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O “Inferno de Dante” do setor automotivo no Brasil

O Inferno descrito em "A Divina Comédia" tem nove círculos. E, fazendo um paralelo com nosso setor, ainda não chegamos ao último deles...
Por  Raphael Galante -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Caros leitores, digníssimas leitoras: encerrado o primeiro trimestre do ano para o setor automotivo, a grande conclusão que podemos chegar é que o mercado se encontra dentro do clássico “A Divina Comédia”, que de engraçado não tem nada.

Na obra, o Inferno descrito por Dante tem nove círculos. E, fazendo um paralelo com nosso setor, ainda não chegamos ao final.

Neste ano, o mercado sofreu (e ainda sofre) com: convulsão social (por causa da pandemia); baixo crescimento econômico (frustrando todas as expectativas de crescimento); empresas centenárias (Ford) jogando a toalha (fora as outras empresas que orbitavam em torno dela); aumento da carga tributária para veículos novos e usados (ICMS-SP) com a “jenialidade” de nossos legisladores; teve o governo federal “praticamente” impedindo o direito de ir e vir das pessoas com necessidades especiais; falta de insumos para a produção de veículos (que ainda se arrastará por mais alguns meses); e, no último levantamento divulgado pela Anfavea, 56% das montadoras de veículos pararam (parcialmente ou totalmente) sua produção.

Ou seja, pela obra de Dante, ainda faltam mais dois círculos para entrarmos….

E qual o resultado deste trimestre?

Com um esforço hercúleo, as vendas de carros novos totalizaram quase 500 mil unidades (rolou aqui aquele arredondamento maroto, foram 497,8 mil), uma queda de 6,5% sobre o mesmo período do ano passado, quando tivemos 532 mil carros vendidos – e naquela época já estávamos com aquela paralisação generalizada por causa do (nem tão) novo coronavírus.

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É quase certeza que haverá um crescimento das vendas de veículos neste ano. Isso porque a nossa base de comparação é muito frágil. O resultado de abril a junho do ano passado foi terrível.

Mas, se antes a indústria e os principais players apostavam num mercado próximo a 2,5 milhões de unidades neste ano, ele já derrubou a projeção para 2,2 milhões. E já tem gente falando em algo entre 2 milhões e 2,1 milhões de unidades.

Para este ano, a situação é um pouco mais complicada. O “pacote de bondades” para o setor neste ano deve ser extremamente mirrado em comparação com o que saiu no ano.

Em 2020, houve a adequação de processos produtivos; liberação de crédito; postergação de pagamentos; readequação da equipe de colaboradores, além da dinheirama que veio do acordo emergencial.

Para este ano, não teremos quase nada disso.

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E o círculo final do nosso inferno é que melhoras contínuas do setor demoram para “virar”.

A eletrificação (mais efetiva) dos veículos deverá demorar um pouco mais para acontecer, salvo nas marcas AAA, como a Volvo.

Ou então, a mudança dos motores dos caminhões (para diminuir a poluição), que deverá ficar para os próximos anos, já que acreditamos que o governo não terá coragem de manter a regra (que já era sabida há uma década).

Assim como uma melhora na rentabilidade das montadoras induziria a uma nova rodada de investimentos e de lançamentos de modelos – ou simplesmente reduziria a capacidade ociosa da indústria, que está na casa de uns 65%.

Usando o nosso lado “Poliana” de ser, devemos lembrar que, depois do Inferno de Dante, temos o Purgatório e o Paraíso, mostrando que existe esperança no final (apesar de ela ser bem tênue).

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Mas, existem boas notícias no setor neste primeiro trimestre.

Se o mercado está caindo 6,5%, tem marcas que estão voando.

Usando o conceito “pau que bate em Chico, bate em Francisco”, sempre demos umas bordoadas no pessoal da antiga FCA pelos seus métodos “um pouco divergentes da visão do estagiário”. Mas da mesma forma que a gente bate, a gente elogia!

A surpresa avassaladora deste ano é o “novo grupo” STELLANTIS (Citroen-Fiat-Jeep-Peugeot). No ano passado, percebemos que todas essas marcas deram uma pisada no freio para ver o que iria rolar – e aqui no Brasil o resultado não poderia ser melhor.

Das marcas do grupo STELLANTIS, a Peugeot teve crescimento de 34,5% neste trimestre. O ponto mais sentido por todos é que, com a sinergia do novo grupo, a marca está aparecendo mais na mídia em propagandas, uma grande falha recorrente da antiga Peugeot.

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Se a VW e a GM decidiram interromper a sua produção, a Fiat, com crescimento de (também) 34,5% neste trimestre, vai muito bem, obrigado.
Com apenas alguns problemas pontuais na produção do Argo, a marca continua firme e forte, e já abriu uma vantagem de mais de 16 mil carros sobre a VW (segunda colocada).

Quase tudo o que a Fiat vende está em crescimento de vendas. A Fiat “pato” Strada, com crescimento de 87%; a Toro, com 31%; o Mobi, que registrou evolução de 40%; e o Fiat “Highlander” Uno, que cravou evolução de 130%. Sim, o “Uninho” apresentou crescimento de 130%… só Deus para explicar!

Além disso, a operação brasileira da Jeep (que deve ser a mais rentável do grupo STELLANTIS “no mundo”) também registrou um singelo crescimento de 29%. Isso sem levar em consideração que as locadoras deram uma pausa nas compras. Assim que elas voltarem, deverá haver uma demanda forte pelo Renegade.E a Citroen? Bom… de quatro marcas, o STELLANTIS conseguiu melhorar o desempenho de três. Convenhamos… é quase impossível acertar todas!

A Citroen fechou o trimestre com queda de 36%, e o pensamento uníssono é: que saudades do Sérgio Habib!
No frigir dos ovos, o grupo STELLANTIS cravou crescimento médio de 30%.

Raphael Galante Economista, atua no setor automotivo há mais de 20 anos e é sócio da Oikonomia Consultoria Automotiva

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