Apostar em bolão é seguro? Entenda polêmica com a Mega da Virada 2023

3 das 5 apostas vencedoras da Mega da Virada eram bolões; em São José da Bela Vista (SP), 44 pessoas apostaram na loteria, mas só 9 levaram o prêmio

Lucas Sampaio

A polêmica sobre um bolão da Mega da Virada em São José da Bela Vista (SP), em que 44 pessoas apostaram na loteria mas só 9 levaram o prêmio, acendeu um sinal de alerta nos apostadores da Mega-Sena: participar de um bolão é seguro ou não?

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A modalidade foi criada pela Caixa Econômica Federal em 2012, mas a prática de fazer apostas em grupo é muito mais antiga. Acontece que, antes disso, o banco responsável pelas Loterias não reconhecia os bolões (na prática, o ganhador era apenas quem tinha feito a aposta).

No caso de São José da Bela Vista (SP), uma pessoa organizou um bolão da Mega da Virada e reuniu o dinheiro de 44 pessoas, cobrando R$ 30 de cada um, mas a aposta que acertou as 6 dezenas tinha apenas 9 cotas. Com isso, 35 pessoas ficaram sem o prêmio e 11 delas entraram na Justiça contra o organizador.

Parte do grupo que ficou sem o prêmio diz não ter sido informado que seriam feitos bolões separados. Já a defesa do organizador do bolão afirma que as pessoas tinham consciência disso e que os vencedores receberam seus recibos das cotas e já retiraram seus prêmios com o documento.

Devido à polêmica causada pela aposta, o InfoMoney explica os detalhes do caso (e o que ainda não está claro). Explica também como são feitos os bolões e dá dicas para você não ser prejudicado caso um dia tire a sorte grande e seja premiado na Mega-Sena.

Prêmio de quase R$ 542 milhões

Cinco apostas acertaram as 6 dezenas da Mega da Virada (concurso 2.550) e dividiram o prêmio histórico de quase R$ 542 milhões (R$ 108 milhões para cada uma). Três das cinco apostas eram bolões, e por enquanto só há relatos de problemas no de São José da Bela Vista.

Procurada, a Caixa afirmou que quase todos os prêmios já foram retirados até segunda-feira (16). Faltam apenas 1 das 45 cotas da aposta feita em Arroio do Sal (RS) e 3 das 34 cotas vencedoras de Santos (SP):

• Aposta feita pela internet: já se apresentou para retirar o prêmio
• Florestal (MG): já se apresentou
• Arroio do Sal (RS): 44 das 45 cotas já foram retirar
• Santos (SP): 31 das 34 cotas já foram retirar
• São José de Bela Vista (SP): 9 das 9 cotas já foram retirar

A polêmica de São José da Bela Vista

No caso de São José da Bela Vista (SP), a polêmica ocorre porque o organizador reuniu 44 pessoas, cobrou R$ 30 de cada uma, e fez mais de um bolão, sendo que a aposta que acertou as 6 dezenas tinha apenas 9 cotas (por isso, os R$ 108 milhões foram divididos apenas entre 9 pessoas).

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) diz que um homem de 42 anos foi à delegacia da cidade, após o sorteio, e registrou um boletim de ocorrência alegando ter sido vítima do organizador do bolão.

O homem disse à Polícia Civil que o responsável pelas apostas não avisou que seriam 2 bolões diferentes. Disse também que os valores recebidos no bolão não estão de acordo com os comprovantes de pagamentos e que não houve acordo com o organizador para a divisão do prêmio.

Thiago Granzotti, advogado do organizador do bolão, nega as acusações. Granzotti diz que o grupo de 9 pessoas que ganhou o prêmio existe desde 2015 e que as pessoas apostavam mensalmente na Mega-Sena. Diz ainda que cada um ficou com a sua cota, “sendo que tal fato não demonstra qualquer má-fé, muito pelo contrário”.

Já Mário Bassi, advogado da pessoa que registrou o boletim de ocorrência, diz que em nenhum momento seu cliente foi avisado que seriam feitos bolões diferentes. Bassi também representa outros 10 apostadores que ficaram sem o prêmio e entrou com uma ação judicial que está sob sigilo.

“Em um primeiro momento ele [o organizador] até disse que ia fazer o acerto. Em um segundo momento ele já começou a se esquivar e, depois, parou de dar resposta aos meus clientes”, afirma Bassi. “Já demos entrada em uma ação, pleiteando os valores dos nossos clientes, e aguardamos uma decisão nos próximos 10 a 15 dias no máximo”.

