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O MEC é peça-chave da política econômica, mas ninguém liga

A educação é uma das partes mais importantes da política econômica, mas a equipe econômica é altamente especializada e vigiada, enquanto a equipe educacional é negligenciada por políticos e imprensa
Por  Pedro Menezes
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Praticamente todos os programas de governo apresentados em 2018, inclusive o do presidente, tinham uma mesma proposta: priorizar a educação básica. Quantos consensos do tipo existem na economia brasileira? Não sei. Sei que são raros.

Os economistas, que não são dados a unanimidades quando debatem as origens e causas da riqueza das nações, costumam concordar sobre a importância primordial da educação para o desenvolvimento de longo prazo.

Adam Smith, no século 18, descrevia o aprendizado de habilidades pelos seres humanos como um investimento com impacto econômico análogo à aquisição de novas tecnologias produtivas.

Da creche à pesquisa avançada, a difusão e produção de conhecimento é vista como um bem público. Mas a creche é vista como especialmente importante. A curva de Heckman, apresentada em gráfico abaixo, costuma ser usada para descrever o fenômeno.

Em parceria com psicólogos, neurocientistas e pesquisadores de diversas áreas, James Heckman, economista da Universidade de Chicago, popularizou numa curva a seguinte ideia: quanto mais cedo vier o investimento na educação de uma pessoa, maior será o reto. Deste raciocínio surgem as referências cada vez mais frequentes à “educação na primeira infância”.

 

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Nos últimos 30 anos, avançamos algo no campo da educação básica – muito para uns, poucos para outros, diferentes réguas mudam a conclusão. Apesar do baixo acesso a creches, algum ensino fundamental é realidade para grande parte das crianças brasileiras. Não é o ensino fundamental que sonhamos, mas chega em quem precisa, e nem sempre foi assim.

No ensino médio, o problema é maior. Em 2017, nenhum estado atingiu sua meta no Índice de Desenvolvimento de Educação Básica, ou IDEB, do ensino médio. A taxa de abandono é alta, o que motivou uma reforma no governo Temer.

Um dos maiores desafios de Bolsonaro é mudar esta realidade e avançar na qualidade da educação básica. Para cumprir o que prometeu na eleição, o governo tem uma ferramenta imprescindível: um sistema de avaliação amplo e preciso para quem tem boas práticas que podem ser copiadas e quais escolas precisam melhorar com mais urgência.

O IDEB fica sob a responsabilidade do INEP, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa Anísio Teixeira. Do ensino fundamental à graduação, o INEP coordena o sistema de avaliação da educação brasileira, do ensino fundamental à graduação. Enem e Enade também estão sob sua responsabilidade. Desde janeiro, o instituto teve 4 presidentes em 9 meses. Três deles saíram do cargo até maio.

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A situação nas diretorias do INEP é ainda mais grave. A Diretoria de Avaliação da Educação Básica (DAEB), por exemplo, ficou sem titular durante 5 meses e meio do governo  Bolsonaro.

O primeiro indicado para a vaga foi o economista Murilo Resende, aluno de Olavo de Carvalho que viralizou nas redes sociais após denúncias de plágio. Murilo ficou dois dias no cargo, de 16 a 18 de janeiro.

A DAEB ficou sem titular por quase um mês, até 14 de fevereiro, quando o economista Paulo Teixeira assumiu o cargo. No dia 27 março, saiu do cargo em solidariedade ao seu chefe, Marcus Rodrigues, demitido da presidência do INEP.

O terceiro diretor, delegado  Elmer Vicenzi, da Polícia Federal, entrou apenas em 15 de abril e já saiu no mês seguinte, 26 de maio. Seu substituto, o general Carlos Alberto de Souza, só seria nomeado mais de três meses depois como diretor de avaliação da educação básica, o quarto no cargo em 9 meses de governo Bolsonaro.

As provas que servem como base para o cálculo do IDEB informam com muita precisão o desempenho de cada instituição pública de educação básica. Por problemas de gestão logística e atrasos na gráfica responsável, alguns exames correm risco de não ocorrer em 2019. O ENEM, agendado para novembro, já foi impresso, mas sofreu com as turbulências da Diretoria de Avaliação da Educação Básica.

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Esses problemas teria acontecido se o INEP tivesse sido comandado por um mesmo presidente desde o início do ano, ao invés de 4? Se a diretoria responsável pela avaliação não tivesse ficado vaga durante a maioria dos 9 meses de governo, exames importantes correriam o risco de adiamento para o ano que vem? Realizar os exames no ano letivo seguinte ao programado maculará um dos maiores orgulhos da política educacional brasileira, nosso bom sistema de avaliações.

O contraste com a gestão de equipe do Ministério da Economia é notável. Começando pelo fato de Paulo Guedes ser um economista com ótima formação e anos de experiência. Por sinal, desde o governo FHC, só Henrique Meirelles liderou a Fazenda sem ter doutorado em economia. Mas, neste caso, o ex-ministro tinha a apresentar uma carreira de sucesso como executivo por décadas e 8 anos na presidência do Banco Central.

Os titulares do MEC no mesmo período passam longe do nível de especialização exigido na economia. E é importante ressaltar isso: apesar do exemplo escabroso do INEP, Bolsonaro não é o primeiro a tratar a equipe educacional como menos importante que a econômica.

Entre os secretários de Guedes, quem não tem formação acadêmica avançada possui boa experiência no que está sob seus cuidados. Seja qual for sua opinião sobre eles, não há dúvidas sobre o perfil técnico dos seus integrantes.

Após a demissão de Marcos Cintra, ex-secretário da Receita Federal, um substituto foi nomeado poucos dias depois. Se o cargo ficasse vago, como ocorreu nas diretorias do INEP, seria um escândalo nacional. A importância relativa de cada órgão não explica a diferença entre eles na escala de prioridades do Executivo.

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A bem da verdade, educação não é só política econômica. Ressalto essa característica por deixar claro que o MEC merece um nível de especialização técnica mais similar ao praticado no Ministério da Economia. Infelizmente, não tem.

A realidade é cruel. Se Paulo Guedes fizer um ótimo trabalho, a chance de reeleição do presidente aumenta consideravelmente. Se o titular do MEC tiver sucesso semelhante, o país será muito melhor daqui a alguns décadas. Infelizmente, o longo prazo interessa menos aos políticos do que uma vitória nas eleições.

 

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Pedro Menezes Pedro Menezes é fundador e editor do Instituto Mercado Popular, um grupo de pesquisadores focado em políticas públicas e desigualdade social.

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