da data da apresentação.

Importante, ainda, reforçar os artigos 16 e 17 da Lei dos Registros Públicos, em função da garantia dada ao registro decorrente do princípio da publicidade, permitindo, ainda, que qualquer pessoa possa requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido.

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Desta feita, como já indicamos, em função de diversos julgados que tivemos acesso em nossas recentes pesquisas, reforçamos o entendimento de que no curso das atividades empresariais, aliadas às medidas tradicionais de negociação e checagem que naturalmente ocorre entre as partes envolvidas em determinadas contratações, é importante que as devidas formalidades legais sejam observadas com o intuito de preservar os direitos das contratantes, oferecendo a terceiros a justificativa e fundamentação legal para que seja possível a eles opor todo e qualquer direito atinente a propriedade de máquinas e equipamentos.

Luís Rodolfo Cruz e Creuz, advogado em São Paulo, Sócio de Creuz e Villarreal Advogados Associados.