Mercado de trabalho atenua desaceleração da atividade, mas economistas alertam para risco inflacionário

Ritmo de crescimento do rendimento médio real habitual de todos os trabalhos desacelerou, mas em patamar ainda alto, dizem especialistas

Roberto de Lira

(Shutterstock)

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A manutenção da força do mercado de trabalho brasileiro, comprovada pela nova queda na taxa trimestral de desemprego em outubro – o IBGE anunciou hoje que a desocupação ficou em 7,6% – é considerada uma boa notícia pelos economistas quando o indicador é tratado como um fator que ameniza  a desaceleração da economia neste final de ano. Mas, ainda que tenha apresentado perda de ritmo, o nível do salário médio traz alguma preocupação para a dinâmica futura da inflação.

Rafael Perez, economista da Suno Research, disse que o dado da PNAD veio em linha com o esperado e continua dando sinais de um mercado de trabalho resiliente e aquecido. Ele destacou o fato de a maior parte do crescimento do número de ocupados nos últimos meses tem vindo da categoria de empregados com carteira assinada no setor privado.

“Favorece o aumento dos salários e tem se refletido em crescimento do rendimento médio real, que teve uma alta de 0,6% em relação ao mês anterior e de 2,4% desde o início do ano”, comentou.

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Ele disse ainda que o aumento nas contratações temporárias para o final de ano deve ajudar a manter a taxa de desemprego em mínimas dos últimos anos e favorecer a massa de rendimentos dos trabalhadores, que está em máximas históricas – de R$ 295,7 bilhões em outubro, uma alta de 4,1% no ano.

“O mercado de trabalho aquecido e o crescimento da massa salarial deverão ser os principais vetores de crescimento no último trimestre, impulsionando o consumo e amenizando a desaceleração da economia”, previu.

Já Marco Antonio Caruso e Igor Cadilhac, economistas do PicPay, observaram o quadro mais favorável pelo lado da ocupação divulgado hoje, que atingiu o maior patamar da série histórica. Olhando para os salários, eles disseram ver uma nova redução no ritmo de crescimento do rendimento médio real habitual de todos os trabalhos, de 4,2% para 3,9% ao ano. “Apesar da tendência de desaceleração, ele ainda dá sustentação ao consumo das famílias dado o ganho robusto”, comentaram.

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Mas os economistas alertaram para as suas implicações disso no cenário de inflação de médio prazo, dinâmica que traz alguma preocupação. “O salário real desacelera, mas salta aos olhos a estabilidade dos rendimentos nominais e seu avanço de quase 9% há 4 meses”, citaram.

De modo geral, o PicPay Caruso e Cadilhac consideraram que a leitura qualitativa do indicador é de que o mercado de trabalho segue forte e com uma composição saudável, recuperando suas características intrínsecas.

“Olhando à frente, entendemos que os efeitos defasados da política monetária contribuirão para uma desaceleração da atividade econômica e um consequente aumento da taxa de desemprego, que ainda resistirá em patamares historicamente baixos por mais um bom tempo. Para 2023, projetamos uma taxa média de desemprego de 8%.”

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Claudia Moreno, economista do C6 Bank, destacou o aumento da população economicamente ativa (PEA) e da população ocupada, que já superou o patamar pré-pandemia e está no maior nível da série, ultrapassando 100 milhões de pessoas pela primeira vez.

Sobre os indicadores de renda, ela alertou que o aumento do rendimento sem elevação da produtividade é um fator de preocupação, pois significa maior pressão na inflação de serviços.

“A força que o mercado de trabalho vem mostrando ao longo do ano é reflexo dos dados de atividade econômica, que vieram mais fortes que o esperado no primeiro semestre. Acreditamos que a economia vai desacelerar à frente, mas esse movimento não deve fazer a taxa de desemprego subir de maneira significativa”, comentou, acrescentando que a previsão do 6 Bank é que a taxa de desemprego fique praticamente estável, em torno de 8% até o final de 2024.

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Já João Savignon, chefe de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, comentou que o mercado de trabalho segue corroborando o cenário de desaceleração gradual da economia doméstica. “Com a ocupação e a renda nesses níveis, há um suporte ao consumo das famílias, especificamente do setor de serviços e das atividades do comércio ligadas à renda, mesmo considerando a saída do efeito positivo do agronegócio e a política monetária ainda restritiva no país.”

Poder de compra maior

Luis Otavio Leal, economista chefe da G5 Partners, lembrou que, tanto os dados do IBGE como os do Dieese sugerem que a renda das famílias continua em trajetória benigna de expansão.

“Uma maneira de verificar isso é calculando o custo da cesta básica como percentual da renda nominal de todos os trabalhos. Para a média das capitais brasileiras e para o estado de São Paulo, ocorreu um ganho expressivo no poder de compra dos trabalhadores desde o início do ano passado”, destacou.

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Para ele, apesar de o mercado de trabalho no Brasil continuar em trajetória benigna, com redução do desemprego, informalidade sob controle e aumento do rendimento dos trabalhadores, a inflação brasileira permanece em queda, de modo que, no momento, o mercado de trabalho apertado não parece ser um impeditivo para o Banco Central continuar com o processo de flexibilização monetária.

“Esperamos que em dezembro de 2023 a taxa de desemprego atinja 7,5%, com uma taxa média no ano de 8,0%, consideravelmente abaixo dos 9,3% verificados em 2022.”

Na análise do Goldman Sachs, assinada por Alberto Ramos, foi destacado que o emprego no setor informal diminuiu por três meses consecutivos. A taxa de informalidade laboral diminuiu 10 pontos base, para 40,4%.”

O banco de investimentos esperamos que o cenário aquecido do mercado de trabalho diminua nos próximos trimestres, dada a mudança em curso para um ritmo de crescimento abaixo da tendência. “A taxa de desemprego também poderá ser afetada se o número ainda considerável de trabalhadores desencorajados fora da força de trabalho começar a procurar emprego e regressar à força de trabalho ativa”, disse Ramos em relatório, detalhando que esse universo comporta 3,4 milhões de pessoas, ou 3,2% da força de trabalho ativa.

Na avaliação da HighPar, a tendência de aumento da população ocupada nos últimos meses prossegue, sobretudo entre os trabalhadores com carteira assinada. Foi lembrado ainda que houve aumento na taxa de participação (61,6% para 61,7% em dados ajustados), e que tanto a renda ,como a massa de rendimentos, cresceram menos no período, embora permaneçam com variação robusta no acumulado do ano.