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A crise energética global é só a ponta do iceberg

Uma crise energética global e cadeias de suprimentos desorganizadas têm elevado a inflação ao redor do planeta. Como se não bastasse, o Brasil absorve esse cenário agregando seus próprios problemas
Por  Felippe Hermes
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Em 1760, o falido George III, rei da Inglaterra, chegou a um acordo com o parlamento britânico para entregar todas as suas posses, incluindo terras e outros direitos, em troca de uma “mesada” anual.

O acordo feito por George criou o chamado “Crown Estate”, e tem sido prorrogado por todos os monarcas que o sucederam, incluindo Elizabeth II.

Atualmente, as terras e direitos estão avaliadas em cerca de £ 14,5 bilhões, gerando £ 350 milhões anuais de lucro, com cerca de 15% indo para a rainha e o restante ficando com o governo.

Nos últimos anos, além de shoppings e condomínios residenciais, o administrador dos bens da família real têm ganhado dinheiro graças a um direito considerado “inútil” na época da criação do acordo: o leito marinho.

Em teoria, todo o leito marinho britânico pertence a rainha Elizabeth II, o que faz dela a maior beneficiária de uma nova tecnologia: as usinas eólicas “off-shore”.

De fato, nenhum país do mundo tem investido tanto em usinas eólicas em alto-mar como o Reino Unido, com 8% de toda energia instalada sendo provida por essa fonte, que rende a rainha £ 41 milhões em lucros todos os anos.

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A meta do Reino Unido é chegar a 33% em 2030. E uma possível meta de 80% da energia sendo provida por geração eólica offshore em 2050 está sendo considerada.

O problema? A crise energética no Reino Unido atual ajuda a expor a fragilidade causada por essa dependência.

Fontes de geração eólica e solar são essencialmente fontes intermitentes de energia, o que significa que funcionam em horários não previsíveis e podem parar de funcionar sem aviso.

No último ano, a geração eólica chegou a representar 25% de toda geração no Reino Unido. Neste verão, época em que o consumo aumenta e os ventos diminuem, a geração eólica caiu para 7% do total, levando a ao aumento da demanda da importação de gás.

O preço do gás no mercado internacional, porém, está explodindo na medida em que a recuperação econômica da pandemia se mostra mais rápida do que o esperado. Neste ano, o gás natural chegou a subir 400% no mercado internacional, provocando um aumento de 250% no preço da energia.

A crise se estende também por conta do aumento da demanda do petróleo que, por sua vez, provoca desabastecimento, além de efeitos perversos na produção de alimentos, dependente de fertilizantes.

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Do outro lado do Canal da Mancha, na França, problemas similares têm ocorrido. A diferença é que os franceses possuem produção elevada de energia nuclear, o que reduz os danos de um aumento na energia.

Na Alemanha, também dependente de importação de gás, a energia já subiu cerca de 113%.

Na Ásia, onde a recuperação econômica foi ainda mais ágil, a pressão sobre a indústria está sendo dupla: a crise energética e uma cadeia de suprimentos bagunçada.

A China busca lidar com o problema aumentando sua produção de carvão, a fonte mais poluente de todas, mas os fechamentos de fábricas já estão ocorrendo.

Uma crise da indústria de semicondutores também afeta o crescimento global, com as duas crises somadas gerando o pior cenário econômico possível: redução de crescimento econômico e aumento da inflação.

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A possibilidade de crescimento zero no terceiro trimestre afeta, em especial, a China. Mas essa hipótese tem se espalhado ao redor do planeta por meio da queda no preço de commodities como o minério de ferro.

Esse cenário é preocupante para o Brasil.

Por aqui, estamos lidando com nossa própria crise: a dependência de chuvas. Não é um problema novo.

A hidrelétrica de Belo Monte, por exemplo, possui uma capacidade instalada de 11.200 Mw, mas viu sua geração variar entre 6.800 Mw, em fevereiro, e 280 Mw em outubro (dados de 2019).

Em resumo, nossos problemas nessa área não são novos, de maneira que a crise energética brasileira também não chega a ser nova.

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A grande questão, em meio a bagunça global, é a posição do Brasil no mundo. Não estamos no lado das commodities ligadas à energia (petróleo e gás), mas sim daquelas que possuem forte ligação com crescimento econômico (soja, carne e minério de ferro).

Com uma redução do preço do minério de ferro, nossas exportações caem, pressionando o dólar, o que por sua vez eleva o preço em Real e puxa a inflação brasileira para cima.

Ao mesmo tempo, commodities como o petróleo possuem grande impacto no índice de inflação brasileiro.

Por conta da alta no barril de petróleo lá fora e da desvalorização do Real, a gasolina já subiu cerca de 45% no ano até aqui.

A bagunça generalizada nas linhas de suprimentos também pressiona o Brasil.

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Por conta da pandemia, que levou as pessoas a ficarem em casa e aumentarem o consumo de eletrônicos (vendas de computadores e eletrônicos globais cresceram 26% em 2020), além de uma guerra comercial entre a China e os Estados Unidos, que tirou de cena a maior fabricante chinesa de semicondutores, boa parte das indústrias tem reduzido sua produção.

Em suma, a demanda segue crescendo na medida em que as pessoas estão retomando sua vida cotidiana por conta da vacinação. Mas a oferta tem sido reduzida.

A indústria de automóveis, em especial, tem sido obrigada a fechar fábricas. Assim como a produção de smartphones e outros eletrônicos.

A retomada econômica pressiona cadeias de produção incapazes de atender seus consumidores, o que causa um efeito chamado de “choque de oferta”. Ao mesmo tempo, condições climáticas e dependência de fontes intermitentes levam a uma instabilidade energética poucas vezes vistas.

Na soma de tudo, o mundo tem visto a inflação crescer de maneira galopante.

Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e mesmo o Brasil estão com seus índices de inflação bastante acima da meta.

Isso acaba por corroer a renda, reduzindo o efeito que uma geração de empregos positiva, como no Brasil atual (com 2,2 milhões de empregos gerados até agosto) possa ter a médio e longo prazo.

Para os bancos centrais, tal inflação é fruto dessa bagunça e, portanto, transitória. Na prática, o mundo está promovendo uma transição energética em velocidade nunca vista, o que eleva a instabilidade e deixa cenários como o atual mais propensos.

O problema é que os BCs também possuem sua parcela de responsabilidade. No nosso caso, o Banco Central reduziu as taxas de juros de forma acelerada. Agora ele se vê obrigado a correr atrás da meta, gerando uma alta de preços em um momento onde todo o planeta já está instável.

Além de elevar a meta de inflação, o BC brasileiro também rebaixou a expectativa de crescimento. O PIB brasileiro, que alguns acreditavam poder crescer 7% esse ano, parece cada vez mais longe de atingir esse valor.

Como se fosse pouco, não devemos esquecer que o próximo ano será repleto de tensões eleitorais por aqui, um ambiente que, via de regra, já não favorece o câmbio.

Há inúmeros fatores ou interesses políticos que podem decorrer deste cenário global tão complicado. Para cada um deles, o Brasil parece ter um complicador próprio.

Em todo caso, convém ter precaução, ainda que a nível individual.

Felippe Hermes Felippe Hermes é jornalista e co-fundador do Spotniks.com

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