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Meus recentes textos neste espaço foram sobre investimentos no exterior e os eventos recentes reforçaram a necessidade da diversificação internacional. Nos últimos anos, o crescimento da alocação de patrimônio de brasileiros no exterior deixou de ser uma exceção para se tornar uma prática comum entre investidores institucionais e indivíduos. Essa mudança reflete, principalmente, a busca por diversificação de risco, proteção contra choques domésticos e acesso a mercados mais desenvolvidos. No entanto, esse movimento, antes ancorado em fundamentos financeiros, passa agora a ter motivações regulatórias e tributárias. A mudança da forma de cobrar impostos desses investimentos no final de 2023 já tinha sido um sinal de atenção e agora foi potencializado com as mudanças no IOF.
Muito além da aposta no dólar
A primeira e mais importante correção de percepção que se deve fazer sobre os investimentos internacionais é que o objetivo não deve ser simplesmente “ganhar com a alta do dólar”. A alocação global deve ser encarada como uma forma de reduzir a exposição a riscos locais, como instabilidade política, surpresas fiscais ou mudanças regulatórias bruscas. Ativos estrangeiros, especialmente aqueles denominados em dólar, costumam ter correlação baixa com ativos brasileiros.
Além disso, manter parte do patrimônio fora do país pode ser uma forma eficiente de proteção contra o risco — ainda que remoto, mas não desprezível — de controle cambial mais severo no Brasil. Embora medidas diretas de restrição à saída de capital não estejam no horizonte imediato, o aumento do IOF sobre operações de câmbio e os comentários recentes de autoridades sugerem que o tema não está morto. Em cenários extremos, como os vividos por países que impuseram barreiras à conversibilidade da moeda, ter ativos já posicionados no exterior pode fazer toda a diferença na preservação de riqueza.
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IOF e o risco de retrocesso
A recente decisão do governo federal de aumentar o IOF sobre operações de câmbio é um sinal preocupante. O imposto não é instrumento de arrecadação para cumprir metas fiscais e a sua elevação representa um retrocesso em relação aos compromissos assumidos com a OCDE de padronização e redução gradual desse tributo. Também o artigo oitavo do acordo de funcionamento do FMI pode ter sido quebrado, pois diz que não pode haver restrições em pagamentos e transferências em transações internacionais e não pode haver práticas de múltiplas taxas de câmbio. O movimento não apenas encarece remessas de recursos ao exterior como também gera insegurança regulatória — um dos principais fatores que afastam o investidor estrangeiro.
Ao taxar de maneira abrupta operações como aportes em previdência privada com ativos externos ou transferências para fundos no exterior, o governo sinaliza que a previsibilidade jurídica pode ser sacrificada em prol de resultados fiscais de curto prazo. Pior: medidas assim têm um efeito similar ao de um aumento da taxa básica de juros, só que com impactos mais distorcivos sobre o consumo e o crédito.
Embora parte dessas medidas tenha sido revertida após reação negativa do mercado, a simples tentativa de implementá-las revela uma inclinação preocupante a soluções improvisadas e pouco debatidas.
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O fator Trump e o protecionismo global
Barreiras comerciais e instabilidade geopolítica podem impactar negativamente o desempenho de ativos globais, além de provocar volatilidade cambial. Ainda assim, esse risco não elimina a importância da diversificação internacional. Pelo contrário: diante da possibilidade de políticas econômicas erráticas tanto no Brasil quanto fora, manter uma carteira globalmente diversificada em diversas classes de ativos continua sendo uma das melhores defesas contra incertezas.
Facilidade crescente de acesso
Felizmente, a diversificação internacional deixou de ser privilégio de poucos. Plataformas digitais e bancos brasileiros com foco em investimentos vêm oferecendo aos clientes acesso direto a contas em dólar, ativos internacionais e fundos globais com burocracia mínima. É possível hoje comprar ações da Apple, títulos do Tesouro americano ou fundos internacionais com poucos cliques e valores acessíveis, tudo dentro da legalidade e com estrutura de compliance alinhada às normas brasileiras.
Essa democratização do acesso torna a diversificação ainda mais relevante. E reforça a necessidade de que o governo não crie obstáculos artificiais a esse processo. Afinal, impedir brasileiros de investir fora do país não melhora o ambiente local — apenas reduz a liberdade financeira de quem busca proteger seu patrimônio.
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Diversificar, mas com estratégia
Não basta simplesmente enviar recursos para o exterior; é preciso entender os fundamentos, os custos tributários e os riscos geopolíticos envolvidos. A recente tentativa de restringir ou taxar esse tipo de investimento no Brasil evidencia a importância de realizar essa diversificação com assessoria especializada e dentro da legalidade.
Aos formuladores de política econômica, fica o alerta: em vez de dificultar o acesso dos brasileiros a mercados internacionais — um passo importante na sofisticação do sistema financeiro nacional, o caminho mais eficiente para fortalecer o investimento doméstico é melhorar as condições locais. Isso passa por garantir previsibilidade fiscal, simplificação tributária e um ambiente regulatório estável. Atacar os sintomas de uma economia insegura e pouco competitiva com medidas improvisadas não traz confiança, apenas eleva o “custo Brasil”.
