Comércio tem altos e baixos em 2023, mas inflação em queda e renda maior devem ajudar

Queda do varejo restrito em dezembro pode ter sido um rebote da alta de novembro motivada pela Black Friday; mercado de trabalho aquecido, juros mais baixos e inflação controlada trazem otimismo

Roberto de Lira

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As vendas no varejo brasileiro têm mostrado um comportamento bastante variado por setores nos últimos meses, oscilando entre a resiliência trazida pela maior disponibilidade de renda via inflação e taxa de desemprego menores e o impacto das condições de restrição do crédito. Na virada do ano não foi diferente, embora a intensidade da queda do varejo restrito tenha pegado os economistas de surpresa.

Nesse conceito de vendas que exclui o comércio de veículos, materiais de construção e atacarejo, a queda foi de 1,3% em dezembro ante novembro, num provável efeito “bumerangue” após a alta do mês anterior, puxada pelas promoções da Black Friday, conforme análise da XP.

Esse rebote pode ser facilmente identificado nos resultados desagregados, que foram predominantemente negativos, com seis das oito atividades a registarem uma descida marginal, destaca a XP.

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Ou seja, itens bem procurados no mês anterior, como materiais de escritório, informática e comunicação, móveis, eletrodomésticos, vestuário e calçados, caíram forte em dezembro.

Do lado positivo, a categoria de supermercados, alimentos e bebidas tem crescido de forma consistente, subindo 0,8% no mês e acumulando seis altas mensais nos últimos sete meses.

“O cenário de resiliência do consumo se mantém, apesar das surpresas negativas em dezembro.  Estimamos que o rendimento disponível real das famílias cresça 4,2% em 2024, após um aumento de 6,5% em 2023. Além disso, o processo de desinflação continua e as condições de crédito têm melhorado gradualmente”, comenta a XP.

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A projeção é que as vendas no varejo ampliado (que inclui as categorias retiradas no conceito amplo) aumentem 2,7% este ano, após um ganho de 2,4% registrado no ano passado.

Para Claudia Moreno, economista do C6 Bank , os dados mais fracos de dezembro corroboram a visão de que a economia registrou forte desaceleração no segundo semestre de 2023, mas também não alteram a projeção positiva para este ano. “Para 2024, nossa expectativa é de que as vendas do varejo ampliado continuem expandindo. Para o PIB, nossa projeção é de crescimento de 1,5% em 2024 e em 2025”, estima.

Renda maior

Na análise do Santander Brasil, embora o cenário permaneça desafiador para o varejo, o 1º trimestre pode ser mais positivo devido ao impacto do pagamento de precatórios e ao aumento da renda das famílias.

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A projeção de Igor Cadilhac, economista da PicPay, é semelhante. “Nossa perspectiva é que o mercado de trabalho aquecido, a regra de valorização do salário-mínimo e a inflação comportada devam contrabalançar um juro real ainda elevado”, comenta.

Rafael Perez, economista da Suno Research, pondera que o cenário doméstico ainda em desaceleração tem impedido um crescimento mais robusto do setor varejista, principalmente por conta do elevado endividamento das famílias e os efeitos cumulativos da política monetária restritiva.

Porém, ele projeta que a continuidade do ciclo de cortes da taxa Selic pelo Banco Central, a inflação em níveis mais comportados, o mercado de trabalho aquecido e o crescimento da massa salarial devem trazer um ímpeto melhor para o varejo ao longo de 2024.

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João Savignon, chefe de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, observa que o desempenho foi de relativa estabilidade no último trimestre de 2023, com ligeira queda do varejo restrito e alta modesta do ampliado.

“Os dados intercalaram altas e baixas ao longo do ano e com importante heterogeneidade entre as atividades pesquisadas, além das frequentes revisões pelo IBGE. Isso revela uma maior dificuldade em se analisar corretamente o desempenho do setor”, explica.

Para ele, em uma perspectiva um pouco mais longa, a avaliação é que o varejo siga com ligeira tendência de crescimento, de quase estabilidade. “As perspectivas continuam desafiadoras, mas alguns elementos nos fazem acreditar em um cenário de desaceleração gradual do crescimento e não de queda, como o maior espaço na renda e capacidade de endividamento das famílias”, afirma.