Colunista InfoMoney: O G-20 e o retorno do FMI

Com a cúpula do G-20, afirmou-se que o FMI terá um papel mais atuante de tentar regular o mercado financeiro global, avaliar os riscos e alertar demasias

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Na última semana, foi realizada a cúpula do G-20 em Pittsburgh, EUA. Como já esperado, não saiu nada de muito concreto que traga à tona resoluções de problemas estruturais na economia global, como a questão do déficit americano, ou o aquecimento global – embora tenham sido discutidos. Contudo, foi desenhada uma reforma do sistema financeiro internacional e o FMI, uma instituição que se encontrava em crise existencial até pouco tempo atrás, ganhou um novo papel no cenário global.

Até mesmo antes do estopim da crise, já se discutia uma reforma do sistema financeiro global. A forma de atuação dos bancos, altamente livres, com ramificações em todo o globo, favoreceu o contágio rápido. Em paralelo com a gripe suína, realmente as distâncias no globo estão cada vez mais curtas: contágio em uma velocidade sem precedentes.

Não que a livre circulação de capital seja algo ruim para economia. Um modelo teórico econômico famosíssimo, o Modelo de Solow-Swan, afirma que as economias tendem a chegar a um estado estacionário. Este seria um estágio em que se usariam todos os fatores de produção (capital e trabalho) e tecnológicos, ao passo de que a taxas de crescimento tenderiam a ser menores e estáveis. Transpondo para a realidade, esses são os países desenvolvidos, em que as taxas de crescimento são pequenas se comparadas às taxas das economias emergentes. Porém, mais estáveis.

“O FMI, que se encontrava em crise existencial, ganhou novo papel no cenário”

De certa forma, a ideia é bem intuitiva. Imagine a construção de uma grande empresa em um país miserável e pequeno. A própria construção dessa planta já traria uma grande impacto no PIB desse país fictício. Já no caso de um país desenvolvido, com várias plantas semelhantes já instaladas, esse impacto seria muito pequeno. Dessa forma, observamos que os retornos nesse país, onde há muito a se fazer, tendem a ser maiores do que nos países já desenvolvidos. Obviamente, o risco (de ter ou não prejuízo) tende a ser maior também; o que casa com a ideia, pelo lado das finanças, de que quanto maior o retorno, maior o risco.

O mercado financeiro global exerce um papel importante na transmissão de quem tem capital. Porém, poucas oportunidades de investimento para quem tem oportunidades sem capital. E isso foi o que se observou ao longo da história do capitalismo. Assim, o mercado financeiro corresponde a um intermediário, ao mercado de crédito global. O Brasil, por exemplo, não é capaz de fazer poupança doméstica, que se traduziria em investimentos (desenvolvimento). Não somos capazes, porque as sucessivas administrações públicas não optaram por esse caminho e continuam não optando – é só observar o aumento dos gastos do governo com despesas correntes. Por isso, dependemos da poupança externa, do capital de outros países, para os investimentos nacionais, em ampliação de novas fábricas, por exemplo.

Contudo, o mercado financeiro é constituído por seres humanos, passíveis de falha, objetivando a cada ano um bônus maior do que o do ano anterior. Assim, em busca do “ouro”, arriscaram demais. Mas vale dizer que o governo norte-americano teve o seu papel nos estímulos: uma exuberância de liquidez provocada por um longo período de taxas de juro muito baixas. Neste contexto, a avaliação de risco não avaliava nada na verdade.

Com a cúpula do G-20, afirmou-se que o FMI terá um papel mais atuante de tentar regular o mercado financeiro global, avaliar os riscos e alertar quando esses estiverem crescendo em demasia. Sem dúvida é uma tentativa de pelo menos atestar à sociedade de que algo pretende ser feito. Ao mesmo tempo em que resgata o FMI como importante organismo internacional.

Mas a aplicação será gradual. Espera-se que só no final de 2012 seja concluída. Até lá, não poderemos ver um mercado de crédito pujante. Creio até que dificilmente veremos um mercado de crédito conforme vimos nos últimos anos. Mesmo porque ele terá limites impostos e vigiados pelo FMI. Mas e outras peças da economia global, tais como os países, os bancos centrais, suas políticas econômicas, seus problemas estruturais? Isso não ficou acertado no G-20, foi só mencionado.

Raphael Castro é economista e escreve mensalmente na InfoMoney, às quartas-feiras.
raphael.castro@infomoney.com.br