Barrar venda da Rlam seria revés para a Petrobras e para a segurança energética do Brasil, apontam analistas da XP

Venda da refinaria na Bahia foi alvo de polêmica recente por conta do valor abaixo do esperado, mas analistas destacam importância do desinvestimento

Lara Rizério

Rlam (Divulgação: Petrobras)

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SÃO PAULO – A venda da refinaria Landulpho Alves (Rlam) pela Petrobras (PETR3;PETR4) ao Mubadala, a primeira de um plano de venda de 8 refinarias pela estatal, foi bastante questionado, principalmente por conta do seu valor.

O Tribunal de Contas da União (TCU), por sinal, tem até esta semana para avaliar uma possível suspensão da operação, questionando o valor de US$ 1,65 bilhão fechado com o Mubadala, que estaria abaixo do preço de mercado, de US$ 3,04 bilhões, definido pela própria Petrobras. A transação foi concluída em 8 de fevereiro e o Conselho da Petrobras aprovou a transação em 24 de março.

Mas o que este valor tão abaixo indica para a Petrobras? Em relatório, Gabriel Francisco e Maira Maldonado, apontaram que, a princípio, o valor também ficou abaixo do que eles esperavam, a um múltiplo implícito de 3,1 vezes o valor da empresa sobre o lucro antes juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda) para a venda do ativo, abaixo da média histórica de múltiplos que a Petrobras negocia de 5,5 vezes (e 4,9 vezes atualmente).

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Contudo, ao reexaminarem a transação com mais cautela, tanto do ponto de vista de contexto de mercado (global e local) como características da própria refinaria, avaliam que o valor final de venda possa ter refletido alguns fatores e que os levaram a revisar o valor potencial de venda dos ativos.

Eles consideram ser essencial que a venda da RLAM para o fundo de investimentos Mubadala seja aprovada apesar de qualquer eventual desapontamento em relação ao valor final da transação. “Do contrário, será um grande revés não só para a Petrobras, mas também para a segurança energética do Brasil”, afirmam.

Destacando os fatores que refletem o valor da venda de uma refinaria, os analistas ressaltam que, apesar do valor estratégico de uma refinaria em um país como o Brasil, que tem capacidade limitada de produção de derivados de petróleo para atender sua própria demanda interna, normalmente é difícil que haja um descolamento dos múltiplos de transação em relação a referências globais de empresas comparáveis listadas em bolsa. Ao olhar para as maiores empresas de refino listadas nos EUA (Valero, Philips 66, HollyFrontier Corporation e Marathon Petroleum Corporation), as suas ações negociaram historicamente na faixa de múltiplos de 5,0 vezes a 7,0 vezes o EV / EBITDA nos últimos 5 anos.

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Porém, os múltiplos de ativos em mercados emergentes (EM) normalmente apresentam um desconto em relação a mercados desenvolvidos (DM). Assim, é comum que as transações e empresas listadas em tais mercados impliquem um desconto para os mercados dos países desenvolvidos – e esse seria o caso do Brasil.

No caso específico nacional, os investidores potencialmente interessados ​​nas refinarias da Petrobras podem atribuir um prêmio de risco mais alto (ou um desconto do valor total de aquisição) ao apresentarem suas propostas.

“A razão por trás dessa visão é que a manutenção de preços domésticos de combustíveis alinhados às mudanças nos preços do petróleo bruto e câmbio é um fenômeno muito recente no Brasil, tendo começado pela primeira vez durante a gestão de Pedro Parente como CEO da Petrobras em 2016”, avaliam os analistas, ressaltando ainda que a prática de uma política de preços alinhada com referências internacionais de preços de petróleo e câmbio não ocorreu sem seus percalços, conforme observado tanto na greve dos caminhoneiros de maio de 2018, como nos eventos recentes de fevereiro de 2021 que culminaram na substituição de Roberto Castello Branco como CEO da Petrobras.

Assim, dadas as incertezas associadas à operação de uma refinaria no mercado brasileiro, os analistas avaliam que é justo assumir um desconto adicional para as refinarias da Petrobras em cerca de 10%, o que implica em um múltiplo de EV/Ebitda entre 4,1 vezes e 5,5 vezes.

Além disso, eles ressaltam que o tempo de operação de uma refinaria da Petrobras pode afetar valores finais da venda do ativo, tendo em vista que ativos mais antigos podem demandar maiores investimentos para substituição de equipamentos e manutenção pelo novo operador. Neste sentido, a RLAM é a refinaria mais antiga do Brasil, com sua data de inauguração (1950) sendo anterior até mesmo à fundação da própria Petrobras (1953).

