A Grande Arte de Temer

A corrida por cargos é vigorosa e o vice deve estar com dificuldades para operar a divisão do Estado

Francisco Petros

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Observado o debate sobre o processo de impeachment da Presidente Dilma Rousseff, há evidências relevantes de que este carece de certeza jurídica, necessária do ponto de vista constitucional, mesmo que sobrem razões econômicas para justificar o feito político que ainda está para se completar. A manutenção da presidente Dilma no poder mostrará o quão inviável é o “presidencialismo de coalizão”, nome pomposo a batizar o jogo pouco ideológico e muito fisiológico exercido pelos partidos políticos para dividir e exercer o poder que fica órfão do povo depois de emanado deste pelo voto.

A administração de Michel Temer será o novo teste deste pedestre modelo de gestão política. O preâmbulo já se mostra complexo. A corrida por cargos e posições de destaque é vigorosa e o vice-presidente deve estar com dificuldades de operar a geografia da divisão do Estado e do governo entre seus aliados de ocasião. Há de se acreditar que o vice-presidente sabe montar o touro das pressões vindouras de todos os lados e o controla-lo. Sua experiência congressual, inclusive como presidente da Câmara dos Deputados é credencial relevante, mesmo que não seja, digamos, decisiva. Também é preciso relembrar que o vice-presidente tem inegável virtude pessoal para o exercício da articulação, mas nada se sabe sobre as suas capacidades executivas. O último cargo que exerceu como executivo foi o de secretário de segurança do Estado de São Paulo, posição que é complexa quanto à sua natureza e operação, mas limitada em seu escopo. O Brasil é país complexo que requer do chefe do executivo um “cordão condutor” ideológico e político para poder governar. Caso contrário, não é difícil que o presidente se perca na barafunda das demandas sociais, políticas e econômicas. De fato, não se conhece o “pensamento de Temer”, assim como não se conhecia o de Dilma Rousseff, a desconhecida chefe da Casa Civil de Luiz Inácio Lula da Silva que virou presidente da República.

Caberá a Michel Temer, em seus primeiros dias de Palácio do Planalto mostrar este pensamento e começar a executá-lo em pleno voo de governo. A formação da sua “coalizão” será, portanto, vital aos seus planos. A “tecnoempresariocracia” que pretende criar para gerir a coisa pública terá como restrição objetiva a existência de três dezenas de partidos representados no Congresso Nacional. Todos eles meio perdidos do ponto de vista programático e a maioria sedenta por posições executivas que lhes acalente desejos inconfessáveis relativamente a denominada “coisa pública”. A linha ideológica começa com o grosseiro Jair Bolsonaro e vai até as beiradas dos socialistas democráticos do PSB. É muita demanda atabalhoada.

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O revestimento “tecnoempresariocrático” servirá para assistir as ansiedades sociais. Não cairá bem ao novo presidente não-eleito que as ruas se manifestem contrariamente ao seu governo logo de saída. O pacto que forma com segmentos representativos da sociedade não comprometidos com partidos políticos pode ser figura suficiente para evitar a acusação frouxa mas sonora, das “multidões perdidas” de que Michel Temer “faz mais do mesmo”. Aqui a grande barreira será incorporar alguma representação que minimamente sugira que o novo governo não cuidará apenas dos mais bem situados na escala social.

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Relativamente à resistência da oposição formal, notadamente o PT, creio que o resultado a ser colhido pelo novo governo será acima das expectativas atuais. A corrupção, a traição ideológica e o próprio esfacelamento pelo qual o ex-partido proletário passará são mazelas muito fortes para impedir que o partido de Lula da Silva possa recuperar credibilidade política. Ademais, não se pode subestimar que o ex- presidente sofra os efeitos mais agudos das ações engendradas pelo juiz Sérgio Moro a partir de sua base curitibana. O passado pode bater à porta de Lula e seu grupo mais íntimo. Não há que se duvidar que possa existir sustentação jurídica para tanto. Temer caminha em terreno pantanoso, não resta dúvida. Todavia, há espaço de manobra perante a opinião pública engalfinhada na recessão profunda e uma classe política sob forte escrutínio público. Possivelmente, o terreno seja menos pantanoso e substancialmente maior que sugerem os analistas presentes na mídia mais influente do país.

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Tudo isso indica que a recuperação econômica vindoura pode ser rápida nos próximos doze a dezoito meses e, até mesmo vigorosa, mesmo que a sustentação no médio e longo prazo (a partir de dezoito meses) dependa em grande parte de reformas estruturais que são devidas há séculos embora propaladas pela intelligentsia. A “grande arte” de Temer será pavimentar o caminho de novo paradigma político que seria muito mais necessário, caso Dilma sobrevivesse. Com Temer, a morte política de Dilma implicou na sobrevivência de um modelo político inviável, corrupto, ineficiente e que opera para segmentos estreitos da pirâmide social do país.