Com a Reforma da Previdência, vigente desde novembro de 2019, ficaram mais complexos os cálculos que cada trabalhador precisa fazer para descobrir quando irá se aposentar e qual o valor do benefício que receberá. 

Segundo Otávio Augusto Xavier, especialista em direito previdenciário e sócio do escritório Xavier Vasques Advogados Associados, em Porto Alegre (RS), quem não conhece as novas regras corre o risco de ficar no prejuízo.

“Por lei, o INSS deve conceder o melhor benefício para quem solicita a aposentadoria, mas, na prática, isso nem sempre acontece. Por isso, a pessoa precisa conhecer os seus direitos, para poder reivindicá-los quando for o caso”, diz o advogado.

A advogada previdenciária e mediadora judicial, Joice Raddatz, também alerta para a importância de o contribuinte entender as mudanças ocorridas a partir da reforma da previdência.

“Muitas pessoas descobrem anos depois de se aposentar que poderiam estar recebendo um benefício maior, e algumas nem chegam a ter esse conhecimento. E isso pode ser evitado com o auxílio de um profissional da área”, observa.

Neste conteúdo, falaremos sobre alguns dos pontos mais importantes que devem ser compreendidos em relação às novas regras previdenciárias. Confira a seguir algumas orientações dos especialistas.

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Quais tipos de aposentadoria existem hoje?

Nosso foco serão os tipos de aposentadoria do INSS mais comuns entre os trabalhadores: a aposentadoria por idade e por tempo de contribuição. Por isso, não abordaremos casos específicos, como a aposentadoria por invalidez e as aposentadorias especiais, que contemplam condições diferenciadas em relação à idade e ao tempo de contribuição, como aposentadoria para professores, trabalhadores rurais e atividades com algum grau de insalubridade.

Aposentadoria por idade

Antes da reforma da previdência, homens com 65 anos e mulheres com 62 anos tinham direito à aposentadoria por idade, desde que ambos tivessem 15 anos de contribuições ao INSS (ou 180 meses). 

As novas regras não alteraram a idade mínima de ambos, nem o tempo de contribuição da mulher. Porém, o tempo de contribuição necessário para os homens aumentou, passando de 15 para 20 anos.

Antes da reforma da previdênciaDepois da reforma da previdência
Idade: 65 anos para homens e 62 anos para mulheresIdade: 65 anos para homens e 62 anos para mulheres
Tempo de contribuição: 15 anos para ambosTempo de contribuição: 20 anos para homens e 15 anos para mulheres

Outra importante alteração ocorrida foi na forma de cálculo do benefício a ser recebido pelo contribuinte. Quem tinha os requisitos para se aposentar antes de 12/11/2019, véspera da vigência das novas normas previdenciárias, receberia 70% da média dos 80% maiores salários (a partir de julho de 1994) acrescida de 1% para cada ano de trabalho.

Para quem já era contribuinte antes da reforma mas não adquiriu o direito de se aposentar, o benefício será de 60% sobre a média de todos os salários recebidos, com tempo mínimo de contribuição de 15 anos com o adicional de 2% para cada ano de contribuição que ultrapassar os 15 anos obrigatórios para ambos.

Por fim, os homens que ingressaram no sistema previdenciário depois de 12/11/2019 já estão sujeitos ao aumento de 5 anos nas contribuições obrigatórias.

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Resumo do benefício na aposentadoria por idade:

Quem tinha direito adquirido antes da reforma70% da média dos 80% maiores salários a partir de julho de 1994 + 1% para cada ano de contribuição.
Quem já era contribuinte antes da reforma, mas ainda não se aposentou60% da média de todos os salários + 2% para cada ano de contribuição e mínimo de 15 anos para homens e mulheres.
Quem passou a ser contribuinte depois da reforma60% da média de todos os salários + 2% para cada ano de contribuição e mínimo de 20 anos para homens e 15 anos para mulheres.