Por fim, Francisco e Maira apontam que os investidores potencialmente interessados em comprar as refinarias da estatal deverão assumir as condições atuais de operação dos ativos, e não incorporar em suas premissas melhorias operacionais de modo a melhorar o seu risco-retorno em suas propostas.

Eles ressaltam que, em modelagem anterior para o valor de venda potencial das refinarias da Petrobras, embutiam premissas de melhoria das operações nas estimativas, como normalmente é o caso em operações de fusões e aquisições (M&A). Nesse sentido, as seguintes variáveis podem ter sido afetadas em relação a nossas expectativas anteriores: i) fatores de utilização de capacidade das refinarias; ii) margens brutas de refino (receita menos custo variável de operação, principalmente aquisição de petróleo) e iii) premissas de custos de operação (pessoal e administrativo).

Ao atualizarem as suas premissas, os analistas estimam agora um valor total entre US$ 3,53 bilhões e US$ 4,77 bilhões para as refinarias da Petrobras à venda, implicando um valor por ação potencial entre R$ 0,98 por ação e R$ 1,33 por ação (4,1% a 5,5% do valor de mercado atual da companhia, levando em consideração o fechamento das ações na quinta-feira) uma redução da relação entre dívida Líquida e EBITDA entre 0,08 vez e 0,11 vez ante o nível de 2,22 vezes reportado pela empresa no quarto trimestre de 2020.

O valor antes estimado pela XP para as vendas das refinarias era de US$ 7,9 bilhões a US$ 10,5 bilhões, já excluindo a RLAM.

Ao realizar um teste de modelagem sob novas premissas para a refinaria RLAM, os analistas estimaram valores entre US$ 1,58 bilhão e US$ 2,13 bilhões para o ativo, que englobam o valor final de transação de US$ 1,65 bilhão apresentado pelo fundo Mubadala.

Confira as novas estimativas para a venda de refinarias, segundo análise da XP investimentos: 

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Valores menores, mas importância de seguir com as vendas

Apesar da redução nas estimativas para os valores, os analistas destacam a importância do processo de venda, que vai muito além dos benefícios para a empresa e seus acionistas, como em termos de redução de endividamento e maior capacidade de distribuição de dividendos.

“Em nossa opinião, a venda das refinarias da Petrobras e a consequente redução da capacidade da estatal de formação de preços em todo o território nacional tem um significado muito maior do ponto de vista de segurança energética do Brasil no futuro. A razão por trás dessa visão é que o Brasil exigirá maiores investimentos para aumentar a capacidade local de abastecimento de combustíveis e derivados de petróleo, a fim de se evitar uma situação de escassez local de tais produtos ao longo da próxima década”, apontam Maira e Francisco.

Leia também: Petrobras anuncia elevação do preço do gás natural em 39% para distribuidoras a partir de 1 de maio

Isso porque, com base em estimativas feitas pelos analistas, o Brasil pode enfrentar escassez interna de 400 mil barris ao dia de produtos derivados de petróleo até o final da presente década de 2020-2030 (podendo ser mais cedo, a depender do crescimento da economia) devido à falta de capacidade de refino e de terminais portuários de importação de combustíveis.

“Em nossa opinião, existem duas alternativas potenciais (não mutuamente excludentes) para se evitar este cenário: (1) US$ 8,0 bilhões- US$ 9,0 bilhões em investimentos em capacidade adicional de refino ou (2) US$ 2,0 bilhões – US$ 3,0 bilhões em investimentos em capacidade adicional de terminais de importação”, afirmam. Porém, eles destacar ser fundamental que as condições do mercado local se tornem mais previsíveis a fim de viabilizar tais investimentos pelo setor privado.

Um dos principais fatores de previsibilidade é a dinâmica local de preços de combustíveis. Assim, destacam, é fundamental que a Petrobras conclua o processo de desinvestimento de 50% de sua capacidade de refino, para que a empresa perca seus poderes de monopólio e determinação de preços de combustíveis em todo o território brasileiro. Assim, os analistas consideram essencial que a venda da RLAM.

Cabe destacar que os analistas seguem com recomendação de venda para os ativos PETR3 e PETR4, com preço-alvo de R$ 24 para ambas as classes de ativos.

O Bradesco BBI, que também possui recomendação equivalente à venda para os ativos da Petrobras, destacou que o valor de venda da RLAM está abaixo de faixa de avaliação deles (de US$ 3 bilhões a 3,3 bilhões). “No entanto, em nossa opinião, o desconto está relacionado ao fato de esta ser a primeira venda de refinaria próxima de ser concluída pela Petrobras. Se o TCU decidir interromper a venda, poderia dificultar ainda mais a venda das outras sete refinarias, que já vemos como tendo um baixo chance de se materializar nesta fase”, apontam, principalmente em meio ao noticiário conturbado dos últimos meses para a companhia.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.