O que diz a Caixa

Procurada, a Caixa afirmou que a aposta vencedora de São José de Bela Vista (SP) é de fato um bolão com 9 cotas. “Ao ser registrada a aposta, portanto, foram gerados 9 recibos de cota. Desta forma, cada participante resgatou a sua parte do prêmio individualmente”.

O banco destaca que a garantia de uma aposta feita em um bolão é o recibo da cota individual, que cada apostador tem direito (quando uma pessoa faz um bolão, ela escolhe o número de cotas e a aposta já é automaticamente dividida por esse número; caso a aposta seja premiada, cada pessoa usa o seu recibo para retirar a sua parte do prêmio).

“A Caixa esclarece que o bolão é a possibilidade que o apostador tem de realizar apostas em grupo, com a garantia do seu recibo de cota individual. Assim, em caso de premiação, cada um tem seu próprio recibo de cota premiado e receberá seu prêmio, de acordo com sua conveniência”, afirmou em nota.

O banco responsável pelas loterias também ressalta que o bilhete da Mega “é individual e ao portador” (quem está com o papel). Por isso, o ganhador pode escrever, no verso da aposta premiada, seu nome completo e CPF, pois assim o bilhete passa a ser nominal (só a pessoa pode retirar o prêmio). “Em caso de bolão, cada participante pode fazer o mesmo no verso de seu recibo individual de cota”.

Versões conflitantes

Alguns aspectos importantes ainda não estão esclarecidos na história, seja porque os advogados de cada parte não dão detalhes suficientes do que ocorreu, seja porque as versões são conflitantes. Os dois principais pontos são:

  1. As pessoas que participaram do bolão sabiam de antemão que haveria diferentes bolões?
  2. Elas receberam os recibos individuais das suas respectivas cotas antes do sorteio?

Granzotti, que defende o organizador, diz que um grupo de apostadores jogava regularmente na Mega-Sena desde 2015 — e que não foi diferente na Mega da Virada. Diz ainda que, paralelamente, foi feito um outro bolão, com mais pessoas, mas que os bolões eram separados (e que em nenhum momento foi dito que as apostas seriam juntas).

“Não há má-fé, não há qualquer intenção de lesar ninguém. Simplesmente eram pessoas participando de bolões diferentes”, afirma o advogado de defesa. “Creio que não tem muita complexidade no caso. Foram bolões diferentes e não houve nenhum tipo de má-fé ou de intenção de ludibriar ninguém, e as coisas são muito claras”.

Bassi diz que, para os seus 11 clientes, “não havia bolões separados”. “Só depois que ele [o organizador] veio com essa história, em um terceiro momento, de bolão separado. Mas, até então, todos faziam a aposta com a pessoa que geria e fazia arrecadação de valores para que as apostas fossem feitas. Então, quando ganhou, todo mundo foi atrás da pessoa que fazia essa organização e que deveria estar com o bilhete premiado”.

O InfoMoney apurou com pessoas da lotérica de São José, onde foi feita a aposta premiada, e da delegacia da cidade, onde o boletim de ocorrência foi registrado, que havia de fato um grupo que fazia regularmente apostas na Mega-Sena, como alega o advogado de defesa.

“Esse jogo que foi premiado já era feito há anos”, afirma um funcionário da lotérica. “Não tem nenhuma ligação de uma coisa com a outra [um bolão com o outro]”. Ele destacou também que a maior parte das pessoas que apostou no bolão e não ganhou o prêmio não questionou a divisão.

“Tem aqueles que também entraram no bolão que não ganhou e que concordaram que quem ganhou foram apenas os 9 do outro bolão”, afirma o funcionário. A mesma opinião foi dada por um investigador da Polícia Civil que não está atuando no caso. “Não tem como o cara ter tentado dar um golpe”.

A reportagem apurou também que a polícia ainda não investiga o caso (e não realizou nenhuma diligência ou oitiva até o momento).

Mas e o recibo das cotas?

Sobre o recibo das cotas, o advogado que defende o organizador, preferiu não se pronunciar. “Vou te pedir desculpas, mas é a estratégia do momento. Reitero que foi feito tudo com correção, transparência e lealdade. Só pelo fato de não serem todos a processar, já é um indicativo”, afirmou Granzotti.

Bassi diz que o organizador passou algumas fotos ilegíveis dos recibos das cotas pelo WhatsApp e que outras ele entregou pessoalmente depois, após o sorteio. Mas não informou quantas cotas tinham nesses recibos.