Conforme observa Otávio Xavier, o fato de não haver mais o descarte dos 20% menores salários prejudicou bastante o valor do benefício do contribuinte, pois a média ficará mais baixa.

Aposentadoria por tempo de contribuição

Quem entrar no mercado de trabalho depois da reforma da previdência não terá direito à aposentadoria por tempo de contribuição. Porém, existem regras de transição, que consideram pontos, idade dos contribuintes e pedágio de acordo com o tempo de contribuição de homens e mulheres.

O resumo a seguir contém as regras de transição dispostas nos artigos 15, 16 e 17 da Emenda Constitucional 103/2019, que tratam sobre o tema:

Aposentadoria por tempo de contribuição – pontos

  • Homem: 35 anos de contribuição + idade …. = …. pontos progressivos no tempo até 105 (ver tabela).
  • Mulher: 30 anos de contribuição + idade … = …. pontos progressivos no tempo até 100 (ver tabela).

O fim da progressão ocorrerá em 2028 para homens e em 2033 para mulheres, conforme tabela:

AnoMulheresHomens
20198696
20208797
20218898
20228999
202390100
202491101
202592102
202693103
202794104
2028 (fim da progressão para homens)95105
202996105
203097105
203198105
203299105
2033 (fim da progressão para mulheres)100105

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Aposentadoria por tempo de contribuição – idade dos contribuintes

Outra regra de transição considera o aumento progressivo da idade para homens e mulheres. 

No caso dos homens, além de 35 anos de contribuição, haverá um aumento progressivo da idade mínima para a aposentadoria a cada ano a partir de 2019, até os 65 anos. Para a mulher, serão considerados os 30 anos de contribuição e o aumento progressivo será até os 62 anos.

O fim da progressão ocorrerá em 2027 para homens e em 2031 para mulheres, conforme tabela:

AnoMulherHomem
20195661
202056,561,5
20215762
202257,562,5
20235863
202458,563,5
20255964
202659,564,5
2027 (fim da progressão para homens)6065
202860,565
20296165
203061,565
2031 (fim da progressão para mulheres)6265

(Fonte: advogada Joyce Haddatz)

Aposentadoria por tempo de contribuição – pedágio de 50%

Antes de falarmos sobre a regra do pedágio de 50%, precisamos entender como funciona o fator previdenciário.

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Trata-se de um cálculo que leva em consideração três aspectos: idade, tempo de contribuição e expectativa de vida do trabalhador. A lógica é simples: quanto maior a idade e o tempo de contribuição, maior será o fator previdenciário, porque a expectativa de sobrevida será menor, e vice-versa. Ou seja, quanto mais jovem for o contribuinte, teoricamente mais tempo ele receberá aposentadoria, porém o valor do benefício será menor.

Atualmente, a única regra de aposentadoria na qual se aplica o fator previdenciário é a do pedágio de 50%. Para ter direito a se aposentar por essa regra, não é necessário idade mínima, porém é preciso que, na data da reforma, estivesse faltando menos de dois anos para homens e mulheres completarem o tempo de contribuição.

Por exemplo, imagine que uma mulher tivesse 29 anos de contribuição antes de 13/11/2019. Para que pudesse se enquadrar na regra do pedágio de 50%, ela precisaria de mais um ano de contribuição (para alcançar os 30 anos mínimos) mais 50% do período que faltava (nesse caso, mais seis meses).

Para calcular o benefício considerando o pedágio de 50%, basta multiplicar a média de contribuições pelo fator previdenciário. Lembrando que quanto mais jovem for o contribuinte, menor será esse fator e, por isso, é importante avaliar se vale a pena optar por essa regra.

Resumo do pedágio de 50%:

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  • Homem: 33 anos de contribuição até 13/11/2023 + pedágio de 50% até alcançar 35 anos.
  • Mulher: 28 anos de contribuição até 13/11/2023 + pedágio de 50% até alcançar 30 anos 
  • Valor do benefício: 60% da média global sem descarte + 2% para cada ano de contribuição além dos 15 da mulher e 20 do homem + fator previdenciário.

