Mercado de trabalho ainda forte nos EUA reforça expectativa de ciclo de juros mais longo, dizem analistas

Além das vagas, alta dos salários foi maior que a esperada pelo mercado, que ainda prevê redução no ritmo dos juros em dezembro

Roberto de Lira

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Os dados do payroll dos Estados Unidos divulgados nesta sexta-feira (2), que mostraram um mercado de trabalho ainda aquecido – a geração de 263 mil vagas em novembro voltou a superar as projeções e o salário médio ainda avançou 5,1% na comparação anual – continuam a exercer pressão sobre a inflação e reforçam o discurso de integrantes do Federal Reserve de que o atual ciclo de alta nos juros deve ser mais longo que o esperado.

Os analistas, no entanto não esperam que isso vá alterar a tendência de alta de 50 pontos-base na próxima reunião do Fomc, entre 13 e 14 de dezembro.

Para Rafaela Vitoria, economista chefe do Banco Inter, Rafaela Vitoria, o forte resultado tanto da criação de vagas como de salários significa que o Fed pode até desacelerar a alta em dezembro (do ritmo de 0,75% para 0,50%), “mas o aperto monetário deve ir mais longe”, escreveu em sua conta no Twitter.

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Para Carlos Vaz, CEO e fundador da Conti Capital, o mercado de trabalho americano tem sido um dos principais geradores de inflação no país e os dados de hoje podem causar ainda mais volatilidade e incerteza no mercado. Mas isso não deve mudar a decisão do Fed. “Acho que podemos esperar por um aumento menos agressivo, de 50 bps, neste fim de ano, mas com o ciclo de manutenção dos juros mantido”, prevê.

Conti acredita que EUA poderão entrar em recessão, mas que isso não deve causar grandes distúrbios, devido à força e resiliência do mercado de trabalho e da economia local. “Apesar do susto inicial que isso causa (a recessão), essa situação de contração no ciclo econômico não será duradoura e deverá ser atravessada sem grandes prejuízos. Especialmente por alguns mercados contra cíclicos”, afirma.

Para Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, o que mais chamou a atenção foi a alta dos salários acima do esperado e sobre uma base também revisada para cima. Para ele, só quando essa alta salarial ficar em patamares mais baixos, algo entre 3,5% ou 4% anuais, deixará de pressionar a inflação americana.

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Para ele, o payroll pode até elevar uma expectativa de alta de 75 pontos-base na próxima reunião do Fed, mas os últimos comunicados de diretores, especialmente do presidente do Banco Central dos EUA, Jerome Powell, já prepararam o terreno para uma elevação de 50 pontos-base. Ontem, o diretor do Fed, Michae Barr, deixou claro que a questão agora é o nível de juros final, disse Cruz. Isso só mudaria, segundo ele, se os próximos dados de inflação surpreenderem e vierem muito altos.

O BTG Pactual afirma, em relatório, que o payroll reforçou a percepção de que o mercado de trabalho segue com caráter apertado e não abre espaço para um relaxamento do discurso do Fomc.

Um dos motivos é que outro indicador de emprego, o Jolts, divulgado na quarta-feira (30) registrou arrefecimento da taxa de vacância, mas ainda em nível bastante elevado, de 1,71 vaga por desempregado, além de registrar volatilidade nas últimas divulgações, sem indicar tendência para os dados no curto prazo.

“Ressaltamos que a leitura de novembro não modifica nosso diagnóstico para o mercado de juros. Seguimos com o call de desaceleração do ritmo de aumento de juros no encontro de dezembro (para 50 bps), com a taxa terminal atingindo o patamar de 5,0% a5,25%.

“Copa do Mundo”

Angelo Polydoro, economista da ASA Investments, também viu o dado de salário muito forte, que pegou até mercado no contrapé. “(Payroll) parece a Copa do Mundo, cheio de emoção”, brinca. Ele destaca não só a subida de 0,6% do salário no mês (ante previsão de 0,3%) ou o dado anual de 5,1%, mas a taxa trimestral anualizada, que bateu nos 6,80%.

Ainda assim, ele acredita que isso não muda a narrativa do Fed e a tendência de que os juros vão subir 50 pontos-base na próxima reunião.  “Se os salários continuarem surpreendendo, ele (o Fed) pode baixar o ritmo, mas vai subir por mais tempo. O Fed vai exercer um pouco de cautela para ajustar o curso. A economia está muito resiliente”, afirma.

Celso Pereira, diretor de Investimentos da Nomad, também acredita que cenário do mercado de trabalho favorece a continuidade de aumento de juros nos EUA e um nível mais alto em 2023.  “O ritmo de novas contratações vem se reduzindo no ano, mas ainda está acima dos níveis anteriores à pandemia”, destaca.

“Esse cenário robusto do mercado laboral, com criação de vagas robustas e baixo desemprego, alimenta as preocupações do Fed com a inflação, e suporta uma postura de mais aumentos de juros. O risco aqui é que aumentos excessivos possam levar a uma recessão da economia do país em 2023”, analisa Pereira.