A bicicleta sem pedais do Estado brasileiro

O governo precisa buscar o equilíbrio das contas públicas com a austeridade que não teve até hoje. Precisa executar a difícil reforma do Estado, com a redução efetiva dos gastos públicos, mesmo que isso signifique uma tarefa análoga com a que enfrenta a Grécia.

Equipe InfoMoney

Publicidade

Colunista convidado: Fernando Zilveti, professor livre-docente em direito tributário pela USP, consultor da E-z-tax

As crianças de hoje aprendem tudo mais rápido. Para desenvolver o equilíbrio e a motricidade recomenda-se que iniciem a prática de andar de bicicleta sem pedais. Os pedais tiram o equilíbrio e, quando desenfreados, atingem as pernas das crianças, provocando quedas e hematomas. Sem pedais fica tudo aparentemente mais difícil, mas seguro e eficaz a médio prazo. Primeiro se desenvolve o equilíbrio sobre duas rodas, em seguida a motricidade e, afinal, a velocidade. Uma vez completo o ciclo de aprendizado, a criança está apta a andar de bicicleta, com ou sem pedais, senhora de si, dominando o veículo.

Com a política fiscal brasileira deve ser assim, principalmente, se o Congresso votar corretamente a pauta fiscal. Temos pela frente a revisão da meta fiscal de 2015, pleito do governo atual para que seja dado a ele um “cheque especial” para cobrir as contas do ano que termina. Se o parlamento aprovar o déficit primário de R$ 51,8 bilhões, que pode chegar a R$ 119,9 bilhões, compensaria as pedaladas fiscais do passado recente. Um erro injustificável para cobrir outros erros. Isso demonstra o estado das contas públicas brasileiras, um verdadeiro descalabro.

Masterclass

As Ações mais Promissoras da Bolsa

Baixe uma lista de 10 ações de Small Caps que, na opinião dos especialistas, possuem potencial de valorização para os próximos meses e anos, e assista a uma aula gratuita

E-mail inválido!

Ao informar os dados, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

O agente de política fiscal brasileiro se acostumou a gerir as contas públicas com o uso das famosas “pedaladas”. Atuou mal, passando, sistematicamente, contas previstas no orçamento que foi incapaz de pagar com as receitas públicas do exercício, para o ano fiscal posterior. Tudo para manter metas de superávit que sustentavam a captação de dinheiro por meio de emissão de títulos públicos, bem como a avaliação positiva das agências de risco.  Com tais   práticas infringiu a legislação orçamentária e de responsabilidade fiscal. Chegou, então, a hora da verdade, com a rejeição de contas de 2014 pelo TCU – Tribunal de Contas da União. O que fazer, então, com um Estado Fiscal e sua “bicicleta” sem pedais?

Aturdido com a constatação da falta de pedais, o governo busca algum impulso no aumento de carga tributária, com projetos sem sentido ou até apelativos como o fantasma da CPMF. Esse combustível tributário não trará equilíbrio para a “bicicleta”. O aumento de tributos tira impulso, trava as rodas da “bicicleta” economia, com a retração do investimento, bem retratada com o resultado do  terceiro trimestre num PIB de –1,7%. Uma surpresa pela gravidade da paralisia da economia em seus diversos setores, mas para os observadores cotidianos, um desastre anunciado da má gestão macroeconômica.

Ciente que o ano de 2015 está perdido para a economia, o governo direciona suas baterias para salvar-se de nova derrota perante o TCU. Vem, então, com a ideia de revisão da meta fiscal. Ameaça, como de costume, com a paralisia do Estado. Essa revisão, porém, caso seja aprovada pelo Congresso, representa o mesmo que um cidadão comum entrasse no cheque especial, devendo para bancos os gastos que foi incapaz de cortar antes e cujas receitas para cobrir tais buracos não consegue gerar.

Continua depois da publicidade

Em outras palavras, o governo prometeu no início do ano um superávit inalcançável, baseado em receitas hipotéticas que ao longo do tempo se mostraram infrutíferas. Por outro lado, não fez os cortes profundos nos gastos como deveria, deixando com que as despesas públicas subissem  além da  geração de receita. Fez o mesmo nos anos anteriores, só que o TCU retirou os “pedais da bicicleta”.

Afinal, o Congresso não deve rever a meta fiscal do governo. Este precisa buscar o equilíbrio das contas públicas com a austeridade que não teve até hoje. Precisa executar a difícil reforma do Estado, com a redução efetiva dos gastos públicos, mesmo que isso signifique uma tarefa análoga com a que enfrenta a Grécia. Somente após tal reforma se admite rever receitas fiscais. O Estado brasileiro vai ter que reaprender a andar de bicicleta, desta vez, sem pedais.”  

  

Quer receber as principais notícias de política diariamente no seu e-mail? Assine gratuitamente a newsletter do Na Real!