Para lidar com poder de compra corroído, consumidor está menos ‘leal’ a marcas e mais ‘elástico’ ao preço

Relatório da Nielsen (que agora se chama NIQ) aponta mudanças no e-commerce brasileiro e uma realidade 'não tão positiva assim' sobre o consumidor

Lucas Sampaio

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Para lidar com poder de compra corroído nos últimos anos, o consumidor brasileiro está menos leal às marcas e tem adotado um comportamento muito mais “elástico” ao preço, afirma o diretor de serviços de varejo da Nielsen no Brasil, Roberto Butragueño.

A Nielsen (que passou por um reposicionamento de marca e agora se chama NIQ) fez uma pesquisa para entender o comportamento do consumidor e o cenário atual para o varejo brasileiro. E as notícias não são muito positivas.

A expectativa era de um cenário promissor para 2022, saindo de um cenário difícil de pandemia e inflação alta, mas a realidade ainda está longe de ser positiva — reflexo de um contexto econômico ainda desafiador:

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“Temos um consumidor que quer comprar, que quer sair da pandemia, mas ainda tem um bolso apertado”, afirma Butragueño. “Por isso temos um consumidor menos leal a marcas e muito mais elástico ao preço, que tem de fazer escolhas e olha mais para o preço”.

O diretor da NIQ afirma que o brasileiro está também menos leal aos canais de compra: enquanto as pessoas compravam em 3 lojas diferentes no e-commerce em 2006, hoje esse número já está em 9 (e crescendo).

Mas a lealdade não é o único fator: há também mais opções. “O consumidor tem mais alternativas de onde comprar. Isso faz com que a lealdade seja mais desafiada”, diz Butragueño, que fez uma apresentação da pesquisa na sede da Amazon em São Paulo.

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Papel higiênico se destaca

Dados da Amazon (AMZO34) sobre as vendas na Semana do Consumidor corroboram as conclusões da NIQ. Apesar de a varejista dizer que as vendas cresceram mais de 40% neste ano, na comparação com 2021, o item mais vendido foi um tanto inusitado: o papel higiênico.

Outro destaque da data, que já é a terceira mais importante do ano para a Amazon (só atrás da Black Friday e do Prime Day), foi um kit com 5 bermudas de moletom, de uma loja familiar de Peruíbe (cidade de cerca 70 mil habitantes no litoral de São Paulo).

“Eles venderam mais de 1,2 mil kits e faturaram mais de R$ 290 mil nesta ‘Consumer Week’”, afirma Ricardo Garrido, líder de market place da Amazon no Brasil.  “Se prepararam, produziram com antecedência e colocaram dentro do nosso CD [Centro de Distribuição], então a gente tinha capacidade de entregar em 1 dia”.

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Camila Nunes, líder de marketing da Amazon Brasil, diz que outros destaques de vendas foram dois produtos com alta concentração de proteína, consumidos por frequentadores de academia e praticantes de esportes: whey protein e a bebida láctea Youpro.

Comportamento parecido tem sido visto por outras empresas. Priscilla Costa, executiva da Livelo, diz que, na última Black Friday, os cinco produtos mais vendidos foram: conjunto de potes, aspirador, kit de ferramentas, mop giratório (esfregão) e conjunto de panelas.

O InfoMoney procurou também as outras grandes varejistas que atuam no Brasil, para um balanço das vendas da Semana do Consumidor. Mas Americanas (AMER3) e Via (VIIA3) disseram que não iam se pronunciar, e Magazine Luiza (MGLU3) e Mercado Livre (MELI34) não retornaram até a publicação desta reportagem.

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Mudança nas compras

Esses produtos evidenciam uma mudança no consumo digital. O e-commerce passou por forte popularização nos últimos dois anos, em meio à pandemia: o número de brasileiros que compram regularmente na internet saltou de 79,7 milhões em 2020 para 106,9 milhões em 2022.

Ao mesmo tempo, o tipo de compra mudou (e o ticket médio caiu). “Houve uma adaptação do consumidor: ele está comprando mais, com um ticket médio menor”, afirma o diretor de serviços de varejo da NIQ no Brasil.

Dados da pesquisa corroboram a afirmação: as vendas cresceram apenas 1,6% entre 2021 e 2022 (um sinal de estabilização), puxadas por um crescimento de 7,9% na quantidade de pedidos, mas o ticket médio das compras caiu 7,5%.

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“[A compra] deixou de ser focada em eletrônicos, informática e tecnologia, enquanto cresceram as vendas de perfumaria, alimentos e bebidas e produtos para bebê”, exemplifica Butragueño. “É uma democratização do e-commerce, tanto do consumidor quanto das categorias vendidas”.

O estudo mostra que as categorias que mais cresceram em importância no ano passado foram:

Já as vendas de telefonia despencaram 22,8% e as de eletrodomésticos caíram 6,6%.

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Democratização do consumo

Além da diversificação de produtos, houve também uma democratização dos consumidores. Apesar de o e-commerce ainda estar muito concentrado na região Sudeste (e no Sul), os maiores crescimentos têm sido registrados no Norte. A região também se destaca pelo maior ticket médio.

O Sudeste ainda representa 55% das vendas no país, mas a variação em relação a 2021 foi de apenas 0,4% e o ticket médio caiu 6% (de R$ 417 para R$ 394). Já o Norte foi o responsável por apenas 4% do faturamento em 2022, mas o crescimento foi de 18% e o ticket médio da região é de R$ 586.

Isso impõe desafios às empresas. “Regionalidade é muito importante no Brasil. Há uma diferença muito grande entre consumidores do Norte e do Nordeste, na comparação com o Sudeste. E também entre consumidores das capitais e do interior”, afirma Butragueño.

O executivo da NIQ dá como exemplo o prazo de entrega. “Em São Paulo, se a expectativa é a entrega chegar em 1h e ela chega em 1h10, o cliente reclama. No Norte, às vezes o produto nem chegava. Então, se você entregar em uma semana, mas faz a entrega certinha, isso já é uma grande experiência para o cliente”.

Garrido, líder de market place da Amazon no Brasil, concorda com a análise (que faz parte do relatório Webshoppers Ebit NielsenIQ). “A gente não chega em um dia no Norte, mas a entrega grátis do Prime faz toda a diferença lá”.

Lucas Sampaio

Jornalista com 12 anos de experiência nos principais grupos de comunicação do Brasil (TV Globo, Folha, Estadão e Grupo Abril), em diversas funções (editor, repórter, produtor e redator) e editorias (economia, internacional, tecnologia, política e cidades). Graduado pela UFSC com intercâmbio na Universidade Nova de Lisboa.