Aposentadoria por tempo de contribuição – pedágio 100%

Já no pedágio de 100%, não se aplica o fator previdenciário. Porém, para se enquadrar nessa regra, é exigida idade mínima de 60 anos e 35 anos de contribuição para homens e de 57 anos e 30 anos de contribuição para mulheres.

Resumo do pedágio de 100%:

  • Homem: 35 anos de contribuição + 60 anos de idade + pedágio de 100%. 
  • Mulher: 30 anos de contribuição + 57 anos de idade + pedágio de 100%.
  • Valor do benefício: 100% da média global.

Problemas comuns nas aposentadorias e a importância do planejamento previdenciário

Quem deixa para se preocupar com a aposentadoria pouco tempo antes de adquirir o direito pode vir a ter problemas na hora da concessão do benefício. 

“Estamos habituados a lidar com problemas de toda ordem, como, por exemplo, o INSS não aceitar determinadas contribuições ou não reconhecer alguns vínculos como insalubres, que teriam direito a um valor maior de benefício”, explica Otávio Xavier.

Outra situação comum que o advogado cita são os casos em que a pessoa estava prestes a se aposentar e se desliga da empresa em um plano de demissão voluntária.

“Nesses casos, é comum a pessoa recolher o pouco que falta por conta própria. Porém, se ela errar o código do tributo, o INSS não irá considerar os valores pagos, e daí será preciso um processo administrativo e, eventualmente, até judicial para se conseguir a aposentadoria”, alerta.

Joyce Raddatz também reitera a importância do planejamento previdenciário como forma de evitar desgastes e atrasos na aposentadoria.

“Considerando as atuais regras de transição, existem cerca de dez situações nas quais a pessoa pode se enquadrar. Para que não haja atrasos ou prejuízos, é preciso avaliar cuidadosamente cada caso em particular”, explica a advogada.

O planejamento previdenciário nada mais é do que uma assessoria que especialistas da área prestam ao contribuinte. Nesse serviço, o profissional identifica a regra de enquadramento mais adequada à situação. Como exemplifica Joyce, muitas vezes uma pessoa que já tem o direito adquirido pode receber um valor maior de benefício se esperar um pouco mais para se aposentar. E, eventualmente, há situações nas quais existem contribuições em atraso que precisam ser regularizadas para que o pedido de aposentadoria não seja recusado, o que também é identificado no planejamento.

“A partir do histórico do contribuinte, fazemos também uma projeção de sua renda futura, e, dependendo do caso, podemos sugerir até um aumento das contribuições, para que o benefício recebido seja maior no futuro”, acrescenta a advogada.

Quando fazer o planejamento previdenciário?

Ambos os advogados entrevistados afirmam que o ideal é ter uma antecedência mínima de dez anos da aposentadoria para que se comece esse planejamento.

“A previdência é um direito fundamental de todo cidadão, mas as novas regras dificultaram muito o entendimento do processo. Por isso, é fundamental contar com auxílio especializado bem antes de adquirir o direito”, alerta Otávio Xavier.

Via de regra, não há necessidade de um pedido de aposentadoria ser encaminhado com a assessoria de um advogado. Mas como explica Joyce, hoje é difícil ter a orientação correta.

“Hoje, precisamos fazer a solicitação pelo portal do INSS ou pelo 135, e neste telefone é bastante difícil o contato. Até para nós, profissionais da área, o processo é complexo”.

A advogada observa ainda que, para as pessoas que entram sozinhas com o pedido de aposentadoria, o problema mais frequente é receber um benefício menor do que teria direito, justamente por não terem optado pela melhor regra.

“Infelizmente, a maioria das pessoas nos procura só quando têm problemas como o deferimento do pedido, e não de forma preventiva. Se buscassem por uma assessoria antes de encaminhar a aposentadoria, poderiam poupar muito tempo e trabalho”, diz.