O InfoMoney pediu cópias dessas cotas, mas o advogado disse que não podia enviá-las devido ao processo judicial, por se tratar de provas (se eram 35 cotas nos recibos, por exemplo, esse pode ser um indício de que os bolões eram separados).

O advogado, que representa os 11 apostadores que questionam a divisão do prêmio, diz ainda que a pessoa responsável por arrecadar o dinheiro e fazer as apostas não era organizada e foi fazendo as apostas à medida que mais apostadores entravam no bolão.

“Conforme ele arrecadava valores, ele fazia jogos diferentes em dias e horas alternadas, para o mesmo grupo de pessoas, que concorria através dele ao concurso da Mega da Virada”, afirma Bassi. “Essa má organização só veio à tona depois que houve a situação da aposta ganhadora”.

Como fazer um bolão? É seguro?

Diante de toda a polêmica, muitos apostadores podem ter ficado preocupados com os bolões (quem nunca participou do bolão da Mega da Virada com os colegas de trabalho?). A Caixa faz questão de destacar que, em um bolão, o comprovante de que a pessoa participou da aposta é o recibo da cota.

O banco diz que, para fazer um bolão, basta juntar os apostadores, escolher os números da aposta, marcar a quantidade de cotas (o número de participantes) e registrar o jogo em uma das 13 mil lotéricas do país (ao contrário das apostas “comuns”, os bolões não podem ser feitos pela internet).

“O bolão só é comercializado, com segurança e com a entrega do recibo original de cota, nas mais de 13 mil lotéricas espalhadas pelo Brasil. Não é possível o registro de bolões em canais eletrônicos”, afirma a Caixa. “Ao ser registrada no sistema, a aposta gera um recibo de cota para cada participante — que, em caso de premiação, poderá resgatar o prêmio individualmente”.

Na Mega-Sena, os bolões têm preço mínimo de R$ 10 e podem ter no mínimo 2 e no máximo 100 cotas. Além disso, é permitida a realização de no máximo 10 apostas por bolão. “Em caso de bolão com mais de uma aposta, todas elas deverão conter a mesma quantidade de números de prognósticos”, diz o banco.

Bolão de lotéricas

A Caixa diz também que os apostadores também podem adquirir cotas de bolões organizados pelas próprias lotéricas. Neste caso, basta solicitar ao atendente a quantidade de cotas que deseja e guardar o recibo para conferir a aposta no dia do sorteio. Neste tipo de bolão, as lotéricas podem cobrar uma tarifa de serviço adicional de até 35% do valor da cota.

No caso dos bolões organizados por lotéricas, as cotas que não são vendidas não são canceladas (e continuam a valer normalmente). Assim, caso a lotérica só consiga vender 20 das 100 cotas de um bolão organizado por ela, por exemplo, e a aposta for vencedora, o prêmio será dividido pelas 100 cotas.

Com isso, o valor que sobrar (das 80 cotas que não foram vendidas) ficará para a própria lotérica.

Como me proteger se ganhar?

A Caixa diz que as apostas da Mega devem ser feitas apenas em canais oficiais  autorizados: em lotéricas, no portal Loterias Caixa, no aplicativo Loterias Caixa (disponível para usuários IOS e Android) ou no internet banking do banco. “Quaisquer outras plataformas e sites não oficias das Loterias Caixa não possuem relação com as loterias federais nem autorização para venda de produtos das Loterias Caixa”.

O banco diz que, nas apostas feitas em lotéricas, o bilhete é emitido ao portador (a pessoa que está com a aposta ou o recibo da cota de um bolão). Diz ainda que, para segurança do apostador, “é importante que o ganhador se identifique no verso do bilhete com nome completo, número do documento de identificação e CPF”. “Dessa forma, o apostador garante que ninguém mais retire o prêmio”.

“A Caixa ressalta que o bilhete é individual e ao portador, mas o ganhador pode escrever, no verso do recibo da aposta premiada, seu nome completo e CPF. Dessa forma, o bilhete será nominal. Em caso de bolão, cada participante pode fazer o mesmo no verso de seu recibo individual de cota”, reitera o banco.

Lucas Sampaio

Jornalista com 12 anos de experiência nos principais grupos de comunicação do Brasil (TV Globo, Folha, Estadão e Grupo Abril), em diversas funções (editor, repórter, produtor e redator) e editorias (economia, internacional, tecnologia, política e cidades). Graduado pela UFSC com intercâmbio na Universidade Nova de Lisboa.