Expectativa de juros mais altos do que no passado vai exigir seletividade do gasto público, diz Ilan Goldfajn

Presidente do BID diz que avaliação é mais fácil de falar do que de fazer, mas que tem visto interesse crescente por melhores políticas públicas

Roberto de Lira

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A expectativa de que o mundo vai ter de se acostumar com níveis de taxas de juros mais altas do que as do passado recente traz para os governos um novo desafio em relação ao gasto público: a seletividade. O diagnóstico foi feiro nesta quinta-feira (23) pelo presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn, em evento em São Paulo.

Durante debate no 18º SIAC, promovido pela Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Ilan disse acreditar que as taxas de juros devem cair à frente, mas não para um nível tão baixo – muitas vezes negativo – que seu viu no passado.

Sua argumentação veio em resposta a um questionamento feito pelo economista Eduardo Giannetti, curador do evento, que expôs a pressão nas grande economias do planeta para que os governos aumentem seus gastos e indagou se haveria um risco fiscal adiante por conta disso, num ambiente de juros em alta.

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Ilan lembrou que a pergunta se a era de juros mais altos vai perdurar tem sido alvo de debate  entre economistas e acadêmicos no mundo todo. Ele conta que há dois campos nessa discussão, uma que acredita que o juro mais alto é fruto de um momento particular, com sequência de choques que elevaram a inflação global, como a pandemia e a invasão da Ucrânia pela Rússia.

Para esses especialistas, assim que a inflação baixar no mundo, os juros voltarão a patamares mais baixos devido a questões estruturais, como as mudanças demográficas e o excesso de poupança

Mas ele destacou que há uma outra vertente, para quem o período das últimas 3 décadas de juros zerados no mundo e com inflação baixíssima foi excepcional, com a situação voltando agora para a realidade, que seria de um juro mais alto. “Então, tudo tem de ser visto em função do custo de oportunidade, que é uma taxa de juros muito mais alta no mundo”, destacou.

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Ilan disse sua visão está entre essas duas vertentes de ideias. “Aquele período de três décadas foi excepcional. A ideia de que vamos ter juros zero ou negativo não era para sempre, mas uma boa parte da subida de juros hoje tem uma questão temporária”, explicou. Ele disso que as nações mais desenvolvidas estão observado agora que a inflação demora a cair e que é preciso ter paciência e persistência. “Nós vamos ver juros baixos à frente, mas talvez não tão baixos como nos últimos tempos”, previu.

Daí, segundo ele, vem a necessidade de os governos serem cada vez mais seletivos na escolha de seus gastos. “É mais fácil falar do que fazer, temos poucas experiências na América Latina e no mundo de avaliação de quais foram os gastos que deram certo ou não”, alertou.

Mas o ex-presidente do Banco Central do Brasil ponderou que tem visto uma vontade crescente de avaliar as políticas públicas. Segundo ele, até os países mais desenvolvidos já perceberam que suas dívidas estão alta em que, embora ainda haja espaço para crescer, ele não é infinito.

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No mesmo evento, Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do FGV/Ibre, também defendeu que é preciso institucionalizar a avaliação dos gastos. Ela lembrou que o Estado tem sido capturado por grupos de interesse e que o gasto tributário hoje no Brasil é de quase 5% do PIB. Além disso,  o Orçamento público é muito rígido e essas fragilidades levam a crises fiscais recorrentes, com graves efeitos sociais.

Efeitos do clima

Para o presidente do BID, a América Latina convive hoje com um “desafio triplo”, que é a crescente demanda por serviços públicos em meio a um cenário de restrição fiscal e crescimento econômico lento.

“Os governantes entram no poder e tem restrições fiscais, alguns com dívidas altas, outros precisando de estabilização e nem todos tem os recursos necessários para atender essa demanda por serviços públicos”, avaliou Goldfajn.

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Somado a esse cenário, o presidente do BID destaca que existem efeitos cada vez mais evidentes das mudanças climáticas e seus respectivos impactos socioeconômicos. “Está claro que as mudanças climáticas já chegaram em todos os países da América Latina”, salientou.

Para Goldfajn, a necessidade de avaliar soluções para conter a emergência climática indica um cenário em que questões globais podem ser resolvidas a partir da América Latina. “É questão de perceber que o mundo precisa da América Latina e do Brasil para resolver problemas globais”, pontuou o presidente do BID, citando a necessidade de iniciativas de controle do desmatamento na Amazônia para controle do aquecimento global. “Você tem uma oportunidade de consolidar a Amazônia Legal, uma grande catalisadora dessa economia de baixo carbono”, destacou.

Insegurança alimentar

Para o presidente do BID, além das questões climáticas, o combate à insegurança alimentar é um outro ponto de atenção e no qual a instituição financeira tem buscado atuar.

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“Falta melhor distribuição de alimentos e isso ficou evidente nos últimos anos”, avaliou Goldfajn, citando que houve um aumento de mais de 500% na produção de grãos entre 1977 e 2017. “E o Brasil tem oportunidade para ser o grande exportador de alimentos do mundo.”

(Com Estadão Conteúdo)