Colunista InfoMoney: A avaliação necessária dos conselheiros

Dada a cultura latina do brasileiro e o desconforto em avaliar e ser avaliado, prática é pouco comum, mas é imprescindível e essencial

Heloisa Bedicks

O assunto não é novidade, mas volta à tona em meio às discussões sobre as responsabilidades dos conselheiros e o funcionamento dos conselhos de administração. Incluída no Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC desde sua primeira edição, em 1999, e mais bem detalhada nos processos seguintes de revisão, principalmente nesta última edição de 2009, a Avaliação de Conselhos reflete a grande preocupação de como são tomadas as decisões por seus membros e a dinâmica dos relacionamentos e processos.

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Ainda pouco praticado no Brasil, apenas 21,3% de 85 empresas respondentes, entre a amostra de 300 de controle nacional, com faturamento acima de R$ 200 milhões, possuem algum tipo de mecanismo formal e periódico de avaliação de conselho. Dados estes obtidos neste ano em pesquisa sobre o Panorama da Governança Corporativa pelo Instituto em parceria com a Booz & Company. Realidade bem distinta da verificada nos EUA, Canadá e Europa, em que 91% das empresas da América do Norte e 84% das estabelecidas no Reino Unido adotam algum tipo de avaliação, segundo pesquisa da Korn/Ferry de 2008, publicada na revista Exame, em junho deste ano.

A diferença percebe-se também na abordagem do tema. No Congresso Anual da National Association of Corporate Directors (NACD), realizado na semana passada, observou-se que o debate a cerca da avaliação de conselhos está centrado na necessidade de divulgação do resultado desse processo. Enquanto no Brasil enfrentamos ainda a dificuldade na aceitação de se realizar a avaliação formal, muito devido à nossa cultura latina e ao sentimento de desconforto em avaliar e ser avaliado, no qual podem ser desvelados erros e possíveis omissões de seus integrantes; ao contrário da sinceridade cáustica dos anglo-saxões.

“Um bom processo de avaliação pode prevenir as crises”

E é justamente no aperfeiçoamento do processo de decisões no ambiente dos conselhos que a avaliação mostra seus benefícios. Dentre eles, destacam-se o auxílio aos próprios conselheiros sobre sua contribuição, interação com os seus pares, percepção de seus deveres de responsabilidade, lealdade e de fidúcia, além de obter visões mais precisas sobre potenciais melhorias e, principalmente, suprir os acionistas com informações relevantes sobre os acontecimentos internos no conselho e corroborar a decisão dos acionistas em votar ou não pela permanência desses profissionais.

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Sua prática representa uma quebra de paradigmas, na qual entram os dados mais objetivos e se enfraquece o foco excessivo nas afinidades pessoais, além de a avaliação ser um fator incomodador, porém vital à continuidade e ao aperfeiçoamento das organizações.

O processo se inicia com o comprometimento dos conselheiros de prestarem conta do mandato que lhes foi outorgado, devendo ser transparentes, dispostos a lidar com temas desconfortáveis e polêmicos e saber administrar conflitos de forma construtiva. É esperado de seus membros que tenham como qualidades na comunicação a franqueza, lisura e imparcialidade. E para ser efetiva, é preciso que seja liderada uma ação de entendimento muito clara e forte de que o conselho de administração deve adicionar valor à companhia.

A questão não deve ser mais analisar a necessidade de se adotar ou não processo de avaliação formal, mas sim qual o melhor método e como fazê-lo. Há no mercado três metodologias de avaliação mais utilizadas: a autoavaliação, a avaliação de 360º (avalia a todos e cada um é avaliado por todos) e a entrevista por profissional externo. As duas primeiras devem ser lideradas e discutidas com o presidente do conselho, ao passo que na terceira cabe ao especialista externo.

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Conforme prevê o Código do IBGC, a avaliação individual – particularmente nos aspectos de frequência, assiduidade e envolvimento/participação nas reuniões, até mesmo o nível de dispersão durante a reunião pela realização de atividades não relacionadas – é fundamental para a indicação à reeleição dos conselheiros. O Instituto recomenda ainda a realização anual da avaliação do desempenho do conselho e de cada um de seus membros, adaptando sua sistemática à situação da organização. É importante que a avaliação seja respaldada por processos formais, com escopo de atuação e qualificação bem-definidos, e cabe ao presidente do conselho a responsabilidade pela sua condução e aplicação. Também é indicado para a objetividade do processo, caso a empresa avalie como positiva, a participação de especialistas externos. Recomenda-se ainda que o processo e os resultados da avaliação sejam divulgados aos acionistas por meio de um item específico no relatório da administração.

Nota-se que a avaliação do conselho, integrada às melhores práticas, aprimora a percepção do investidor quanto à Governança do conselho de administração da organização; e os acionistas têm direito em conhecer os resultados do desempenho de seus conselheiros ao longo do ano para avaliar se o mesmo deve ou não ser reconduzido ao cargo. Acredito que um bom e sincero processo de avaliação pode prevenir as crises ou ao menos mitigar suas consequências, afinal conselheiros atentos aos seus desempenhos e interações são profissionais mais conscientes de suas responsabilidades.

Heloisa Bedicks é diretora executiva do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa e escreve bimestralmente na InfoMoney.

heloisa.bedicks@infomoney.com.br