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Manifesto pela liberdade da (não) utilização da hidroxicloroquina

Como o sistema de confiabilidade entre médicos e pacientes foi construído, e o papel dos protocolos baseados em evidências são essenciais garantidores da liberdade do indivíduo
Por  IFL - Instituto de Formação de Líderes -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

*Por Caroline Sanflorian Pretyman

Para entendermos como a sociedade construiu o sistema de saúde atual, é preciso entender que ele só é viável por ser baseado no princípio de confiança entre pacientes e profissionais de saúde.

O indivíduo, desprovido do conhecimento necessário para cuidar plenamente de sua saúde, escolhe terceirizar seu bem jurídico da vida a um profissional que a sociedade entende como melhor capacitado. No momento dessa decisão fundamental, o maior determinante é a confiança na segurança do sistema.

Ao delegarmos a um terceiro o bem jurídico da vida, é necessário que exista um parâmetro objetivo para julgar se a decisão tomada é ou não a melhor possível; e, caso não seja, tais parâmetros sejam suficientes para que a justiça possa agir a favor do indivíduo.

Para possibilitar a definição de tais métricas, que garantem a segurança do sistema, nos últimos séculos foi elaborada a metodologia dos estudos científicos. Esta metodologia permitiu parametrizar as melhores práticas para os melhores desfechos.

A partir da metodologia científica é possível fortalecer o sistema, reduzindo a assimetria de informação e permitindo que os indivíduos sejam capazes de tomar melhores decisões a respeito da condução do seu bem jurídico mais precioso. Confia-se, com apoio na metodologia científica, que as decisões tomadas respeitem o direito à vida, evitando quaisquer decisões arbitrárias.

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No momento atual, porém, vivemos um impasse: a politização (e consequente polarização) de uma decisão a princípio baseada apenas em fatos ameaça a segurança do sistema. A prescrição da hidroxicloroquina vem sendo discutida por diversos agentes da sociedade, inclusive por muitos que não têm qualquer papel no sistema que foi construído baseado na metodologia científica e, portanto, prejudicam a tomada de decisão segura apoiada nesse sistema.

Para julgar as sugestões feitas pelos agentes que se encontram no bojo desta discussão, é preciso recorrer ao método científico e ater-se aos estudos e fatos relacionados ao uso desse medicamento.

A hidroxicloroquina é um medicamento amplamente estudado, descoberto em meados dos anos 1950. É comprovadamente eficaz no tratamento da malária e alivia os sintomas de muitos pacientes portadores de artrite e doenças autoimunes, especialmente lúpus. Dentre os diversos estudos feitos para medir as vantagens e desvantagens da hidroxicloroquina, foram identificados efeitos colaterais raros, porém potencialmente graves, como arritmia cardíaca, cegueira e problemas hepáticos.

Tais efeitos, no entanto, foram considerados toleráveis diante de seus benefícios. Essa conclusão foi possível pela consonância entre o método escolhido nos estudos e o método preconizado como protetor da segurança do sistema de saúde.

Diante da pandemia atual, que torna a terceirização da proteção ao bem da vida ainda mais delicado, falemos sobre credibilidade. O grande fluxo de notícias sobre a hidroxicloroquina começou após um pequeno estudo francês que, após testar a combinação hidroxicloroquina e azitromicina, demonstrou um resultado positivo. Esse estudo, porém, contou com um número insuficiente de pacientes, impedindo a extrapolação de seus resultados para a população geral.

Nos últimos meses, foram publicados outros estudos que, até o momento, não conseguiram comprovar a eficácia da droga em questão no tratamento da COVID-19. E pior do que isso, diversos desses estudos constataram os efeitos adversos já observados cientificamente no passado.

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No entanto, o contexto pandêmico nos força a reavaliar os métodos conhecidos até o momento. A busca por um tratamento eficaz se torna medida emergencial, flexibilizando as regras em prol de acelerar a descoberta por um tratamento. Neste momento, o sistema enfrenta um grande conflito. A avaliação da aplicação de testes em maior escala do que o recomendado ameaça o compromisso do sistema de honrar com o melhor resultado possível, o que pode culminar com uma grande desorganização do próprio sistema, colocando a sua credibilidade em xeque.

Frente à ausência de evidências e à presença comprovada de efeitos adversos, porém sem alternativas, centros de pesquisa do mundo todo iniciaram testes do uso da hidroxicloroquina em pacientes internados, sob ambiente monitorado, visando reduzir potenciais resultados negativos ou desfavoráveis ao uso do medicamento.

No entanto, são necessários limites à flexibilização do método científico, já que a população em geral fica sujeita à subjetividade da escolha da hidroxicloroquina ou de qualquer outro medicamento por um profissional de saúde, podendo ter o bem à vida colocado em risco sem efeitos favoráveis claros.

Em tempos de instabilidade política e econômica, dominados pelo medo, devemos nos apegar aos fatos, evitando ser tomados pelo senso de urgência e sensacionalismo. Toda a construção do sistema de saúde em que confiamos nos alerta justamente para o possível ataque ao respeito, à liberdade e ao direito à vida enquanto decisões políticas submetem a população a termos que ela, e até mesmo o próprio profissional de saúde, desconhecem.

Uma decisão de saúde não é econômica ou política, muito menos lastreada em “Anti-intelectualismo”. Não há evidências de que a hidroxicloroquina seja a cura para o COVID-19, e seu uso indiscriminado pode gerar efeitos colaterais que levam, inclusive, à morte. O uso ou não desse medicamento é da autonomia do indivíduo. Contudo, é da autonomia do profissional de saúde optar por não prescrever tratamentos potencialmente perigosos.

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Estejamos atentos aos métodos de segurança estabelecidos pelo sistema de saúde, a fim de evitar situações em que não possamos exercer nossa liberdade de julgar, sendo vítimas de imposições sociais de protocolos sugeridos pela subjetividade de mentes alheias.

*Caroline Sanflorian Pretyman é médica formada pela Escola Paulista de Medicina, atua como médica associada na rede Docway, e é Sócia da Divisão de Saúde da BCS Participações. É associada do IFL São Paulo.

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