Entrevista: Souza Cruz confia nas marcas “premium” para enfrentar riscos do setor

Diretor de RI fala sobre campanha anti-tabaco e afirma que, até agora, fabricante de cigarros sentiu pouco a crise

Equipe InfoMoney

Publicidade

SÃO PAULO – “Um negócio perene, estável, de remuneração agressiva”. Essa é a definição de Luis Rapparini, diretor de Finanças e de Relações com Investidores da Souza Cruz (CRUZ3), para explicar a atratividade da líder nacional da indústria de cigarros na BM&F Bovespa em momentos de turbulência do mercado.
Diante das perdas fulminantes de 43% do Ibovespa desde o início do ano, os papéis da empresa, que lucrou R$ 852,4 milhões nos nove primeiros meses de 2008, exibem queda mais sóbria, de 11%. Não bastasse ser considerada defensiva, “a valorização do dólar ajuda nas receitas das exportações”, lembrou o executivo em entrevista exclusiva à InfoMoney.
Mas o foco é o Brasil. Para cumprir o objetivo de ampliar a fatia de 61,9% que detém no setor, Rapparini destacou a brecha de expansão no combate ao mercado ilegal, bem como os investimentos nas marcas “premium”. Além de opinar sobre a campanha governamental anti-tabaco e a guinada dos jovens à preocupação com a saúde. Confira:

InfoMoney – Até que ponto a empresa teme o impacto da crise na economia real?

Luis Rapparini – De alguma forma, a crise terá impacto na economia brasileira. A Souza Cruz não é imune à crise, mas tem uma resistência grande a flutuações econômicas fortes. Vamos observar o comportamento nos próximos meses e monitorar o efeito no nosso negócio. Até agora, sentimos muito pouco.
Não temos nenhum motivo ou sinal para alterar nossa política de distribuição de dividendos. Nossa política se resume em pagar todos os recursos que conseguimos gerar e não são necessários para reinvestimento do negócio. A médio prazo, a idéia é buscar pagar cerca de 100% do lucro líquido como dividendos aos acionistas.
“A legislação atual pode ser melhorada”

Qual a razão do forte avanço nas margens operacionais?

Temos que lembrar que o terceiro trimestre do ano passado foi fraco, portanto a comparação trimestral favorece o período de julho a setembro de 2008. Focando no acumulado de nove meses, o resultado é bastante positivo.
Conseguimos crescer nosso market share em 1,4 ponto percentual, atingindo 61,9% de participação de mercado. Nossas principais marcas continuam crescendo forte: Carlton, Free, Lucky Strike, Hollywood. Notamos também que, em função da maior disponibilidade de renda, nossos consumidores têm migrado para as marcas com maior valor agregado (Carlton e Free), que têm margens mais atrativas.
Além disso, a Souza Cruz sempre teve uma disciplina de custos muito forte. Conseguimos ao longo desses nove meses manter os custos sob controle, ao passo que reforçamos os investimentos em nossas marcas, seja em comunicação dos pontos de venda, seja na distribuição direta, para buscar oportunidades principalmente no interior do Brasil.
Vamos concentrar nossos esforços de marketing nas marcas de maior valor agregado. Obviamente que nossa marca principal do ponto de vista de participação de mercado, a Derby, que está comemorando 15 anos de liderança no mercado (atualmente com 28%), vai continuar recebendo recursos. Não posso divulgar números dos investimentos por razões competitivas

Como a empresa trabalha com a expectativa de novas medidas regulatórias anti-tabagismo?

Em nível mundial, há muitos anos o Brasil já tomou a liderança no que tange a medidas regulatórias para a indústria de tabaco, vide a Lei Serra de 2000 (Lei Federal 10.167/2000 de restrições na publicidade). No Brasil só podemos fazer comunicação com fumantes adultos nos pontos de venda. Maços de cigarros já consideram advertências escritas e, além disso, advertências gráficas com fotos. E já existem limitações no País onde se pode fumar e onde não se pode fumar.
No momento o que está mais em voga é a questão de fumantes e não-fumantes convivendo no mesmo ambiente. A empresa em momento algum é contra a qualquer tipo de legislação. Na nossa visão, a legislação atual pode ser melhorada através da introdução de cláusulas que deixem claro que é necessário haver separação física nas áreas de fumantes e não-fumantes.
Existem tecnologias comprovadas que permitem que ambientes fechados fisicamente possam ter exaustão adequada para garantir que a qualidade do ar seja apropriada. Vemos como uma área de oportunidade de melhoria da legislação atual a introdução de válvulas que garantam que bares e restaurantes possam ter áreas separadas e com exaustão adequada para acomodar naturalmente fumantes e não-fumantes.
Temos cerca de 28 milhões de fumantes no Brasil e eles têm os seus direitos. Obviamente a Souza Cruz suporta os direitos de seus consumidores. A legislação pode evoluir no sentido de ficar mais equilibrada, atendendo aos anseios de não-fumantes e fumantes.

Quais os drivers para a indústria de tabaco nos próximos anos?

Estamos trabalhando com um cenário positivo. À medida que a economia brasileira avança isso gera oportunidades para a indústria no que tange à capacidade dos consumidores de fumarem marcas melhores. Temos um espaço muito grande para crescer em market share e pretendemos atrair consumidores que preferem marcas da concorrência.

“Parcela grande do mercado consome produtos ilegais”

Além disso, no Brasil ainda existe uma parcela bastante grande do mercado que basicamente consome produtos pertencentes ao mercado ilegal. Hoje em dia pouco menos de 30% do mercado brasileiro de cigarros é abastecido por produtos que não necessariamente pagam os impostos e competem de forma desleal.
À medida que os governos federal e estadual reforçam suas ações de combate ao mercado ilegal, naturalmente esses consumidores virão para marcas das empresas legais. Essa é uma oportunidade de mercado.

O aumento da tendência de preocupação com a saúde por parte dos jovens piora as perspectivas?

Temos percebido uma redução da incidência de fumantes. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 19% da população brasileira adulta fuma. Esse percentual vem caindo ao longo dos últimos anos, seja em função disso ou em função das diversas campanhas que o governo vem fazendo para o combate ao tabagismo.
Independente desta redução, nosso volume vem se mantendo estável por dois grandes motivos: primeiro porque temos crescido em fatia de mercado, e também pelo fato de que a população como um todo aumenta em termos de número de pessoas. A redução da incidência é quase que totalmente compensada pelo crescimento populacional.