Colunista InfoMoney: Encolhimento do comércio mundial em discurso

Aumento de déficit fiscal, alargamento da dívida pública e discursos com tons protecionistas são heranças da crise financeira

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O mês de janeiro de 2010 não veio como prometido. A crise ainda se manifesta e não vemos o cenário internacional vislumbrado no ano anterior.

Constata-se e se colhe as heranças da crise: aumento de déficit fiscal em economias desenvolvidas, alargamento da dívida pública e discursos com tons protecionistas.

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Não que em parte não era previsto, contudo mais uma vez a recuperação em curso se mostrou menos empolgante do que se imaginava.

O Forúm de Davos, o discurso de Obama (presidente americano) ao Estado da União e o mau humor do mercado financeiro nos últimos dias desenham um novo cenário nada animador para o comercio mundial no médio prazo. E se o comércio não tende a ganhar a velocidade de outrora, o que dirá a sonhada recuperação de um ano atrás. 

Comecemos pelo mercado financeiro, mas passando em parte pelo que foi discutido no fórum. A questão agora é a Europa. As miras dos analistas estão voltadas à situação fiscal de parte dos integrantes da União Européia. Muito fora do compromisso de possuir 3% de déficit fiscal, alguns países membros estão em séria situação: tem uma dívida pública elevadíssima (chegando a quase 100% do PIB), déficit fiscal que chega a ser mais que o dobro do acordado e principalmente atividade econômica ainda muito abalada pela crise (desemprego elevado).

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Ou seja, sem boas e iminentes perspectivas de retornar ao passo pré-crise.  O destaque é a Grécia. Sem embargo, entraram no mesmo time: Portugal, Espanha, Irlanda e Itália. Nos últimos dias o risco desses países, medido pelo CDS (Credit Default Swap), era maior que o do Brasil. No caso da Grécia, beirava os 400 pontos. O nosso girava em torno de 150 pontos.

“Como os problemas
serão resolvidos sem
a ajuda do comércio
internacional?”

Se o que aflige no momento o mercado financeiro vem da Europa, todos correm para um país não menos devedor, mas em que todos acreditam. O dólar se valorizou nos últimos dias. Neste meio tempo o presidente Obama proferiu o discurso do Estado da União. Viu-se uma mudança de rota no discurso em relação às promessas que o fizeram presidente dos EUA. Se a reforma do sistema de saúde, plataforma de campanha, era o destaque, agora a questão são os empregos norte-americanos.

Mas não era por menos. A crise deixou como sequela  a pior taxa de desemprego dos últimos 20 anos (próxima a 10%, ainda que tenha cedido para 9,7% na última leitura). Uma das saídas apontadas é o direcionamento dos esforços para a exportação, como um dos possíveis vetores a auxiliar na tarefa de preservar e criar novos postos de trabalho. Todavia, a situação da atividade econômica na UE somada à valorização, ainda que momentânea, do dólar jogam contra estas intenções.

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A questão da regulação do sistema financeiro – àquele que irriga o combalido crédito às atividades produtivas – também esteve no discurso do presidente americano e foi uníssono em Davos. Contudo, além de apontarem novamente o sistema financeiro como vilão, nada de concreto foi apresentado. Foi o que se observou já no discurso de abertura proferido por Nicolas Sarkozy, presidente da França.

Não obstante, as idéias de regulação não ficaram circunscritas ao sistema financeiro e foram apontadas também na direção do comércio internacional. O presidente francês apregoou a necessidade de adição de cláusulas sociais e ambientais às normas de comércio internacional.

Ademais, também fui uníssono em Davos, um fórum na Suíça, cuja maior parte dos integrantes está ou estive em alguma medida relacionada ao setor bancário, a pesada assertiva de que a recuperação global depende principalmente dos emergentes. Estes por sua vez, nas edições anteriores, se apresentavam como coadjuvantes e devedores.

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Nestes últimos acontecimentos que marcam o início do ano lê-se um tom protecionista e contraditório. Querem engrenar suas economias, criar empregos (salvando-se politicamente) e oferecer perspectiva de solvência para os problemas fiscais. Contudo, como serão encaminhados esses problemas sem o impulso da ampliação do comércio internacional, ao qual tanto discursaram em defesa? Por hora, fica lado.

Raphael Castro é economista e escreve mensalmente na InfoMoney.
raphael.castro@infomoney.com.br