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Novo acordo automotivo se desenha com os erros de sempre

Governo deve oferecer soluções superficiais que não abordam efetivamente as causas do problema
Por  Raphael Galante -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Caros leitores, digníssimas leitoras,

No setor automotivo em crise, o assunto do momento é que na próxima semana (dia 25) o governo irá anunciar uma série de medidas para impulsionar o segmento.

Um dos pontos em discussão é o retorno do chamado “carro popular”, também conhecido no meio automotivo como “pé-de-boi” ou “pelado”.

Há cerca de 30 anos, durante uma época difícil para o mercado automotivo, o governo lançou o conceito do “carro popular”. Naquela ocasião, as montadoras relançaram o Fusca, que ficou conhecido como “Fusca Itamar” em referência ao presidente da época, Itamar Franco. Além disso, houve um aumento na oferta de carros com motores 1.0.

O ponto central daquela época é que as montadoras possuíam um “setor” onde os veículos eram depenados ao máximo para reduzir custos de produção e oferecer o chamado “carro popular”. Para se ter uma ideia do quão absurdo era esse processo, em algumas marcas, o retrovisor do lado direito do veículo era removido e vendido como um opcional.

E é aí que mora a incoerência do novo programa (que ainda não foi lançado e podemos acabar mordendo a língua)!

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Os veículos já chegaram a um ponto em que é impensável torná-los ainda mais básicos do que já são. Remover retrovisor e vender carros mais baratos é impensável! Novas regulamentações também impõem o uso de equipamentos de segurança e menor emissão de poluentes. Além disso, a conectividade é agora uma exigência para os veículos, uma vez que nossos celulares se tornaram quase uma extensão de nosso corpo.

Em resumo: o governo federal está esperando um resultado diferente para uma das ideias mais batidas, como por exemplo a redução do IPI ou a criação de outras vantagens!

Além disso, em nível federal, a alíquota do IPI para carros 1.0 é um pouco acima de 5%, enquanto o ICMS (imposto estadual) é de 12%. Duvidamos que os estados brasileiros, que estão em uma situação financeira delicada, abram mão dessa receita.

O que percebemos é que o provável pacote que será lançado beneficiará apenas algumas poucas marcas, já que nem todas (ou a maioria delas) possui produtos que se enquadram nessa “realidade fantasiosa”.

Ok. Mas se isso não vai resolver praticamente nada, qual é o “REAL” problema do mercado automotivo?

Acreditamos que um dos pontos centrais seja a falta de crédito. Atualmente, o mercado automotivo está em declínio devido à escassez de financiamentos. Hoje, menos de 40% de todos os carros novos vendidos foram financiados, sendo que mais de 60% precisaram ser adquiridos à vista!

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E por que ocorreu essa queda na participação do financiamento? A primeira justificativa é o aumento exorbitante das taxas de juros! As taxas atuais são as mais altas desde o segundo semestre de 2016.

E aí, como sempre na economia, nos deparamos com o eterno dilema de Tostines! A inadimplência está alta devido aos juros elevados? Ou os juros estão altos por causa da inadimplência?

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O ponto que sempre enfatizamos neste espaço é que o crédito é a força motriz por trás de tudo, e ele se tornou escasso no setor automotivo. O governo apresentar um pacote de medidas para redução/desoneração de veículos sem uma linha de crédito para os consumidores é ineficaz!

A realidade é que os brasileiros estão ficando cada vez mais pobres a cada ano… e o carro se tornou um sonho inatingível!

O problema do mercado automotivo brasileiro (assim como em qualquer setor da economia) é muito mais estrutural, envolvendo questões como renda, emprego e crédito, do que qualquer outra coisa.

Para que você possa compreender melhor, caro leitor, imagine o seguinte dilema: suponha que uma pessoa esteja com a garganta inflamada. Ela pode consultar um médico que prescreverá uma injeção de benzetacil, cuja solução será dolorosa, porém eficaz, ou então optar por um tratamento homeopático com florais de Bach, que não resolverá o problema (apesar de parecer agradável).

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Nessa analogia, o governo seria o médico homeopata tratando a nossa inflamação de garganta…

Raphael Galante Economista, atua no setor automotivo há mais de 20 anos e é sócio da Oikonomia Consultoria Automotiva

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