Colunista InfoMoney: o namoro acabou

Tensão na Zona do Euro começa a prejudicar otimismo; desempenho fraco dos mercados na América Latina em 2010 não reflete resultados corporativos

Gil Deschatre

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A tensão em torno da situação fiscal da Zona do Euro começou a prejudicar fortemente o otimismo global recente. Cresceu o temor de que outros países europeus, como Espanha, Portugal e Itália, passassem a seguir os passos da Grécia.

Os CDSs (Credit Default Swaps) dos títulos de dívida de Portugal, Espanha e Itália  mostraram nitidamente que o mercado teme que estes países se juntem à Grécia em um pedido de socorro, o que foi confirmado pela forte ajuda da Comunidade Européia.

Nesse sentido, nos EUA, os Treasuries viram forte aumento em sua demanda, com os yields atingindo as mínimas desde julho. Na contrapartida, o euro atingiu mínima após mínima frente ao dólar desde março de 2009 na semana que passou.

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O mundo está vendo o início de um segundo salvamento de bancos em dois anos e, desta vez, são bancos vinculados à atividade soberana de cada país, o que é pior.

Para complicar a situação, surgiram nos mercados globais um boato (entre as centenas que os operadores financeiros espalham diariamente) de que estava em preparação uma ajuda ainda mais portentosa, desta vez para a Espanha, no valor de 280 bilhões, mais de duas vezes e meia o que foi prometido à Grécia.

“É uma absoluta loucura”, reagiu o presidente do governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, forçado, justamente pela “loucura”, a passar todo o tempo de uma entrevista coletiva a defender a solvência de seu país.

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Não adianta: o rumor mais o fato (real) de que as economias europeias estão excessivamente endividadas mais a notícia de que a produção industrial chinesa estava aumentando no menor ritmo em seis meses – tudo isso levou ao vendaval que as bolsas da enfrentam. A grande reestruturação do auxílio formalizado confirmou o que os participantes previam uma situação pelo menos delicada.

“No meio do tumulto,
há notícias boas
no Brasil para se
comemorar”

Um fato agravante a mais para alimentar a fábrica de boatos seria o discurso da agência de classificação de risco Moody´s, que teria revelado que a crise gerada pela dívida da Grécia poderia se disseminar e afetar o sistema bancário de outros países, como Espanha, Irlanda, Itália, Portugal e Reino Unido.

Portanto, a fala feita pelo presidente do BCE (Banco Central Europeu) Jean-Claude Trichet, tentando diferenciar a situação vivida pela Grécia da Espanha e de Portugal, não conseguiu acalmar os agentes. As medidas atuais serviram para acalmar os ânimos dos mais exaltados, mas o fantasma do pior pela proa ainda persiste.

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Além disso, embora o Parlamento grego tenha conseguido aprovar as medidas para tentar ajustar as finanças públicas do país, as manifestações da população do país continuaram e as indefinições prosseguem a todo vapor.
   
Já no continente americano, houve uma reação negativa à aprovação do Senado a uma emenda ao projeto de reforma financeira em curso no país. O Congresso aprovou uma proposta que permitirá a pequenos bancos pagar uma contribuição menor para o FDIC (Federal Deposit Insurance Corp), o fundo garantidor de depósitos do sistema bancário dos Estados Unidos. Esse fundo assegura a devolução de depósitos de até US$ 250 mil no caso de falência da instituição financeira.

A mudança obrigaria o FDIC a fixar o valor das contribuições com base nos riscos assumidos pelos bancos – uma fórmula que, na prática, faria as instituições maiores pagar uma quantia mais elevada.

E, neste ambiente de tensão, a situação nas bolsas americanas pode ter sido agravada pelas negociações via computador, cujos sistemas estão programados para venderem as ações quando elas chegam a um patamar baixo específico. Muitos especialistas criticam que o sistema, chamado “stop loss”, sem intervenção humana, aprofunde a queda nas bolsas.

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O operador da corretora Geraldo Corrêa, Marcelo Mattos, afirma que o mercado chegou a questionar a possibilidade de falhas técnicas na plataforma de negócios diante da dificuldade em se identificar os motivos que levaram o Dow Jones a, repentinamente, cair mais de 9% em Nova York. Até agora, ninguém conseguiu explicar direito o que ocorreu, mas tal potencialidade num momento de crise começa a deixar os players de cabelo em pé!

Segundo ele, o tombo do mercado foi resultado de sucessivos movimentos de “stop loss”, mas as notícias sobre maior taxação a bancos americanos podem ter determinado o viés negativo do dia. “Isso traz preocupações sobre a rentabilidade do sistema financeiro”, aponta.

Por aqui, ainda temos boas notícias a comemorar, no meio do tumulto. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou uma série de medidas a fim de incentivar as exportações de empresas do País.

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Entre as ações, estão a redução do custo de financiamento às exportações de bens de consumo, com uma linha de R$ 7 bilhões, e a criação de um Fundo Garantidor de Comércio Exterior.

O desempenho modesto dos mercados da América Latina em 2010 – abaixo dos mercados desenvolvidos e dos mercados emergentes globais – não reflete adequadamente as significantes melhorias potencializadas para os resultados corporativos da região.

A análise, do Santander, consta em relatório assinado pelo analista Cristián Moreno, que se revela otimista para os próximos meses. De acordo com o analista, “os mercados emergentes continuam no mesmo nível (de crescimento)” observado pelo banco em março, enquanto os dados que servem como drivers – como preços de commodities e crescimento econômico – continuam a melhorar.

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“Isto nos leva a reforçar nossa visão positiva para as ações dos mercados da AL”, completou Moreno. De acordo com ele, os mercados da região deverão ter crescimento de 26,6% este ano.

Finalmente, o crescimento acumulado na produção industrial brasileira no primeiro trimestre deste ano foi de 18,1%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que divulgou ontem o resultado da Pesquisa Industrial Mensal Produção Física – Brasil, fato realmente alvissareiro por aqui.

Com todo esse sangue nas calçadas, os analistas gráficos trataram logo de se debruçar em seus estudos e avaliaram que a atual força vendedora ainda tem fôlego para mais estragos e mesmo com a atual reação, os mais afoitos já deixaram claro que o mercado só fica calmo depois de ter chegado nas proximidades dos 52.000 pontos do Ibovespa. A conferir.

Gil Ari Deschatre é professor da FGV e do Ibmec e escreve mensalmente na InfoMoney.
gil.deschatre@infomoney.com.br